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terça-feira, 23 de fevereiro de 2010

NOITES QUENTES DE VERÃO

“Noites Quentes de Verão”
Registrado na Biblioteca Nacional
Escrito por José Sette em 1992.

Prólogo

Teresa, jovem e bonita mulher, que vive na cidade do Rio de Janeiro, dedicada ao lar e à família, é influenciada pela leitura de um romance que misteriosamente chegou às suas mãos. O livro, em forma de diário, conta a vida de uma aldeã chamada Antonella. Teresa muda radicalmente de comportamento, começa a ter visões e descobre-se traída por Jorge, seu marido.

O livro de Antonella, mágico e mutável, em sua atormentada estória de amor, leva Teresa à verdade de sua vida, ao desespero de se sentir enganada e à loucura de não encontrar saída.


Num clima de comédia, por ter muitas citações cinematográficas no texto e na imagem, e de tragédia, na construção da trama final, cria-se uma novela de muita ação, mistério e suspense.

“É verão! Férias da família brasileira.”

Apresentação

O pôr-do-sol sobre as montanhas.
Uma luminária, no interior de uma grande biblioteca abandonada, é acesa.
As nuvens passam atormentadas encobrindo a lua cheia e prateada que nasce no horizonte azul.
Uma lâmpada, em movimento pendular, ilumina, entre luz e sombra, muitos livros de várias cores.
Teia de aranha. Claro e escuro. Noite e dia.
O mar batendo nas pedras douradas pelo sol poente.
A lua cheia no céu azul estrelado.
A Luz, agora sem movimento, ilumina a mesa onde se encontram vários livros abertos . Detalhe de um e de outro livro.
Uma mão pequena e deformada abre e espalha nas páginas de um livro de capa dourada um pó brilhante.
Um relógio de pêndulo marca e faz soar as horas.

Relampejo
Um texto em caracteres desconhecidos, o pêndulo e os ponteiros em movimento do relógio, fundem-se com as montanhas, os picos encobertos por nuvens e os morros verdejantes que cercam Relampejo. Cidade histórica situada na serra do mar, perdida na mata tropical e cortada por uma sinuosa linha férrea que leva o interior mineiro ao litoral carioca e brasileiro.

Antonella, adolescente, muito branca, quinze anos, corpo de mulher, passeia pelos campos floridos. Ao fundo, podem-se ver os telhados coloniais da pequena cidade.

Antonella ( pensando e escrevendo ): - Querido diário, eu não podia imaginar que minha vida fosse ficar tão dividida e em muito pouco tempo tão agitada como uma tempestade no mar revolto das noites quentes de verão. Vivo com meu pai em Relampejo, uma pequena cidade esquecida por Deus. Lembro-me que naquela manhã, quando acordei, tudo era alegria. Via o mundo como ainda não o tinha visto. Não havia nuvens no céu azul e o sol, astro rei, iluminava o Brasil, anunciando o verão que chegava. Tudo era feito do mais puro azul.

Antonella encontra-se com uma amiga. Caminham de mãos dadas.
De uma elevação sinuosa, numa estrada que corta os outeiros, surge Fidor, um rapaz moreno de óculos pequenos, olhos azuis e rosto triste, pedalando sua bicicleta. Velozmente se aproxima das duas meninas que vinham pela estrada em sentido contrário.
Antonella solta a mão de sua amiga e corre. Fidor assoviando, aumenta a velocidade e pega no embalo, para facilitar a subida.
Ambos estão desatentos.
Encontram-se na lombada.
Fidor ainda tentou se desviar, mas o choque foi inevitável, os dois caem sobre um canteiro de flores silvestres.
Do outro lado, aproximando-se com olhar assustado, a amiga.
Antonella fica tonta, parece estar envergonhada. Fidor, ainda confuso pelo tombo, procura os óculos tateando a terra e, com intimidade, sem vergonha, passa a mão nas pernas levantadas e desnudas de Antonella, que assustada, como se estivesse acordando de um sonho, segura a sua mão, dá um suspiro e olha para Fidor com carinho.

Fidor (assustado): - Meus óculos, meus óculos ! Desculpe-me, você se machucou? Desculpe-me vai! Você apareceu de repente e não tive tempo de parar.

Antonella, agora fagueira e sorrindo, com ternura passa a mão no rosto de Fidor e pega seus óculos no chão.
Quando ela tenta ficar em pé, suas pernas grossas abrem mais a saia curta e colegial, mostrando um pouco de suas coxas brancas e leitosas e discretamente, num movimento rápido, sua calcinha de seda rosa.
Os olhos de Fidor brilham de luxúria e prazer.
De um pequeno corte no calcanhar surge uma gota de sangue.
Fidor, ainda sem os óculos, aproxima-se de Antonella. Abaixa-se até o machucado e num movimento lento, como se procurasse pelos óculos, passa os lábios no arranhão sujando-o de sangue.
Antonella sorri e entrega-lhe os óculos.
A amiga afasta-se assustada.

Fidor ( colocando os óculos): - Deixa-me ver Antonella! Meu Deus! está sangrando!

Antonella: - Não foi nada Fidor. Não houve nada. Não se preocupe, só fique mais perto de mim.

Um velho alto, de chapéu, segue um jovem anão sorridente que carrega um grande livro dourado.
Antonella e Fidor se beijam e se acariciam rolando na relva.
A amiga de Antonella se surpreende com a cena.
Antonella se afasta de Fidor e ele, levantando-se apressado, sobe na bicicleta, faz malabarismo, toca sem parar a campainha e afasta-se, pedalando morro acima, cantarolando de alegria e excitação.

Antonella (pensando): - Eu não devia ter deixado ele se aproximar, mas o destino nos colocou em choque. Como era possível fugir daquele olhar doce e azul, do seu jeito tímido e da sua voz suave e carinhosa ? Naquele mundo perdido, pela primeira vez em minha vida, senti um frio incontrolável que arrepiou toda a minha pele do corpo numa mistura de prazer e mistério.
Eu ainda não sabia, mas estava amando.

Rio de Janeiro
Apartamento de luxo.
Teresa, uma bonita e jovem mulher, lê um livro, grande e dourado.
O telefone toca.
Levantando-se de sua confortável “bergère” atende a estridente campainha.

Teresa: - Alô! Alô! Quem fala? Olha aqui, seu moleque, veja se me deixa em paz, eu tenho idade para ser no mínimo respeitada! Por favor, não me telefone novamente, sou amiga de sua mãe. Você está pornográfico menino! Eu não quero mais falar com você. Por favor, não insista seu pirralho, e vá pentear macaco que eu te ponho no colo e te dou umas palmadas.

Nervosa, desliga o telefone. O relógio marca 12 horas.
Sentindo um cheiro de coisa queimando, corre para a cozinha. No fogão, onde estão as panelas, há muita fumaça. Teresa apavorada pega um balde de água e joga em cima das panelas, fazendo uma grande confusão. Tenta pegar uma frigideira e queima a mão. Enlouquecida, chuta a panela do feijão, sujando o resto da cozinha.
Nesta bagunça chega o filho Márcio, de 17 anos, vestido num uniforme elegante de gravata e paletó.

Márcio: - Mãe! Cheguei e estou faminto!

Teresa perde o controle e empurra alguns copos no chão. Olhando de relance, pela janela, vê na rua sua filha Pati, de 15 anos, apesar da pouca idade, uma criança, mas também uma mulher, beijando com carinho o seu jovem namorado.

Teresa: - Ah! O amor... Como é bonito e delicado quando jovem e puro. Eu na sua idade já estava grávida. Que loucura!

Uma lágrima corre no seu rosto.
Acalma-se.
Passando a mão em sua perna sente dor.
Sua mão está suja de sangue. Chama sua filha.
Pati entra na cozinha assustada e tenta ajudar a mãe.
Márcio entra comendo um sanduíche com bastante molho de tomate e sua boca está vermelha.

Pati: - O que foi ? O que aconteceu ? Mamãe, porque a senhora está chorando?

Márcio (com a boca cheia) : - O que foi Pati? Mamãe não se sente bem? Que bagunça danada, onde estão as empregadas? Vocês sabem a que hora o meu pai vai chegar? Pelo visto nem almoço vai ter hoje nesta casa.

Teresa levanta-se do chão olhando para o filho que, fingindo não se interessar, continua comendo e se lambuzando com seu avermelhado sanduíche.

Pati: - Márcio! Não está vendo que mamãe está machucada? Pare de comer esta porcaria e venha me ajudar aqui!

Márcio : - Ih ! Vai tomar! Não me dê ordens, guria.

Pati limpa o chão da cozinha, enquanto Teresa, aérea, fala consigo mesma, caminhando para a sala.

Teresa: - Hoje está demais! Não tenho empregada; este maldito telefone e este menino pornográfico! Este mundo só pode estar doente! Pati, minha criança, namorando! Márcio, meu filho, que eu criei para o Itamarati, comendo igual a um animal! Porque me casei com o primeiro homem com quem fui para cama? Tive um filho aos quatorze anos e depois até abandonei a faculdade e tudo em nome do amor! Será que valeu a pena?
(pensando) - Onde está Jorge, meu marido ausente?

Teresa senta-se novamente na “bergère” e automaticamente pega no livro, abrindo-o na página marcada, mas não o olha, está pensativa, cansada.
Um escritório de luxo é o ambiente onde se desenrola uma reunião com quatro pessoas. Todos falam ao mesmo tempo.
O Presidente, sentado na cabeceira, está calado e, quando fala, os outros se calam.
O respeito ao velho senhor, de voz pausada, é total.

O Presidente: - Vocês todos estão com a razão. Cada peça tem seu espaço e, portanto, seu preço. Queiram me desculpar...

Aproxima-se dele um assessor que diz alguma coisa em seu ouvido e se afasta.

O Presidente: - Atenção senhores ! Cristina, que eu trato como se fosse minha segunda filha, chegou de Nova Iorque para o casamento da minha filha Suzana. Gostaria muito de ter as presenças de vocês na recepção que vou dar hoje à noite em minha casa para o noivo, o felizardo Alex, que vocês todos conhecem. (levanta-se com dificuldade de sua cadeira) Fiquem à vontade, só estou um pouco cansado, vou retirar-me - Jorge, você poderia me acompanhar até o carro? Obrigado meu filho - Alex, continue com a reunião, os negócios não podem parar - Senhores, às oito horas em ponto o jantar será servido. Lá voltaremos a conversar. Tenham todos um bom dia e obrigado.

Em um bar tipo americano cheio de pessoas, executivos que no final da tarde tomam alguns drinques, um piano toca músicas conhecidas e uma bela mulher negra canta um samba-canção com um suingue de jazz.
Sentados numa mesa estão Jorge, marido de Teresa, e um grupo de amigos. Todos bebem e o assunto é mulher.

Jorge: - Três coisas eu detesto: café requentado, champanhe morno e mulher fria.

Neste momento, entra no bar uma morena alta e vistosa. Todos olham em sua direção. Jorge levanta-se da mesa e vai ao seu encontro. Os amigos comentam uns com os outros aquele inusitado acontecimento.
Jorge se aproxima da mesa e orgulhoso apresenta aquele monumento de força e beleza aos amigos.

Jorge: - Quero lhes apresentar Christina, recém chegada de New York que volta ao Brasil e ao samba. Vocês me dão licença ? Tenho um assunto importante para tratar com ela. (Quando ela se afasta ele diz aos amigos com sarcasmo) - Enquanto isso, vocês ficam aí apreciando a minha performance.

Amigo: - É Jorge, está mulher é muito areia para o seu caminhão ! Você vai ter que comer muita grama para dominar essa égua. (Todos riem ).

No apartamento de Teresa, Pati e Márcio, continuam na arrumação da cozinha e Teresa, voltando à realidade, pergunta para os filhos sobre o livro que ela achou em cima da mesa.

Teresa: - Por acaso, meus filhos, vocês sabem de onde surgiu este livro? É de algum amigo de vocês?

Pati: - Não. Nunca o tinha visto aqui em casa.

Márcio: - Eu não leio livro de nenhuma espécie que não sejam de meus filósofos preferidos, especialmente romances menores, ainda mais quando tenho fome.

Pati: - Por quê? O que tem a fome com a ignorância?

Márcio: ( olhando para a irmã ) - Não tenho nada mais a lhe dizer!

Teresa volta o seu olhar para o livro.
Antonella caminha pelas ruas estreitas da pequena cidade histórica de Relampejo.
Atravessando a rua com pressa, sua amiga se aproxima afobada.
As duas conversam segredos.

Antonella: - Olha! Eu já lhe falei que não quero você comentando este meu caso com ninguém. Afinal você é ou não é minha amiga?
Amiga : - Antonella ! Eu sou sua melhor amiga e me sinto na obrigação de lhe abrir os olhos. Você sabe muito bem, e a cidade toda, que seu pai já combinou o seu casamento. O Adolfo Weber é de família importante e se você não parar de se jogar para cima do Fidor, aquele negrinho, toda a cidade, mais cedo ou mais tarde, vai ficar sabendo. Seu pai não vai gostar e juro que não será a minha boca que contará tal notícia: - “Vocês viram a filha do pastor com o empregado escurinho do armazém dos Weber ? ” Isto não vai dar certo, vai ser um grande escândalo.
Antonella : - Pára já com isso e cala essa boca ! Nada disso vai acontecer se você mantiver a sua promessa. Você jura, Maria ?

Antonella e a amiga chegam na porta da casa de Antonella.
A amiga faz uma cruz com os dedos, beija três vezes para concretizar a promessa. As duas se despedem. Antonella entra em casa. Seu pai a observa escondido atrás da cortina da sala.
Ao entrar em casa, Antonella vê o pai com um paletó na mão e o chicote na outra.

Antonella (pensando) : - Este é o meu pai: o bom e fanático homem de Deus ! A sua frase predileta era essa: este nego merece uma novena de relho “ e acho que era isso que ele queria dizer quando viu Fidor vindo ao longe.

Fidor vem chegando com sua bicicleta abarrotada de compras.
O Pastor coloca o chicote na mesa, veste o paletó, enquanto Antonella vai abrir a porta. Fidor entra e leva as compras para a cozinha. Antonella, com os olhos rasgados e vivos, o acompanha.

Antonella (pensando) : - Eu sempre me senti diferente de minhas amigas,
um pouco mais madura, menos criança, não sei ... Mas de uma coisa tenho certeza : Não posso me casar com Weber, por mais que isso seja impossível, não sou mais virgem, amo o Fidor, e sei como é doloroso viver sem amar ninguém !

O Pastor sobe numa cadeira.
Antonella com um alfinete marca o lugar onde deve costurar o paletó do pai.

Antonella( falando baixinho) : - Tenho o direito de ser feliz !

O Pastor fala para todos na casa.
Fidor se esconde, antes de sair, para olhar Antonella.
O Pastor começa a falar, olhando para baixo. Depois olha para o vazio.

Pastor : - Deus, protetor dos aflitos, fará você feliz. É por isso que eu rezo com ele todos os dias para que o diabo não entre nessa casa.

Fidor faz alguns gracejos para Antonella e, assustando-se com o sermão do pastor, sai correndo, deixando a porta aberta.

Pastor : - Antonella ! Feche a porta e abra o seu coração.

Antonella fecha a porta e volta aos alfinetes. De seus grossos lábios, picado por um dos alfinetes, corre uma gota de sangue.
O Pastor é mulato e Antonella branca como leite .
Antonella namora Fidor no mato, perto de uma cachoeira e ali perde a sua virgindade.
Teresa, que está lendo o livro e imaginando a cena de sexo, confunde o rosto de Antonella com o de sua filha Pati.

O Pastor : - Depois da morte de sua mãe o Sr. Weber tem me procurado no intuito de pedir, para o seu filho Adolfo, a sua mão em casamento. Hoje, vou ao seu encontro, para marcarmos o dia. Com sua mãe feliz, lá no alto em companhia de Jesus, e com o céu em festa, cantaremos juntos, Hosana e Aleluia, em sua homenagem.
Oh meu pai eterno ! Afaste de seu convívio as tentações mundanas e os pensamentos imperfeitos.
Forças do bem ! Levem Satanás para longe, para o mundo inferior e deixe esta família protegida !

O Pastor coloca a mão sobre a cabeça de Antonella que entra em transe e fica enfeitiçada.

Teresa está deitada na banheira coberta de espuma. Fecha o livro e mergulha a cabeça dentro da água. Jorge aparece na porta do banheiro e entra sem ser notado por Teresa. Quando ela começa a abrir os olhos cobertos por sabão e vê o rosto do marido, leva um susto, levantando-se da banheira. Jorge tenta entrar na banheira. Teresa recusa-o e afasta-se.

Teresa : - Não! ... não Jorge! Você me assustou! Te esperei o dia todo e você não apareceu ... agora não! Não tenho tempo ! Não posso me atrasar para o chá de panela de Suzana ! Lembre-se que ela vai casar com o futuro presidente da “Firma” e você bem que está precisando de uma promoção !
Jorge : - Ainda é cedo, amor. A promoção pode esperar.

Teresa cede um pouco e abraça Jorge que lhe dá um beijo, um outro e mais outro. Teresa cheira o pescoço de Jorge e sai da banheira se enrolando numa toalha ainda cheia de sabão pelo corpo molhado. Jorge tenta tirar a toalha. Teresa se afasta enrolando-se novamente na toalha. Jorge tira a sua roupa molhada e faz alguns exercícios em frente ao espelho.

Teresa : - Jorge ! Sua promoção, nossas férias. Já chegou o verão e você bem sabe que preferia ficar em casa estudando que freqüentar estas festas burguesas. Mas, como sempre, faço tudo para te ver feliz.

Teresa sai do banheiro vestindo um roupão, enquanto Jorge, nu, faz algumas flexões. no chão. Teresa volta ao banheiro sem abrir totalmente a porta.

Teresa : - Chegastes perfumado hoje, meu marido. Na próxima vez, passe num barbeiro e faça a barba, pelo menos fica o cheiro da loção.

Teresa fecha a porta com força.

Num bairro de luxo, com belas casas e jardins, fica a mansão onde mora Suzana. A casa tem os seus portões abertos. Teresa entra com seu pequeno e velho carro. A entrada principal está bem iluminada. O mordomo está à sua espera.

Mordomo : - Boa noite, senhora Teresa. A senhorita Suzi a espera no seu quarto.

Teresa o acompanha. Sobe uma escada e entra num quarto que estava com a porta aberta.

Teresa : - Suzi ! Suzi ! ...
Suzi : - Entra Teresa, estou aqui na banheira.

Suzana está deitada numa grande banheira redonda cheia de espuma. Ela é uma mulher muito sensual e bonita, nos seus 30 anos.

Suzi : - Me faça um favor Teresa, traz a minha toalha que esta aí na cadeira ?

Teresa pega a toalha e carinhosamente enrola o corpo molhado da amiga. As duas sorriem e saem do banheiro para o quarto.

Teresa : - Você está linda, amiga ! Vejo uma grande alegria no seu rosto. Este casamento vai lhe fazer muito bem ... Você merece ser feliz !
Suzi : - Vamos, Teresa ! Venha ! Me ajude a escolher um vestido que seja especial. É minha despedida da vida de solteira, desta virgindade, matrimonial, é claro. Quero estar linda esta noite !
Teresa : - O casamento, uma afirmação européia dos sonhos infantis, só se realiza num vestido árabe das mil e uma noites. Vamos achá-lo !

As duas se portam como adolescentes e buscam entre centenas de vestidos o apropriado para aquela noite.
Suzi, já muito bem vestida, senta-se em frente ao espelho para se maquiar. Teresa fica séria, e com dificuldade, tenta falar.

Suzi :- Teresa, vamos lá ! Como vai sua vida com Jorge ? Ele está satisfeito na “Firma” ?
Teresa : - Suzi, minha amiga, você sabe o quanto já lhe devo, não sei como lhe falar, mas tenho um novo pedido.

Enquanto Teresa fala, Suzi pinta o rosto em frente ao espelho

Teresa : - É sobre a “FIRMA” que quero mesmo lhe falar. Jorge vem se esforçando muito nestes últimos anos e está prestando um bom serviço.
Suzi : - É ! meu pai está satisfeito com ele.
Teresa : - Agora que você vai casar com o Alex e ele, mais dia, menos dia, vai se tornar o Presidente, fica uma vaga disponível na diretoria e ...

O telefone toca interrompendo a conversa.

Suzi : - Pode deixar Teresa que eu vou cuidar disso para você. Não se preocupe, meu amor. ( no interfone ) Alô ! Sim é ela ... Cristina! Já estou descendo. Teresa, vamos descer que os convidados estão chegando e quero lhe apresentar Cristina.

As duas descem as escadas.
Suzi está esplendorosa, mas Teresa é muito mais bonita e até mais vistosa, charmosa e num figurino menos compromissado com a noite, ela chama a atenção da bela mulher morena que está na sala, à espera de Suzana. Cristina é a mesma morena que acompanhava Jorge no bar dos amigos. Mas ela e Teresa não se conhecem.

Cristina : - Suzi ! Meu deus ! Como você está linda. Não haverá homens no mundo que não queiram casar com você...UAU ! Que luxo ! Minha amiga você vai estraçalhar o coração do Alex.

Teresa fica um pouco assustada e afasta-se daquela falastrona.

Suzi : - Teresa, venha cá, quero lhe apresentar uma grande amiga recém chegada de New York, artista premiada internacionalmente. Vive com o meu pai e vem revolucionando os corações dos homens - esta é Cristina! Vamos tomar uma champanhe e você me conta suas novas aventuras.

Suzi passa o braço na amiga e caminham abraçadas até o bar que fica no canto da sala. Suzi e Cristina falam entre si e Teresa, sentindo-se deslocada, afasta-se em direção à mesa de salgados e bebidas.

Cristina : (olhando Teresa que se afasta) - Quem é esta mulher belíssima?
Suzi : - Teresa ? Minha amiga da universidade. Íamos nos formar juntas, mas ela abandonou os estudos, grávida, para se casar com Jorge, que você conheceu, hoje cedo, lá na Firma.

Neste momento um bando de mulheres aos gritos invade a sala. Todas falam ao mesmo tempo, numa algazarra danada, se abraçam, trocam beijos e a festa se inicia. Muita conversa e gritos de alegria.
Todas as mulheres comentam a beleza de Teresa.
A champanhe é servida sem parar.
Teresa começa a ficar tonta e enjoada.
Cristina e Suzana conversam, quando chega o mordomo com um telefone sem fio.

Mordomo : - Senhorita Cristina, o telefone a chama.
Cristina : O telefone! Me desculpe, Suzana. (Afastando-se) - Alô ! É você ? Acabo de conhecer sua mulher e ela é muito bonita, seu canalha. Sim, eu sei que você pode me amar, está escrito nas estrelas, você me disse duas vezes e acreditei. Sim, vou encontrar você mais tarde, como prometi...Agora, mais do que nunca, eu lhe obedeço, meu amor.

Teresa, passando mal, caminha até o banheiro. Cristina, que está no telefone, vendo Teresa, fala mais alto, para que ela possa ouvir a sua conversa, as suas juras de amor. Teresa entra no banheiro sem entender a atitude de Cristina e, enquanto lava o rosto, ouve o falatório de duas mulheres que estavam trancadas no compartimento do vaso sanitário.
Fica ali ouvindo elas contarem estórias de Cristina. Falam alto e ao mesmo tempo, de coisas diferentes.
Uma empregada abre a porta do banheiro e chama Teresa ao telefone. As duas que estavam trancadas, saem apavoradas, limpando o nariz e olhando com risos para Teresa. Teresa atende ao telefone. É o seu marido Jorge.

Teresa (ao telefone) : - Alô, é você Jorge ? Estou um pouco... Não ! Vou ficar um pouco mais ...Já falei com Suzi ... Não quero, o quê ? Você vai aonde ?
Jorge (no telefone ) : - Teresa é um compromisso inadiável. Só vou poder voltar amanhã. A reunião vai até tarde e é melhor não me esperar hoje à noite, avise às crianças que estou preparando a nossa viagem de férias. Um beijo grande e cuide-se.

Jorge está na festa que o Presidente está oferecendo ao Alex. Fala ao telefone enquanto Alex faz algumas brincadeiras ao seu lado tentando tirar sua atenção. Os dois são observados pelo Presidente.

Teresa desliga o telefone meio desconfiada. Cristina despede-se de Suzi, olha para Teresa, e sai pela porta principal. Passa um garçom. Teresa toma mais uma taça de champanhe. Fica mais tonta a observar as pessoas em movimento. Fica transtornada e começa a procurar por Cristina.
Desorientada e perdida, anda pelos corredores e cantos da casa quando, de repente, sente que todos os olhares da festa convergem para ela. Assustada ela corre e pára com os olhos fechados nos rostos que giram, giram, sem parar, em expressões várias.
Teresa acorda na cama de Suzi. Olha para o relógio - uma hora da madrugada. Assustada, desce as escadas. Mulheres ainda na sala. Discretamente, sai da casa.

Uma pequena placa na estrada indica o caminho: Relampejo a 20 quilômetros.
Na pequena cidade de Antonella o céu está coberto de nuvens. Um vento muito forte varre as ruas levantando a poeira das pedras.
Em uma igreja secular da cidade é dia de festa, todos estão sorrindo. É o casamento de Antonella, que caminha para o altar acompanhada pelo pai. Rostos com várias expressões. Sorrisos e algumas lágrimas. Postados no altar, além do bispo, o noivo Adolfo e seus pais. Dois coroinhas e alguns figurantes empetecados.
Rosto do pastor e do bispo.
O pastor está com ódio daquela situação .
O Bispo olha com desprezo para o pastor.

MãeWeber : - Weber você reparou como o pastor não está se sentindo à vontade e não pára de provocar o bispo, eu sou capaz de jurar que antes de acabar o casamento esse pastor vai nos trazer problemas.
PaiWeber : - Os dois são inimigos. Já trocaram ofensas religiosas e logo passariam para a briga, se não fosse por minha intervenção. Eu lhe falei que o Pastor não aceitaria casar sua filha na igreja do bispo mas você insistiu ... e olha a confusão arrumada.

Imagens cômicas do pensamento do pastor.
Imagens trágicas do pensamento do bispo.
Saída da igreja.
Antonella despede-se do pai.

Pastor : - Oh ! minha filha ... Espero e creio que toda alegria do mundo está reservada a você e que o eterno e sagrado lhe proteja, é o meu desejo do fundo do meu coração. E lembre-se sempre: O que Deus uniu, nenhum homem pode separar.

Antonella joga o seu buquê de flores.
Sua melhor amiga Maria pega-o no ar.
Fidor, que podia ser visto do altar, ficou parado, durante toda a cerimônia, na porta da igreja. Agora anda nervoso, de um lado ao outro da rua.

Fidor : - Este maldito pastor não representa a única verdade na terra. Antonella, não vá ! Meu amor !

Fidor, observando a saída de Antonella da igreja, olha para o pastor e diz, varias vezes, com voz alta, o nome da amada.

Fidor : - Antonella !

Algumas pessoas seguram Fidor e o afastam da Igreja.
Antonella entra no carro com Adolfo Weber e todos ali presentes comemoram a partida dos noivos.
Com o barulho que os convidados fazem, ela não ouve os gritos de Fidor, que corre para o carro e é impedido por PaiWeber, que o segura pelo braço, enquanto o carro se afasta levando Antonella.
Os olhos de Fidor se enchem de lágrimas.
No carro, Antonella fica olhando para Fidor que se solta das mãos de PaiWeber e sai para o meio da rua desesperado.
A cena é comovente.
Corre uma lágrima dos olhos de Antonella. Fidor desaparece envolvido pela poeira.

Antonella (pensando) : - Meu querido pai, obstinado por minha felicidade manteve-me cega e me fez perder o que de mais caro eu tinha. Ele jamais entenderia que durante toda a cerimônia eu podia sentir o coração de Fidor pulsando forte, soluçando, num misto de emoção, amor e desprezo, por tudo que estava acontecendo.
Nunca mais vou me esquecer daquele rosto triste do meu único amor, ali, só, perdido no meio de tamanha hipocrisia.
Me espere Fidor, eu vou voltar e um dia seremos felizes novamente.

Nos olhos de Teresa a palavra que está escrita no livro:
“MEU AMOR EU VOU VOLTAR”

Antonella (pensando) : - Weber, como que pressentindo o meu desespero, vira o meu rosto molhado de lágrimas e tenta me beijar na boca. Eu me afasto. Ele tenta novamente com mais vontade e violência.
O carro em alta velocidade corre o bairro velho da cidade em busca de um hotel. Eu não conseguia coordenar meu raciocínio, nem tão pouco os meus sentimentos. A cidade vizinha escolhida para a nossa lua de mel me parecia vazia e triste.

O carro pára em frente ao hotel. No mar, o vento soprava forte. Raios cortam o céu.

Antonella: - Finalmente encontramos o hotel, se é que posso chamar assim aquela espelunca de extremo mau gosto, onde estive muitas vezes com meu pai, para celebrar o culto da sua igreja.


Uma poeira amarela invadiu o hall onde um recepcionista, meio efeminado, cumprimenta com familiaridade o casal e, com um sorriso maroto, oferece a chave do apartamento em forma de coração, para Adolfo, que pega Antonella no colo e entra com ela no elevador.
No quarto, Adolfo coloca com carinho Antonella na cama. Como que representando, afasta-se com um sorriso e, como um mágico, retira de uma maleta cheia de gelo uma garrafa de champanhe. Antonella sorri. Um sorriso triste.

Adolfo : - Surpresa ! Champanhe, geladinha ! Olha, meu amor, isto é segredo nosso, roubei no armazém do meu pai. Quando voltarmos para casa não conte nada, pois prometi não beber. Mas não podíamos deixar essa noite passar em brancas nuvens.
Segunda surpresa ! O meu presente de casamento. ( Um belo colar de ouro e pedras. Ele então oferece uma taça de champanhe para um brinde) - Vai ser uma noite na lua, em pleno espaço. Vamos flutuar, Antonella ! É o amor nos unindo. Antonella, vamos ! Dê um gole ... é borbulhante, esfria a alma e esquenta o coração. Vamos, beba ! Vai lhe fazer bem. Não precisa da timidez, eu sei que é sua primeira experiência e é preciso muita coragem para o desabrochar do amor. Ah ! O amor. Como esperei por esse dia ... !

Antonella cede e bebe um pouco, o suficiente para se levantar e entrar no banheiro. Adolfo acompanha com os olhos cobiçosos aquele corpo sinuoso. Antonella no banheiro está em frente ao espelho retirando a maquiagem. O seu rosto está pálido e triste.

Adolfo : - Antonella ! Antonella ! Venha logo, estou lhe esperando.

Antonella bebe de um gole só a champanhe e sai do banheiro.

Adolfo : - Ainda vestida ? Venha cá, meu amor !

Um pouco sem saber o que fazer, senta-se na cama ao lado de Adolfo que começa a lhe fazer carinho. Mais uma taça de champanhe e aos poucos ela se deixa levar e deita-se com ele.

Antonella (pensando) : - Não podia deixá-lo infeliz, afinal tinha me casado e prometi ao meu pai respeitá-lo e amá-lo e já não podia voltar atrás. Devo viver e esquecer o resto, mesmo que isto custe a minha felicidade e a minha vida.

Adolfo e Antonella fazem amor. Toda a coisa se passa rápido. Ele é precoce e sabe disso. Depois de fazer sexo, entra numa espécie de transe e diz coisas sem nexo, algumas barbáries tipo pornô, isto quando não fica violento. Levantando-se como um animal bravio da cama, nervoso, Adolfo tenta se desculpar com Antonella e se fecha no banheiro. Se olha no espelho com desprezo e lembra-se do seu pai lhe aconselhando.

O PaiWeber(comendo uma fruta madura e vermelha, caqui ou melancia e deixando o sumo escorrer pelos cantos da sua boca) : - Meu filho, as mulheres são como os frutos maduros, recém colhidos da árvore mãe, se mordidos deixam escorrer o sumo da virgindade e da fidelidade pelo seu corpo. Passam a ser o alimento do alheio, tornam-se impuras, sujas e sem nenhum valor.

Assim que a imagem do pai desaparece, Adolfo sai do banheiro como um louco e levanta com estupidez os alvos lençóis da cama onde estava Antonella.

Adolfo ( furioso) : - Cadê o sumo vermelho da fruta do meu pai ? ...
Antonella, você não é fruta madura colhida no pé. Você é fruta colhida no chão, seca e sem sumo.
Antonella ! você não é virgem ? Sua puta ! ! ( lhe dá um tapa no rosto).
Você me traiu, sua cadela. ( lhe dá outro tapa )
Tão nova ... Tão bonita ... Tão cheirosa... Tão saborosa e já podre, perdida na lama da várzea, fodida por um filho da puta qualquer. ( outro tapa )
Eu só não te mato é porque quero te ver escorraçada e apedrejada, mas mato esse cachorro que fez isto comigo. ( tenta enforcá-la ).

Adolfo volta à realidade e solta Antonella, saindo do quarto batendo a porta com força.
Antonella levanta-se e veste suas roupas. Quando já vai saindo do quarto, Adolfo volta mais calmo.

Adolfo : - Vai te arrumar que te levo para casa !
Antonella (pensando) : - Eu sabia, mas não imaginava que ele procuraria ali, naquela noite, a prova de minha infidelidade. Voltamos para a cidade e fomos direto para minha casa. Adolfo me deixou com as malas na porta e partiu fazendo barulho com o carro. Era noite alta. Não demoraria muito e meu pai apareceria. Eu tinha que pensar rápido.

As luzes da casa são acesas e o pai de Antonella, o pastor, ainda de pijama, abre a porta da rua. Antonella corre ao seu encontro.
Os dois entram em casa. As luzes da casa, todas acesas, vão se apagando uma a uma.

Na esquina um jovem muito bem vestido, blusa de malha listrada, paletó azul, calça de brim branca, parecendo um marinheiro de boutique, à tudo observa.

Os olhos de Teresa seguem o texto com avidez. É noite. Ela esta deitada em sua cama, semi nua, cansada, larga o livro de lado, espreguiça, acaricia-se e apaga a luz do abajur, mas não consegue fechar os olhos, não consegue dormir.

Na casa de Antonella o dia amanhece. O galo canta na cerca do quintal ao lado de uma jabuticabeira. O Pastor, já acordado, sai de sua casa para rua deserta. Ele anda gesticulando e falando sozinho.
O Pastor chega no armazém do sr. Weber. Os primeiros fregueses já fazem suas compras.

Pastor (constrangido) : - Bom dia Weber !
PaiWeber: - Bom dia ? Mau dia, meu caro Pastor Divino.
Pastor (olhando para os fregueses, em tom autoritário) : - Sr. Weber, o senhor me desculpe, mas tenho de ter uma conversa reservada...
PaiWeber : - Mas claro, Pastor. Foi muito bom o senhor ter vindo, tenho algumas coisas para lhe dizer também. Vamos até lá fora.

Os dois saem até a rua. O pastor, andando mais rápido, chega mais à frente. Weber fica parado, olhando.

Pastor(autoritário) : - Venha até aqui sr.Weber, mais perto, que história é essa que o senhor quer me contar ?
PaiWeber(tentando se aproximar, falando alto) : - O meu filho voltou para casa e não passou uma boa noite e eu fiquei preocupado ...
Pastor(cortando a conversa) : - Vamos abaixar o tom da voz porque aqui não há nenhum surdo. Weber, a minha filha chegou em casa levada pelo seu filho e chorava até há pouco, quando eu saí.
PaiWeber ( pegando no braço do pastor e caminhando com ele para longe dos curiosos que se amontoavam à porta do armazém) : - Hoje de manhã, bem antes do sol nascer, hora em que eu acostumo acordar, encontrei-me com meu filho Adolfo armado, saindo para o armazém. Fomos juntos. Perguntei por Antonella e ele não me respondeu. Estava calado e tenso. Quando chegamos à porta do armazém, vinha do outro lado, chegando também, o nosso empregado Fidor, em sua bicicleta e assim que nos viu fez uma cara de espanto, deu meia volta e partiu em disparada. Adolfo pegou o nosso velho caminhão e saiu atrás dele. Isto aconteceu um pouco antes do senhor chegar. E estamos todos aqui preocupados com o que poderá ter acontecido.

Adolfo persegue Fidor pelas ruas estreitas com o seu caminhão. Fidor, um mestre na bicicleta brinca com ele. Adolfo tenta acertar os dois tiros da espingarda e erra. Fidor faz o sinal de corno. Ele fica enfurecido e descontrolado. O caminhão tomba pela ribanceira. Mas ele pula e, num ato de sorte fica estirado na estrada. Fidor pára a bicicleta e ainda consegue vê-lo se levantando e voltando para a cidade, para o armazém.
Adolfo chega ao armazém todo sujo, sem a arma e sem o caminhão. Quando vê o pastor fica enfurecido e aumenta os passos em sua direção falando bem alto para que todos ali possam ouvir as suas lamúrias.

Adolfo Weber : - Pastor ! Tenho-lhe o maior desprezo e só por isso vou lhe fazer uma confidência: - Sua filha, infelizmente, já não é mais virgem ! Aquele esperto do Fidor chegou antes e parece-me que o ato desonroso foi consumado na sua casa e na sua cama, velho decrépito, e agora o que o senhor vai fazer ?
As pessoas: ( gritando a sentença para Antonella em uníssono ) - Vamos expulsá-la da cidade a pedradas ... Vamos todos juntos, vamos ! Um viva para Fidor - Viva Fidor ! Morte para Antonella ! Morte !
Pastor : - O sr. não sabe o que está falando ! O senhor me deve desculpas ! Não permito que os senhores falem de minha filha e as senhoras histéricas deveriam atirar pedras em si mesmas pois vivem em pecado e ...

O Bispo vem se aproximando. O Pastor pára de falar. Todos fazem silêncio. O Bispo fica animado. Aumenta o passo e estufa o peito. Levanta a mão e prepara a garganta... É interrompido aos gritos pelo Pastor.

Pastor : - Eu sabia ! Eu sabia ! Conspiração ! Conspiração ! É isso ! É isso ! Formou-se um complô contra a verdadeira igreja de Deus, contra todas as pessoas honestas de Relampejo, contra o povo, comandados por este belzebu vestido de saia que teve um caso duvidoso com uma criança e por isso foi afastado da grande cidade e da mordomia episcopal, esta meia dúzia de arruaceiros e difamadores irão se ver comigo na justiça dos homens e no julgamento do Senhor meu Deus. O senhor é meu pastor e nada me faltará!

O Pastor vai falando e se afastando. Derrotado psicologicamente volta para casa. A polícia chega e afasta as pessoas. O dia volta ao normal. O Pastor caminha cabisbaixo pela rua. Fala sozinho. Pára de andar e fica pensativo, quase catatônico. Volta a andar. Desconfia da sua verdade.Retorna à realidade e, enfurecido, anda mais rápido. Aos tropeços, cansado, chega e entra em sua casa, passando mal, suando frio e resmungando, praguejando, sem voz, chamando Antonella. Senta-se na sua cadeira, pega a bíblia que está ao seu lado e tenta folheá-la, não consegue, deixando-a cair no chão.
Tem um ataque cardíaco e morre sentado.


Teresa acorda com a campainha e, ainda sonâmbula, vai atender a porta. Na porta tem uma surpresa, o rapaz que ali está parado é o mesmo que ela imaginou ser e que no livro observava, bem vestido, a casa de Antonella quando ela chegou da fracassada lua de mel. Vendo-o, fica confusa e não sabe o que fazer.

O Marinheiro : - Bom dia ! Desculpe-me a hora, mas a senhora poderia me informar se é aqui que mora, vive, o senhor Jorge Borman ?
Teresa : - Sim ! é aqui que ele mora.
O Marinheiro : - Por favor, ele se encontra ?
Teresa : - Não ! ele fez uma viagem.
O Marinheiro : - Então, muito obrigado. Tenha um bom dia.
Teresa : - Um minuto ! O senhor não quer entrar ou deixar algum recado ?
O Marinheiro : - Não, ele não me conhece. Mesmo assim, obrigado. Tenha um bom dia.

O Marinheiro se afasta. Teresa permanece na porta meio enfeitiçada e antes de entrar, diz o que gostaria de ter dito antes:

Teresa : - Mas, quem é você ? Qual é o seu nome ?

Uma rua movimentada do centro da cidade. Um grande prédio. Jorge Bormam sai do prédio acompanhado de um senhor alto e de um anão. Carregando uma pasta pesada, ele entra só no carro. Dirigido por Cristina o carro arranca com velocidade, desaparecendo no trânsito.

Na Firma, o presidente está sentado em sua cadeira de veludo vermelho. Ao fundo, uma pintura a óleo de um grande artista e ao lado uma janela de vidro emoldura uma infinidade de edifícios.

O Presidente : - Senhor Ortega, estou cada dia que passa me sentindo pior. Chegou ao Brasil o representante do Bispo e tenho uma remessa de dinheiro e gostaria que Jorge fosse o portador. Preciso que você o acompanhe nesta tarefa. Quero nomeá-lo presidente da Firma, mas preciso antes testar sua confiança. Ele é talentoso mas ainda muito jovem, sujeito às tentações capitalistas, você sabe como é ! ...
Alex vem chegando. O homem alto e o anão despedem-se do Presidente que lhes dá um envelope e com um gesto de mão faz com que saiam da sala com pressa. Alex, arrogante, detém-se a observá-los, faz um sinal de cumprimento e se aproxima do Presidente.

Alex : - Presidente, o senhor tem muita paciência com esses dois. O que eles queriam agora ?
Presidente : - Alex, você não é um bom observador, precisa ter mais atenção nas pessoas. O senhor Ortega é meu fiel amigo há muito tempo, muito antes de você começar este namoro com Suzana e entrar aqui para a Firma. Atenção para o mundo, se não ele te engole como Jonas, na Bíblia, que foi engolido pela baleia. Peça ao meu motorista para me levar em casa.

O carro, onde estão Jorge e Cristina, estaciona em frente de uma casa antiga de dois andares. Cristina desce sozinha e toca no interfone. A porta é aberta e ela entra.
Na porta de entrada do segundo andar, é recebida por dois seguranças. Um pega a sua maleta e o outro permanece ao seu lado.
Um homem idoso, com um vasto bigode, e um forte sotaque espanhol recebe Cristina com um grande sorriso. Os dois seguranças revistam-na superficialmente, mesmo porque, ela estava com um vestido que a colocava semi nua. Coberta apenas, nas partes mais íntimas, por uma seda fina e branca. Uma roupa oriental das mil e uma noites.
Na sala, muito bem decorada, ficaram os dois frente à frente. O espanhol foi logo engrossando e ameaçando-a por tê-lo abandonado.

O Espanhol : - Fiz por ti o que nunca teria feito por minha mãe ! Com que direito me deixa em Buenos Aires e agora volta carregando o dinheiro do Presidente para mim ?
Cristina : - Ora meu amor, você sabe muito bem que o Presidente é quem me quer de volta e portanto lhe mandou o seu pagamento. Não é suficiente para cobrir o meu valor, porém é muito dinheiro. Mas vim pesoalmente porque gostaria de ter um último encontro com quem passei os melhores anos de minha vida.
O Espanhol : - Você tinha de tudo, do bom e do melhor, porque eu tinha a presidência do meu país. Mas, com esse dinheiro, que aquele verme me devia, eu posso pensar em retornar ao meu país e serei eleito democraticamente. Você vai ver... o povo é como criança, gosta de violência e eu sou violento, gosta de dinheiro e eu dou dinheiro, gosta de mulher e eu sou um mulherengo, gosta de música e eu toco o Cucurucucu Paloma. Eu sou o que o povo quer ser. Estou eleito, você sabe. Só duas coisas eu quero: uma é a presidência e a outra é levar você comigo de volta, Cristina. Coisa linda ! Teremos tudo novamente, vou recuperar tudo aquilo que me tomaram. Peça por peça. Pessoa por pessoa. Mi amore ! Nada mais vai nos separar.

Enquanto fala, ele pega um sabre japonês com uma lâmina bem afiada e com cinismo passa-o lentamente, cortando um monte de jornal. Como quisesse mostrar à Cristina o perigo que ela corria se não seguisse os seus desejos.

O Espanhol : - Você não tem escolha ! O Presidente não tem mais nenhum poder, está velho e canceroso, vai morrer e você estará desprotegida. Portanto, ao meu lado ...
Cristina : - Sem dúvida, meu amor, e eu vou te dar tudo aquilo que você gosta...você se lembra de como eu dançava enquanto você ouvia a sua música predileta ?

O espanhol aperta um botão na mesa e a música mexicana soa alto. Cristina se aproxima do Espanhol com a mão no traseiro, rebolando com sensualidade, mostrando sua calcinha, faz com que os olhos do Espanhol brilhem de prazer e quando ela chega bem perto, sem que ele notasse, delicadamente retira de dentro do seu sexo um punhal, pequeno mas afiadíssimo e, com a rapidez de um samurai, coloca-o e pressiona com firmeza, a sua brilhante lâmina, no pescoço do surpreso Espanhol.

Cristina : - Agora, seu filho da puta, chame os seus gorilas !
O Espanhol : - Vicente ! Antônio !

Entram no quarto os dois seguranças.

Cristina : - Joguem os revólveres no chão e se aproximem !
O Espanhol : - Faz o que ela está dizendo !
Cristina : - Agora, eu vou sair com ele e vocês fiquem onde estão...

Os dois seguranças não param de andar e pulam, cada um de um lado, em cima de Cristina, que já preparada, pega com rapidez o sabre na mesa. Num gesto rápido, com o pequeno punhal corta a garganta de um dos seguranças e com o sabre, em outro lance de samurai, rasga, num golpe preciso, longitudinal, o peito do outro, que cai estrebuchando. O Espanhol, ainda vivo, atônito, paralisado, fica com cara de pavor.

O Espanhol : - Eu que vivi quase uma vida com você, só agora sei quem você é ! Você é ...ahrg....

Antes que ele pudesse terminar a frase Cristina friamente enfia-lhe todo o sabre japonês na barriga e como num haraquiri, forçando a lâmina para cima, levanta o Espanhol do chão. Com um chute no peito o empurra para trás retirando a lâmina do sabre e jogando-o no chão. Toda suja de sangue entra no banheiro abre o chuveiro e toma um banho.
Jorge, já preocupado, sai do carro e toca as várias campainhas até a porta se abrir e lá de dentro sai Cristina de paletó, gravata e nua por baixo.

Cristina : - Ele não queria o dinheiro e arrancou a minha roupa, estava louco e eu tive que acabar com ele.

Entra no carro com a pasta cheia de dinheiro.
O carro, agora dirigido por Jorge, arranca com violência.


Teresa está no consultório de seu analista que está sentado na mesma posição em que morreu o pastor. Tinha em sua mão um livro do filósofo Nietzsche. “Genealogia da moral”.

Teresa : - Me casei muito jovem com meu primeiro namorado. Já estava grávida. Tinha eu só 14 anos, era época de paz e de amor e não sabíamos de nada. Foi uma imposição da minha família este casamento. Eu senti que eles queriam ficar longe de minhas loucuras e me passaram ao primeiro que apareceu. Jorge era um brilhante e talentoso jovem. Eu sabia. Estudante de direito, resolveu participar do diretório estudantil e lá estava ele em pouco tempo na clandestinidade. Não chegou a participar das ações armadas e assaltos, pois não sabia atirar, era da retaguarda e foi logo preso. Solto, depois de um ano, estávamos casados. Jorge foi trabalhar no banco que ele deveria ter roubado. Voltou a estudar e eu em casa cuidando de meu filho. Ele não permitia que eu trabalhasse. Depois, nasceu Patrícia e eu me tornei definitivamente uma dona de casa. Assim que se formou em direito Jorge foi ser consultor jurídico de uma grande empresa de exportação do pai de uma amiga nossa, onde trabalha até hoje. Eu sempre desconfiei que ali havia um caso, mas por outro lado, não podia acreditar que Suzana me trairia. Doutor Zara, eu não agüento mais essa paranóia que vem sem explicação aumentando dia a dia. Em verdade, estou insatisfeita com o meu casamento. Jorge não me dá mais atenção. Acredito que ele não me ame mais, ou quem sabe, nunca me amou. Não nos relacionamos mais intimamente, ele diz que é o trabalho e eu digo que é a outra. Minha vida se esvai e já não encontro mais sentido para continuar casada com ele. Meus filhos ? Ah ! que inferno. Pati tem um namorado mais velho e nem sei se permanece virgem. Meu filho Márcio quer ser um militar, um milico, e é um machão insuportável, tudo o que eu não queria; insensível e autoritário. Está tudo errado doutor ! Doutor, o senhor está dormindo ?

O livro que estava em sua mão cai no chão. O quadro é o mesmo da morte do pastor.

O carro de Jorge e Cristina estaciona na porta do edifício da Firma. Jorge sai com a pasta e entra no prédio, enquanto Cristina arranca com o carro quase provocando uma batida.
Jorge passa pela secretária e entra no gabinete do presidente. O Presidente parece que já o esperava.

O Presidente : - Entre Jorge e fique à vontade. Pode colocar esta pasta ali na mesa. Obrigado, foi um trabalho perfeito, é por isso que gosto da Cristina, rápida e eficiente. Vocês formam um belo casal. Meu filho, você tem nos ajudado muito com nossas empresas, nos defendendo com
brilhantismo nos tribunais e me feito muito feliz. Você é uma pessoa diferente destes pés-rapados que vivem por aí. Você tem berço, tem o sangue espanhol do seu pai, velho amigo que nos deixou tão cedo. Você até agora só cometeu um erro: ter casado. Não é que eu não goste da Teresa, mal a conheço, mas o casamento prende o homem, forma um compromisso, cria filhos e problemas. Quanto à visita, feita hoje por vocês e que resultou na morte deste bandido, deste marginal que vivia nos chantageando, quero lhe dizer - a única pessoa que podia se aproximar dele com segurança era Cristina que tinha sido sua amante aos 13 anos de idade. Dizem que poderia até ter sido sua filha. Numa viagem que fiz ao seu país, quando o general bandido, com um golpe militar, tornou-se presidente, a conheci e fiquei com pena da menina que era tratada como escrava pela família do
general - apanhava de sua mulher todos os dias de chicote ! Fiz uma oferta generosa em dinheiro, irrecusável ! Ele aceitou e eu trouxe pra cá a bela Cristina. Sim ela, foi comprada por muito dinheiro, não tenho vergonha de contar. Ela sempre teve do bom e do melhor e, como você sabe, estou morrendo e na certa não poderei levá-la comigo. Bem que gostaria. Eu a amo, sempre a amarei e por tantas e boas que vivemos nestes anos é que eu quero que você tome conta dela para mim. O Alex é muito estourado, pouco inteligente, preciso de alguém que tome conta dele e de minha filha. Eu só confio em você Jorge e quero que se sacrifique mais um pouco por todos nós. Cristina já está informada dos meus desejos que são leis para ela. É uma mulher de caráter, você vai ver, e o Alex por conhecê-la, bem sabe que ela tem todo o poder, estando com você. Ocupará a presidência durante um tempo, como a rainha da Inglaterra ocupa o Palácio de BUCKINGHAM . Deixo o meu testamento dividido entre Cristina e Suzana e você nomeado como diretor superintendente da FIRMA. Assino agora este papel que lhe passo às mãos, para caso você precise e peço-lhe para não deixar o Bispo esperando muito tempo aquela remessa de dólares.


O cemitério da pequena cidade de Relampejo está repleto de pessoas de todos os níveis sociais. Vai ser enterrado o Pastor. Muita choradeira e brigas entre os que gostariam de ter levado o caixão até o túmulo.
Antonella está inconsolável. A família Weber está toda presente. Adolfo tenta a todo momento se aproximar de Antonella.
Dois detetives, desconhecidos na cidade, esperam o final da cerimônia para se aproximar de Antonella.

Detetive : - Antonella ! Sou o detetive Soares e este o detetive Leite. Fomos admiradores do seu pai, o Pastor Divino. Pertencemos à igreja fundada por ele e estamos aqui para lhe proteger a pedido da direção nacional e também para prestar ao seu pai, nosso líder espiritual, nossa última homenagem. Nossos advogados estão chegando para tratar de sua herança. A partir de hoje, estaremos a sua disposição 24 horas por dia se for preciso.

Adolfo se aproxima de Antonella. Os dois detetives tentam segurá-lo mas Antonella faz com que eles se afastem e conversa com Adolfo.

Adolfo : - Antonella, eu quero te pedir desculpas por tudo que aconteceu. Para mim não tem importância se você é ou não virgem. Eu não tenho este problema, mas fui na conversa do meu pai e me confundi todo. Vai, me desculpe, eu não consigo te esquecer. Tenho vivido um profundo desgosto nessas poucas horas que me parecem muitas. Vamos, volte para mim Antonella, eu te perdôo !
Antonella : - Eu não tenho nada que te perdoar e não precisa se desculpar Adolfo. Eu é que estava errada não te revelando os meus segredos íntimos, afinal, tinha me casado com você ... mas hoje, agora, eu quero ir para casa e lá relembrar um pouco do meu pai e organizar a minha vida.

Antonella sai do cemitério. Uma nuvem cobre a luz do sol. Começa a chover. Abrem-se os guarda-chuvas. As pessoas se juntam em grupos para se protegerem.
Um grito forte de dor, ouve-se no ar.

Casa de Teresa.
Márcio briga com Pati que sai levando a pior e só não se machuca mais por que Teresa chega para apartar. Teresa está tonta e cansada. E, por causa do esforço, fica pálida e encosta-se na parede.

Teresa : - Nunca mais façam isso ! Os dois estão me ouvindo ? Vocês estão ficando malucos ?
Márcio : - Mãe a senhora está cega, ou não compreende o que se passa aqui nesta casa ?
Pati : - Mãe, ele é um velho novo e não compreende nada a não ser os ensinamentos que lhe passa a velharia com quem você anda convivendo !
Teresa : - Que velharia ?
Márcio : - São meus professores ! Nos reunimos para estudar filosofia.
Teresa : - Quais filósofos ?
Márcio : - Nietzsche, Sun Tzu, Renan, entre outros.
Teresa : - A morte de Deus. A arte da Guerra e o Anticristo. Me diga uma coisa : como fundo musical destas reuniões, vocês ouvem Wagner ?

Patrícia dá um riso maroto e olha com orgulho para a mãe.
Márcio fica ofendido com Teresa que protege Patrícia.

Márcio : - Eu compreendo vocês duas, sempre juntas, uma defendendo a outra ...
Teresa : - Você ainda é muito criança para compreender o que eu venho passando !
Márcio (nervoso) : - Aqui ó ! Eu não sou mais criança ! Mãe, todo mundo da rua sabe o que Pati anda fazendo com aquele marica, drogado e maconheiro !
Pati: - Quem anda falando sobre a minha vida ? Meu irmão, em vez de me defender, fica aí como machão de esquina junto com seus amigos imbecis.
Teresa : - Vocês estão bem crescidos para serem um pouco mais racionais. Menos burrice e mais inteligência ! Agora vão cuidar de suas coisas que eu quero descansar. Pati, volte aqui que eu quero ter uma conversa com a senhora. Márcio ! Vá até à esquina e veja se me encontra...

Márcio sai batendo a porta da rua.

Pati : - O que foi Teresa ? - Você diz estar cansada mas a palidez no seu rosto realça sua beleza, onde concluo que o stress lhe faz bem.

As duas sorriem e Teresa relaxa.

Teresa : - Pati, não venha com enrolação, o que está acontecendo para seu irmão ficar tão excitado ?
Pati : - Ora ! Teresa, estou namorando , estou apaixonada, há algo de mal nisso ?
Teresa : - Não, minha filha ! não há nada de mal nisso. Mas ...
Pati : - Mas ? Márcio e seus amigos truculentos não aceitam o meu namorado, ele é cabeludo, gosta da liberdade, de aventura, de rock and rool, de ...
Teresa : - Sexo e drogas ! Pati eu não sou tão velha assim e no mais,... deixe para lá, você deve saber o que faz. Eu acredito em você, é o melhor que eu posso lhe fazer meu amor. Agora vamos pôr a mesa que seu pai está chegando.

Márcio anda pela rua cabisbaixo e não vê o seu pai saindo do carro novo, conversível, que ele deixou encostado no meio fio.

Jorge : - Ei ! meu filho ! Márcio ! Esta apaixonado ? O que foi, ficou cego ? Não vai falar nada sobre o conversível que comprei para sua mãe ? Psiu - é segredo de estado, ela não pode saber, só hoje à meia noite. Você sabe que amanhã ...
Márcio : (debochando) - É dia do seu aniversário de casamento. Parabéns !
Jorge : - O que está acontecendo meu filho ?
Márcio : - É a Pati ! Estou enfurecido ! Estou envergonhado ! Todo dia ouço uma graça a seu respeito, estou cansado de brigar por ela. Minha mãe ainda fica em sua defesa, aí já é demais ! Eu não consigo entender o que ela vê naquele sujeito. Porque aquele traste cabeludo, maconheiro, metido a cantor, que passa o dia todo rebolando, vai viver pouco se as coisas continuarem assim. A boboca fica toda derretida por ele. Minha irmã namora um viciado, um rebelde das antigas, é o fim !
Jorge : - Vamos entrar que eu lhe prometo: vou falar com ela e resolveremos toda esta perlenga...
Teresa : - Oi Jorge ! como passou o dia ?
Jorge : - Muito bem ! Tenho novidades para você.
Teresa : - Boas ou más ?
Jorge : - As boas primeiro: - Acabei de ser nomeado, graças a você, (um beijo) superintendente, diretor, o segundo em hierarquia na Firma ! Tem um presente lindo de aniversário, ali na porta, que eu comprei para você ... Não, só pode ir lá fora comigo, depois da meia noite. Me dê outro beijo gostoso !
Teresa : - Jorge, me largue, deixa eu ir lá fora !
Jorge : - Não, Teresa, ainda falta eu lhe dizer as más.
Teresa : - Deixa para depois da meia noite, meu amor, venha cá que vou te fazer um cafuné. ( Teresa começa a chorar ) Eu ando tão triste Jorge com minha vida, que tenho medo de ficar novamente deprimida e estragar as nossas vidas.
Jorge : - Deixa que eu vou resolver as crises destes dois adolescente. Pati ! Márcio ! ... Estão me ouvindo ? ... Já vou aí para podermos conversar ...

Teresa vai até o fogão e com curiosidade olha pela janela tentando ver o que estava lá fora. Jorge chega por trás e lhe dá um abraço.

Jorge : - Teresa, meu amor, o cheirinho está delicioso !
Teresa : - Ora ! pare com isso ! não vê que estou tirando as panelas do fogo ?
Jorge : - Temos de ter uma conversa sobre o namorado de nossa filha...
Teresa : - Você não vê que desta maneira vai magoar a nossa filha, dando razão às ciumeiras infantis do Márcio ? Ela é uma moça ! Menstruou-se outro dia ! Tem todo o direito de namorar quem ela quiser.

A família senta-se à mesa em silêncio. Os dois filhos comem pouco e sobem para o quarto. Jorge beija Teresa e sobe para o segundo andar, onde vai conversar com Márcio e Pati. Teresa acaba de arrumar a mesa e senta-se novamente na poltrona com ar de cansada. Automaticamente pega no livro que está lendo e abre na página marcada.


Antonella retorna para sua casa. Na rua é cumprimentada por várias pessoas que lhe dão os pêsames pela morte do pastor, seu pai. Ao aproximar-se de casa, passa por uma pracinha e lá, encostada na sua árvore, está Maria, a sua mais querida amiga, abraçada a Fidor. Todos os olhares se cruzam. Fidor se afasta e tenta se aproximar de Antonella que aumenta o passo em direção ao armazém dos Weber, que fica na outra esquina. Fidor volta para a praça. Antonella finge entrar no armazém e sai por outra porta, atravessa a rua e entra em casa.


No apartamento, Jorge está sentado no sofá em frente a uma televisão. Teresa senta-se ao seu lado. De uma bolsa cheia de gelo ele retira uma garrafa de champanhe, duas taças, olha para o relógio - 12 e 30 horas, levanta, explode a rolha do champanhe e com alegria, brinda o aniversário de casamento. Pega Teresa com carinho e a leva aos beijos e abraços até o carro estacionado na rua. Os dois entram no carro e saem para passear. Jorge dirige e Teresa parece, com o vento no rosto e os cabelos esvoaçantes, enfeitiçada.

Adolfo, em frente à casa de Antonella, está indeciso. Entra - não - entra. Toma uma decisão e entra. Antonella abre a porta. Adolfo traz uma rosa na mão e um sorriso no rosto. Demonstra felicidade e tudo lhe parece bem. Antonella, que estava com o rosto vermelho de tanto chorar, dá um pequeno sorriso e pega na mão de Adolfo. Coloca-o a vontade, fazendo-o sentar-se na sala. Põem a rosa num pequeno vaso ao lado de uma estatueta de São Jorge.

Antonella : (pensando) - De fato eu não podia negar que tinha um certo amor escondido em meu coração por Adolfo. O modo desajeitado de como ele faz as coisas, uma certa inibição em sua ação, e seu jeito de criança, me deixa no mínimo maternal. Será que eu podia, finalmente, ter o direito de saber - ser - feliz ?
Adolfo : - Antonella, como você me faz feliz. Viver aqui ao seu lado é o paraíso, é o máximo, é tudo que eu quero. Não sei, mas lhe devo uma explicação de todo o mal entendido que houve entre nós. Foi tudo culpa do meu pai. Ele e suas estórias. Não quis nunca o nosso casamento. Me expulsou de casa quando falei que voltaria para você, mesmo não sendo virgem... Mas agora, o que importa isso tudo ? Estamos juntos, não estamos ? Farei de você uma princesa e nossas vidas serão dedicadas ao amor e à felicidade.

Os dois se beijam e fazem amor. Adolfo se porta como um verdadeiro amante.

É noite. O carro em movimento. Cidade, ruas e carros. Amanhecendo, lusco fusco e contra luz. Teresa segue Jorge em seu conversível. O seu rosto impassível repete a cena dos cabelos esvoaçantes. O clima da ação vai aumentando com a trilha musical e os movimentos dos dois carros passam a ser nervosos, tensos e uma perseguição cinematográfica, hollyoodiana, se faz necessária.

Teresa : (pensando, enquanto persegue o marido) - Jorge, porque você me engana ? Não lhe basta o meu amor ? Os nossos filhos ? O que está acontecendo ? Eu não consigo mais entender. O que está acontecendo comigo e com você ?

Teresa freia o carro. Exausta, se encosta no volante e chora. Aproxima-se dela o marinheiro das cenas anteriores.

Marinheiro : - Alô ! Muitas coisas acontecem conosco e não nos lembramos delas no dia seguinte. Posso citar o vôo de um beija-flor ou o canto de um sabiá e até o som forte dos sinos de uma igreja, num domingo esquecido, perdidos na distante Indonésia. Mas e se quando acordamos estivermos num lugar onde se vive o desconhecido ?

Teresa olha assustada, do volante do seu conversível, para o lado e ao ver na sua frente, em pé, na rua, o marinheiro de rosto conhecido afasta-se, para que ele entre e assuma o volante do carro. Teresa deixa-se levar pelo encanto da cena, desfalecida no ombro do platônico amante. Puro sonho. Tem os seus cabelos esvoaçantes perdidos nos ventos incorrigíveis do cinema nacional.
O Mar bate forte nas barrancas de um farol perdido numa noite escura e enevoada. De uma igreja perdida pode-se ouvir o som dos sinos em lúgubre responso: Teresa, Teresa, Teresa.
O carro detém-se na porta da casa de Antonella. O marinheiro tenta falar, mas um som estranho sai das profundezas de sua garganta, fazendo com que uma coruja, a que tudo observa, fique assustada e levante o vôo.
Teresa acorda deitada no chão, totalmente molhada de suor. Na sua cama desarrumada, está Jorge, que ronca e dorme um sono solto.

Na porta do armazém, o PaiWeber está conversando com um freguês. O seu filho Adolfo conversa com uma mulher empetecada, nunca vista em cena. A atitude, o movimento nervoso e os olhares de Adolfo são suspeitos. O pai, que a tudo observa, tenta esconder o acontecido levando o freguês para dentro do armazém. Adolfo entra com a moça para uma casa que fica ao lado do armazém. O pai sorri safadamente. Chega a MãeWeber e, num gesto agressivo, puxa o Sr.Weber para fora do armazém.

MãeWeber : - O que está acontecendo agora nesta casa ? Com quem Adolfo entrou na casa ao lado ? Olha, não me engane que eu vi tudo ! Tenho ouvido muitas estórias aí pela rua e todas elas nos dizem respeito. Qual é a sua relação com a igreja do pastor Divino ? O que eu sei, é que vocês sempre foram conhecidos, mas negócios com ele eu nunca soube que você tinha, Weber.
PaiWeber : - Não se meta mulher ! E deixa seu filho em paz. E os meus negócios são os meus negócios e não interessam a ninguém.
MãeWeber : - Olha aqui: fique protegendo este seu filho em todas as suas maluquices que você vai ver onde tudo isso vai acabar ! Ainda bem que acabou este casamento com esta muquirana sem vergonha, é filha de um pastor, que Deus o tenha, mas tem o diabo no corpo.
PaiWeber : - Olha, mulher, tem muita coisa que você não sabe da minha relação com o pastor. Por isso, é bom você ficar calada e me ouvir um pouco. Conheci o Divino ainda muito jovem, quando ele fundou a sua igreja e sempre fui de sua total confiança. Antes de me casar com você, um certo dia, em sua casa ...

O Pastor acompanhado por Weber, ambos jovens, estão na sala da casa de Antonella. Lá escondido atrás de uma imagem de Jesus fica um cofre onde o pastor guarda alguns pesados embrulhos. Fecha o cofre e abraça o jovem Weber.
O Pastor : - Weber, você é meu melhor amigo, meu fiel seguidor e o primeiro pastor da minha igreja, não há segredos entre nós, vou lhe fazer umas confidencias: as doações dos fieis vêm subindo muito ultimamente e em algum tempo terei guardado no cofre o bastante para construirmos a primeira grande Igreja do Reino Unido do Céu. E vamos construi-la aqui, nesta pequena cidade, onde tudo começou. Você vai ser o responsável por esta construção. Ela será erguida no lugar desta casa e você, meu irmão, é quem vai cuidar disso um dia.

Weber está com o olhar estatelado no vazio, pensando, quando a mulher, com uma cara de horror, balança a bunda com as mãos os quadris.

MãeWeber : - O que você está me querendo dizer ? Todos esses anos você mantém uma sociedade secreta com o pastor e eu não sei de nada?
PaiWeber : - Cala esta boca mulher ! Não vê que está tudo sob controle !
MãeWeber : - Que controle, qual nada, os advogados testamenteiros já foram avisados e estão para chegar na cidade a qualquer hora e aí ó: balalau ! Nem ouro nem vela. Até que ponto estamos envolvidos com o pastor e essa igreja ?
PaiWeber : - Estou sabendo mulher ! Venho pensando em tudo isso há muito, vai dar tudo certo, no devido tempo. Nosso filho já conseguiu dar o primeiro passo - Antonella o recebeu de braços abertos e a verdadeira lua-de-mel será na nossa, ou melhor, na dela ... pouco importa agora, na velha casa que tínhamos na praia.
Mãe Weber : - Alem da casa da praia, Weber, meu querido marido, o que mais ? O que é e o que não é nosso e o que pertence verdadeiramente ao pastor ?
PaiWeber : - Ao pastor, eu creio, nada. Mas à Igreja do Reino Unido do Céu tudo.
MãeWeber : - Tudo ? Até a nossa casa ?
PaiWeber : - Casa, carro, caminhão, até o armazém !
MãeWeber : - Você é um banana ! Um ninguém ! Um pulha ! Ai ! Acho que vou ter um treco de tanto ódio que eu estou de você ! Seu incompetente, empregado de merda de uma igreja que não é a minha e, além de tudo, duro ! E Antonella sabe de tudo ?
PaiWeber: - Não. Ela ainda não sabe de nada, de nada mesmo. O velho pastor era rígido em relação ao dinheiro da igreja. E aí está a nossa chance, mulher ! Podemos e vamos ter todo o dinheiro que eu mereço. No cofre desta casa tem uma fortuna nos esperando e para que eu possa fazer uma visita aos domínios do velho pastor, basta o nosso filho convencê-la a viajar o mais cedo possível para a praia, você está me entendendo mulher ? Ficou muda agora ?

A Mãe abre a janela do armazém e olha para a casa de Antonella

MãeWeber : - Eu acho isso tudo muito perigoso. Não podemos continuar com nossas vidas, que eu gosto tanto, aqui em Relampejo, onde nasci e que conheço todo mundo ? Mas, e se houver um testamento deixando tudo para Antonella ? Nosso filho, que está casado com ela, será dono da metade e assim podemos por aqui mesmo ficar ? E se não pudermos ? Mas, por outro lado, o pastor pode não ter deixado nenhum testamento e tudo passa a pertencer à igreja e nós não teremos nada ? Oh meu Deus, que dúvida atroz !
PaiWeber : - Fica calma, mulher que só vamos saber a respeito disso quando os advogados da igreja chegarem, mas, antes disso, de uma coisa eu sei: o cofre da casa estará vazio.
MãeWeber : - Mas podemos ser presos !
PaiWeber : - Ora mulher ! Só eu, você e nosso filho é que sabemos sobre o cofre, quem é que vai nos entregar a polícia ? E, com este dinheiro na mão, ninguém me pega mais neste país. Prefiro a prisão à miséria ! Também não vamos mais estar aqui nesta merda, não é meu amor ? (O telefone chama).



Casa de Teresa. Interior. Dia.
Teresa coloca o livro que está lendo sobre a mesa, e atende o telefone que está tocando. A ligação não está audível. Ela tem dificuldade de entender.

Escritório de Jorge. Ele está com o telefone no ouvido e em sua volta estão Suzi e Cristina. Entra Alex e senta-se na poltrona. Suzi serve para ele uma dose de uísque.

Jorge : - Alô ! É você meu amor ? Estou tentando lhe ligar já faz algum tempo. Chamava e ninguém atendia ! O que está acontecendo ? Está tudo bem ? Tenho boas novidades para você. Consegui achar e estou fechando o negócio agora para comprar uma belíssima casa de praia onde poderemos passar as nossas férias. Avise as crianças. Não ! É na praia mais badalada deste verão. Você vai adorar, sim, vai ser muito divertido. Não, meu amor, não vou almoçar hoje aí em casa, tenho muitas coisas para fazer e estou sem tempo, lhe telefono mais tarde. Um beijo.
Alex : - A mais bela casa da praia ! Você é um cretino Jorge. Aposto que não contou a ela que a casa era de Cristina. Contou ?


Teresa na sua casa, sentada em sua poltrona, desliga o telefone, dá um trago num cigarro e volta à sua leitura predileta: “O diário de Antonella”.


É de manhã. Antonella está cuidando do jardim em frente a sua casa, quando Adolfo chega com flores na mão e um presente na outra. Os dois se abraçam e entram em casa.

Adolfo Weber : - Antonella meu amor ! Você é a coisa mais linda que Deus pôs na terra ! Tenho ótimas novidades, consegui com minha mãe a casa que temos na praia e vamos viajar hoje mesmo para a nossa tão esperada lua de mel .
Antonella : - Mas Adolfo, não podemos viajar, os advogados do meu pai estão para chegar e está tudo ainda muito confuso na minha cabeça.
Adolfo : - Nada disso, já providenciei tudo, transferi a vinda dos advogados para outra semana, comprei um carrinho só pra esta viagem e tenho dinheiro suficiente para nos divertir a valer. Não vamos perder esta oportunidade, o resto pode esperar. Você não acha ? Antonella, eu e você vamos encher esse mundo de filhos !



É um colégio grande e tradicional onde estudam os filhos de Teresa. Pati está com seu namorado Miguel, no ginásio esportivo, onde ele ensaia com seu conjunto para a apresentação de hoje à noite. É a festa que comemora o último dia de aula e o início das férias de verão. A alegria é geral.
Márcio está com seus amigos. Pati se aproxima de Miguel no palco.

Pati : - Miguel me dá um tempo ?
Miguel : - Claro, Pati ! Já vou descer. Olha aí meus amigos, vamos dar uma parada e voltamos já ao ensaio. O que foi Pati, o que aconteceu ?
Pati : - Nada, porque ?
Miguel : - É que você está mais linda hoje do que estava ontem à noite.
Pati : - Não brinca Miguel ! Você precisa me ajudar. Vou viajar com minha família para uma praia. Venho para me despedir de você, mas estou sem coragem de deixá-lo. Me ajuda, vai !
Miguel : - Todo mundo viaja nas férias, e nós também vamos viajar gatinha! Eu e você !
Pati: - Como ?
Miguel : - É simples e já tenho um plano na minha cabeça. Vamos todos para a mesma praia nestas férias. Vou arrumar um lugar para que possamos tocar e você, como futura empresária do grupo, vai nos acompanhar, não está claro ? ... Precisamos bolar um nome ... que seja comercial ... você poderia nos ajudar ... sem um nome não podemos nos apresentar.
Pati : - Que tal : LSD - The Last Summer Day ?
Miguel : - Você é linda ! Belíssimo nome para uma banda de Rock que vai a para praia. Me dá um beijo. Ao ensaio ! Te vejo mais tarde.

Pati se afasta e vai saindo do ginásio esportivo. Passa desapercebida pelo grupo de rapazes onde está o irmão Márcio.

Primeiro amigo : - Esta sua irmã é muito gostosa.

Márcio perde o controle e segura o amigo pelo colarinho.

Márcio : - Olha aqui, seu filho da puta, nunca mais dirija-se a minha irmã desta maneira porque eu sou capaz de te matar. Vamos ! Temos uma reunião importante hoje à noite.


Casa de Antonella. É noite alta. PaiWeber entra na casa sorrateiramente, furtivamente, desconfiado, olhando assustado de um lado para outro com uma lanterna na mão em busca do cofre escondido.

O velho Jipe de Adolfo e Antonella chega na cidade de praia e é observado e seguido de longe pelo detetive Leite, em sua camioneta.



Jorge e Cristina chegam num motel de luxo que tem uma bela vista para o mar.
Um outro carro chega em seguida no mesmo motel. No seu interior Alex e Susana.


O presidente da “Firma” agoniza no leito e chama insistentemente por sua filha Suzana e sua amante Cristina. Ao seu lado, o médico, um padre e sua enfermeira, com um telefone na mão.


Adolfo e Antonella entram na casa de praia.


Jorge, Cristina, Alex e Suzana ocupam duas suítes conjugadas do motel que tem uma varanda comum. Lá os quatro observam o mar e as luzes distantes da cidade enquanto bebem uma champanhe.

Alex : - Jorge, eu lhe convidei esta noite para comemorarmos e para te dizer o quanto eu fiquei satisfeito com este encontro entre você e minha querida Cristina. O Presidente já me informou de tudo e quero parabenizá-lo pela sua promoção e por sua decisão. Bem que você merece e sei que juntos contribuiremos sobremaneira com este homem que eu considero meu pai.
Jorge : - Alex, não existe nada entre eu e Cristina, apenas uma bela amizade que se inicia. Ando mesmo é preocupado com a saúde do Presidente e acho que ele precisa fazer um tratamento mais rígido, descansar, afinal nós estamos aqui para ajudá-lo.
Alex : - Olha, Jorge, o presidente não aceita a sua aposentadoria e até a última hora ele irá comandar os negócios, mas podemos dar uma ajuda ao homem e foi esse o principal motivo deste nosso encontro. Aqui ao lado está o representante do maior negociante de arma de toda América do Sul e hoje teremos um encontro com ele. Eu quero lhe apresentar o senhor Escobar que abrirá uma rota exclusiva de distribuição entre o Brasil e o mundo e como somos nós que mais sabemos como exportar está fechado o elo de milhões de dólares. Quanto maior é a guerra, maior o nosso lucro. O que você acha ?
Jorge : - Alex, você enlouqueceu ? O Presidente já me informou sobre este negócio, temos poucas informações sobre este senhor Escobar, é tudo muito prematuro e como, nesta situação, você me traz aqui o Sr.Escobar, sem ter me avisado antes ? O Presidente não me falou nada deste encontro, e você
não me precisa apresentá-lo pois já o conheço. Na próxima vez, marque com ele um encontro no escritório central. Eu estou indo embora. Cristina, o Alex já me falou o que tinha de dizer e pretendo ir agora.

O telefone celular de Cristina chama e ela atende. Com o rosto assustado chama por Susana.

Cristina : - Suzana, vamos para casa que o Presidente está passando muito mal e pede nossas presenças.



O dia amanhece em Relampejo.
O armazém do Sr. Weber está fechado. Os funcionários estão na porta
esperando o patrão. O tempo passa e o Sr. Weber não aparece. Os funcionários começam a ficar agitados. Fidor aparece pedalando a sua bicicleta e traz notícias.

Fidor : - Tenho algumas notícias saídas do forno: a primeira é que o sr.Weber e esposa sumiram da cidade. A segunda é que os advogados do pastor Divino estão para chegar mas Antonella, casada com Adolfo, o príncipe de Relampejo, não se encontra em casa e dizem que eles estão tendo uma nova lua-de-mel. Mas o temido detetive Soares diz que o detetive Leite está em diligência atrás dos desaparecidos. Bem, muito mais coisas estranhas estão para acontecer em Relampejo, coisas com que jamais sonharam seus míseros cidadãos. Tenhamos todos o bom dia. ( Sai pedalando a bicicleta ).
Funcionário 1 : - Enquanto os patrões passeiam, o armazém fica fechado ? Ficamos sem salário, talvez sem emprego. E o leite das crianças ? Companheiros ! Camaradas ! Eu proponho, ao se confirmar o desaparecimento do patrão, que os empregados, os trabalhadores unidos, assumam o negócio, assumam a fábrica ! Opa ! Me confundi. Assumam o armazém !

O descontentamento é total. Algumas pessoas passam, outras param e participam dos grupos que discutem posições a serem tomadas. Palpites, opiniões exaltadas e em pouco tempo um grande número de pessoas discute em frente ao armazém. No auge da confusão, chegam dois policiais.

Polícia 1 : - Que confusão é essa ?
Polícia 2 : - O que está acontecendo aqui, minha gente ? Vamos parar logo com isso ! Caminhando ! Circulando ! Ao trabalho pessoal, o dia já começou.
Funcionário 1 : - Trabalhadores ! Companheiros ! A palavra de ordem é : Não vamos arredar o pé . ( todos gritam a palavra de ordem ) Senhores representantes da lei, enquanto o armazém estiver fechado, não haverá trabalho. Estamos aqui faz mais de hora e o armazém continua fechado e gostaria de saber, dos senhores, como vamos trabalhar ? Trabalhadores, vamos invadir o armazém e tomar conta do negócio ! Só assim podemos trabalhar !
Polícia 1 : - Olha aqui, companheiro, se o senhor não ficar calado e parar com essa agitação, lhe prendo e lhe arrebento, tá me entendendo ? E os outros aí, tratem de andar, só vão ficar aqui na porta os funcionários da casa, o resto caminhando !
Funcionário 1 : - O companheiro da polícia está certo e vamos todos para casa, sim. Assim que ele nos informar para onde e porque fugiram os felizes proprietários deste negócio.
Polícia 2 : - Fugiram ? Para onde ? E quem é você ? Veio de onde ?
Polícia 1 : - Ora, o senhor vai preso e lá no xilindró vai me contar direitinho quem é você e para onde fugiu o casal.



Rio de Janeiro. Casa do Presidente.


O caixão com o corpo do presidente é carregado por alguns até o carro funerário. As pessoas falam a respeito do morto. Todos estão na sala para acompanhar o féretro. Jorge está ao telefone.

Jorge : - Alô, é você Márcio ? Fale para sua mãe que estou esperando por ela no cemitério para o enterro do Presidente, e que ela não pode deixar de comparecer.

Uma grande fila de carros podia ser vista, acompanhando o cortejo fúnebre.


Na delegacia de Relampejo os dois policiais entram com o funcionário 1 preso e o colocam numa cela. Ele tem um esparadrapo na boca que o impede de falar.

Polícia 1 : - Acho muito estranhos estes acontecimentos, todos no mesmo dia, e este agitador, que ninguém conhece, aparece assim na cidade, criando confusão. Você não acha ?
Polícia 2 : - Acho sim, aí tem coisa podre, mas nós vamos descobrir! Policial 1 : - Elementar meu caro Walter !


No cemitério o enterro termina e as pessoas se cumprimentam e se falam. Teresa chega já no final e vai dar um abraço em Suzi. Jorge vê Teresa e se aproxima de Alex. Cristina fica ao lado de Suzi e cumprimenta Teresa. Alex se aproxima de Jorge e lhe faz uma confidência.

Alex : - Jorge, ontem você me fugiu, mas hoje, depois do enterro, à tarde, quero uma reunião com você no escritório da Firma. Não aceito desculpas. Leve a Cristina com você.

Todos saem para o seu carro e Teresa entra no seu conversível. Quando Jorge se aproxima, ela arranca o carro sem dar a ele chance de falar alguma coisa, mas como a rua está cheia de carro e pessoas e ela não pode se movimentar, Jorge a alcança e entra no carro.

Jorge : - O que foi Teresa ? Porque você está assim ? Eu te fiz alguma coisa para me tratar desta maneira ? Agora não vai ficar calada e me deixar fazer este papel ridículo, de otário. Não vai me dizer nada, vai permanecer cega, surda e muda . . Então, até mais tarde.

Jorge sai do carro batendo a porta com força. Os carros passam a se movimentar. Teresa chora e o vento espalha as suas lágrimas.



Antonella passeia na praia deserta em frente a sua casa. Antonella também chora. Dentro da casa e observando Antonella está Adolfo falando ao telefone.

Adolfo : - Não pai, fique tranqüilo que tudo vai dar certo. Não vou fazer nada que nos possa comprometer. Sim é isso. Me encontro com vocês lá. Reserve os apartamentos com os nomes falsos, como tínhamos combinado. Não vou fazer nada, já disse, só um susto, não se preocupe. Você mais do que ninguém sabe o quanto custa uma desonra a nossa família.

Adolfo desliga o telefone e liga um outro número.

Adolfo : - Alô ! é você ? Fala mais alto que não estou ouvindo nada. Cheguei aqui ontem e ainda não tive tempo nem oportunidade, mas não passa de hoje à noite. Noite de lua cheia. Em seguida eu me encontro com você. Vamos a segunda parte do plano: - Já comprou as passagens ? Fez as reservas ? Ok. Eu disse Ok sua analfabeta ! Me desculpe, e o médico contactou ? É o melhor ? Você tem certeza ? É ! ... estou um pouco nervoso, mas tudo vai dar certo. Até amanhã.

Na cidade de Relampejo, Fidor passa correndo com sua bicicleta e quase atropela os dois policiais que apitam e tentam correr atrás, mas logo desistem. Fidor encontra com Maria e os dois, na bicicleta, passeiam pelos outeiros e fazem amor na relva.

Antonella entra em casa e é quase violentada por Adolfo que, de repente, cai em si como se tivesse lembrado de algo e se afasta. Antonella senta-se na porta de casa e passa a tarde olhando para o mar.

O detetive Leite passeia disfarçado pela praia em frente à casa de Antonella.



Numa rua movimentada da cidade, Cristina estaciona o carro e entra num restaurante. Jorge está sendo servido de uma dose de uísque pelo garçom quando Cristina se aproxima.

Jorge : - Oi, Cristina, foi bom você ter vindo. O que você quer beber ?
Cristina : - Uísque duplo. Jorge, você não pode deixar o comando solto nas mãos de Alex que ele não tem nenhum escrúpulo em tomar as decisões mais importantes sem te consultar. É uma pessoa perigosa e você tem de ter calma e persistência. Mas deve assumir de imediato o comando e isso não pode passar de hoje, se não, vira tudo de cabeça para baixo
Jorge : - Calma Cristina ! Tenho tudo sob controle. Me adiantei e estou preparando um xeque-mate para o Alex. Tome o seu uísque. Muito bem: eis que surge o bispo acompanhado pelo peão. Estamos começando o cerco ao rei. Façam o jogo senhores...

Entra no restaurante um senhor alto, magro, muito bem vestido, acompanhado de um anão que fica de vigia na porta. O garçom o encaminha para mesa onde está Jorge sentado. Jorge levanta-se e apresenta o senhor a Cristina.

Jorge : - Cristina este é o senhor Ortega. Vocês já se conhecem ? Sr. Ortega esta é Cristina. Estamos apresentados e vamos agora aos negócios. Para clarear os mal entendido e as precipitações. Garçom ! O que o senhor bebe sr.Ortega ? ( Silêncio ) Um outro uísque para o sr. Ortega. Cristina, o sr. Ortega me convidou para um encontro sozinho aqui neste bar e pensei que corria algum risco e resolvi convidá-la para a festa... Ah ! finalmente o rei. O tabuleiro está quase completo, não ? Eis que surge a rainha e forma-se então o palco para o ato final. Mais duas ou três mexidas e eis o mate. Alex ! Suzi ! Que coincidência, vamos ter uma festa. Vamos comemorar
algo, ou é pura coincidência ? Vamos sentar. Garçom ! Uma garrafa de champanhe ! Naturalmente todos se conhecem e sabem na certa porque estão aqui. Agora eu gostaria de saber o que anda acontecendo e qual de nós em pouco tempo deve desaparecer, descansar, para dar lugar a outro e assim sucessivamente até nos eliminarmos a todos. É esta a lógica que move os nossos ímpetos de ganância e poder ? Teremos aqui, Alex, a nossa reunião, tão desejada por você, porque acho o lugar mais aprazível e é onde posso respirar e te ouvir melhor. Bem ... todos apresentados ? Quero agora oferecer um drinque a todos vocês e propor, ou melhor, lembrar de duas coisas que foram desejos do Presidente. O primeiro é o casamento de Alex e Suzana, ao qual levanto a minha taça e bebo o vinho borbulhante dos deuses em louvor a Baco, e o segundo, como reza a tradição do meu povo - quebro a minha taça - ao exigir que eu seja nomeado presidente da Empresa em caráter irrevogável, pois como ele disse, entregando-me este documento, que eu deveria usá-lo se precisasse, e como se faz necessário, passo a usá-lo. Diz ele aqui no fim ... “ pois só você Jorge tem o senso prático, instrução, condição e inteligência para administrá-la.” Esta carta, uma cópia, a original está muito bem guardada, me dá legalmente estes poderes. Mas para evitar atritos, tão desnecessários à nossa saúde, é que peço à nossa família que permaneça unida. Assim quis o presidente e assim queremos nós.

Dizendo isso, levanta-se acompanhado de imediato por Cristina e oferece um brinde. Aos poucos todos na mesa levantam-se. Alex permanece sentado e sendo o último a se levantar, oferece um brinde a Jorge, bebe a champanhe e quebra a taça.
Todos sentam rindo, se cumprimentam enquanto uma cantora inicia o seu repertório musical. Jorge pede licença e vai até o telefone. Cristina o observa de longe.

Teresa está deitada no seu quarto, quando o telefone toca. Ela demora a atender.

Teresa : - Alô. Sim, Jorge. Não ! Já passou. Eu ando muito depressiva e não vejo outra solução se não tirar umas férias. Estou querendo viajar amanhã para esta casa que você arrumou, ou mesmo para um hotel. Jorge, não adianta, eu vou amanhã para a praia e, se você quiser, venha comigo. Boa noite. (desliga o telefone).



É noite e Antonella permanece na varanda da casa, olhando o mar. Adolfo sai e senta-se do lado dela.

Adolfo : - Me desculpe, eu às vezes perco o controle e não sei me comportar com uma mulher delicada como você. Vamos dar um passeio, refrescar a cabeça e você vai ver como tudo vai ficar bom novamente.

Antonella sem dizer uma palavra acompanha Adolfo em direção à praia, iluminada por uma bela lua cheia.

Os dois policiais caminham pelas ruas desertas da pequena cidade de Relampejo conversando, quando encontram com o detetive Soares.

Policial 1 : - É tudo muito estranho, meu caro Walter. A família Weber desaparece por completo da cidade. O filho viaja com Antonella e desaparecem como um conto de fada. Amanhã chegam os advogados de uma família que não existe mais.
Policial 2 : - Elementar Sherlok, onde tem dinheiro o mistério é mais profundo. Vamos dar tempo ao tempo, porque só ele, como disse um ladrão contumaz, é o senhor da razão.
Det.Soares : - Boa noite. Os senhores, por favor, não deixem um minuto sequer esta casa sem a suas presenças. Quero que a vigiem até o amanhecer, quando eu retorno e lembrem-se de que temos que esperar os doutores advogados amanhã, na estação de trem.


O detetive Leite está vigiando Antonella que passeia com Adolfo por umas barrancas, de onde se vê o mar do alto. O lugar, apesar de belíssimo, é perigoso e o detetive Leite fica apreensivo, apressa o passo em direção ao casal.
Adolfo acaricia e beija Antonella que não esboça nenhuma reação. Ele se afasta e neste momento, quando ela está olhando para a lua, ele, numa atitude suspeita, corre em sua direção na intenção de empurrá-la morro abaixo, mas Antonella vira-se de repente e, sem querer, desvia-se de Adolfo, que perde o equilíbrio caindo no precipício. O detetive Leite chega a tempo de segurar Antonella.

O dia já amanheceu e o sol ilumina a estação. O trem se aproxima, apitando na serra, cortando a mata atlântica. Na pequena estação de Relampejo estão os dois policiais, o detetive Soares e o sinaleiro. O trem chega. Do vagão de passageiro descem dois senhores muito bem vestidos. Os dois policiais se aproximam, o detetive pega as malas, passando-as em seguida para os dois policiais. Todos caminham em fila indiana pela cidade até a delegacia.
Na delegacia já estão Antonella e o detetive Leite. Chega o detetive Soares que vendo o detetive entrevistando Antonella, fica furioso.

Det. Soares : - O que os dois estão fazendo aqui ? Eu não disse que vocês não deixassem a casa do pastor quando chegassem ? E com que direito o senhor prende a senhorita Antonella ? ( Para Antonella ) Queira desculpá-lo, ele não sabe o que faz. Vamos indo que os advogados chegaram e precisamos conversar com a senhorita.
Policial 2 : - Senhor detetive Soares, onde o senhor pensa que está ? Aqui é a delegacia de polícia de Relampejo e exigimos respeito. A senhora Antonella vai ficar aqui. Só presto ordens ao delegado que infelizmente está viajando. Na falta dele, afora o prefeito que é um bêbado maluco, ao juiz que está de férias, eu sou a maior autoridade aqui no município. E não venha me dando ordens, pois aqui quem manda sou eu.
Det. Soares : - Ora, não enche o saco, não amole e faça logo o que estou mandando se não a coisa engrossa para o seu lado. Trago ordens expressas do secretário de segurança do estado.

O Policial 1 tira o esparadrapo da boca do funcionário preso que dispara a falar.

Funcionário : - Um momento, senhores. Um minuto de suas atenções.
Estou curiosamente acompanhando este caso. Tenho muitas informações e algumas especulações que gostaria de colocar aos senhores. Mas, antes, peço que me retirem desta gaiola. Eu não sou destes passarinhos que cantam preso.

O detetive Soares vira-se nervoso e com o rosto transformado numa fera caminha em direção do preso.

Det. Soares : - Quem lhe deu o direito de falar, seu marginal filho da puta ? Vou te dar um corretivo, um tratamento para a cabeça que você nunca mais vai esquecer de cantar. Alias só vai saber cantar e esquecer o resto.

Antonella, assustada com a cena de violência, se aproxima do detetive e, segurando sua mão, faz com que ele se acalme.

Antonella : - Detetive Soares, tenha piedade, chega de violência por hoje, pare imediatamente e solte este rapaz. Ele sabe de alguma coisa que pode me ajudar a explicar o atentado que acabei de sofrer ontem à noite.
Det. Soares : - Atentado ?
Det. Leite : - Sim ! Atentado. Ela quase foi morta, assassinada, pelo seu marido Adolfo, o filho do Sr.Weber. Um ato de sorte, ou a mão de Deus, fez com que ela esteja aqui são e salva.
Funcionário : - Aí é que está a chave do enigma, pois o senhor Weber, dono do armazém, também sumiu. Se os senhores policiais deixarem todos desaparecerem desta cidade em bem pouco tempo não restará nenhuma alma santa para contar a história.

Os advogados, que ouvem atento o pronunciamento do rapaz, ficam apavorados e pedem para que os levem com urgência até a casa do pastor.

Teresa prepara as malas no carro para viajar. Pati está com ela. Jorge chega com seu carro e fala com Teresa. Os dois entram em casa. Pati senta-se no conversível. Assim que seus pais entram, surge apressado, perto do carro, Miguel, seu namorado.

Miguel : - Meu amor, está tudo pronto, ficamos esperando só o seu telefonema para irmos ao seu encontro. Não se preocupe, tudo vai dar certo.

Os dois se beijam e Miguel passa a mão nos seios de Pati.
Da janela, Teresa vê a cena do namoro enquanto Jorge faz as malas.
Jorge chega com as malas prontas. Teresa pega em sua mão e os dois sentam-se no sofá.

Jorge : - O que foi, Teresa ? Que houve ! ?
Teresa : - Jorge, meu amor, pensei bem e acho melhor você ficar aqui para esperar o Márcio e depois ir com mais tranqüilidade ao nosso encontro. Vou na frente com Pati e espero por vocês dois numa casa mais limpa, mais arrumada. Qualquer dúvida, você me telefona. Não me deixe sozinha por muito tempo e não se preocupe que estaremos bem.
Jorge : - Se você prefere assim, tudo bem.

Jorge dá um beijo em Teresa e os dois saem de casa. Teresa entra no carro, e depois da despedida, arranca com velocidade, deixando Jorge na calçada acenando um adeus.


Os dois advogados estão na casa de Antonella e mexem em tudo. O cofre está vazio.

Advogado 1 : - Senhores: O cofre está vazio. Fomos roubados.
Advogado 2 : - Senhores policiais, voltem à delegacia e me tragam a senhorita Antonella.

Os dois policiais saem para a rua em direção à delegacia.

Policial 1 : - É uma estória muita estranha. Vieram de longe para procurar um cofre vazio ?
Policial 2 : - Vazio está agora, Sherlock, devia haver coisas de muito valor ali dentro. Alguém levou. Vamos esperar eles darem queixa e iniciamos a nossa investigação.
Policial 1 : - Elementar, meu caro Walter.

Na delegacia, Antonella explica o acontecido para os dois detetives.

Antonella : - Eu não podia ter abandonado as coisas de meu pai. Foi tudo um grande equívoco. Fui apressada. Eu não sabia o que Adolfo estava tramando. Às vezes eu achava que ele tinha uma expressão, um sentimento não muito sadio, eu o sentia meio falso. Mas não podia acreditar que aquele cara, bonito e alegre, que eu conhecia desde criança, que nossos pais eram amigos, apaixonado por mim, quisesse me matar. Eu brincava com o perigo e não sabia. Eu não merecia o seu amor. Quando lá no alto eu me virei para falar com ele, vi que sua cara se transformava entre o amigo e o insano. Ele devia estar louco. Não acredito que isso tudo possa estar acontecendo em tão pouco tempo.
Det. Soares : - Mas sabendo disso tudo, o que a senhora foi fazer com ele no penhasco ?
Antonella : - Eu estava casada e em lua-de-mel. A verdade é que eu nunca tinha visto o Adolfo desta maneira. Parecia um demônio atormentado. Ele era forte como um touro, um camponês destemido, fora do seu tempo. Tinha a cabeça de um guerreiro medieval. Eu não podia esperar nada dele a não ser esta cena de trágica beleza. Agora eu sei. Ele, desesperado em seu amor, e não conseguindo esquecer do meu amor por Fidor e contra minha liberdade, prepara um plano diabólico de morte. Mas sabendo que não conseguiria viver a minha ausência, resolve se atirar também no abismo para morrermos juntos no mar. Oh ! trágico destino.
Det. Soares : - Tá bom ! Muito bonito, mas não me convence. Agora, vamos aos fatos - você viu ele caindo ?
Antonella : - Ele caiu, eu vi o seu corpo solto no ar, num longo mergulho para morte.

Neste momento chegam na delegacia os dois policiais, em tempo de ouvir o detetive Soares dando uma ordem ao detetive Leite.

Det. Soares : - Vá até a casa da praia e me traga algumas evidências do ocorrido, e se foi encontrado o corpo do rapaz, me telefone que eu vou até lá. Agora vai ! E os senhores que novidades me trazem ?



O carro de Jorge corta as ruas da cidade.

O conversível de Teresa desce a serra envolvido por uma suave neblina, iluminada pelo sol que aparece e se esconde num jogo de cena com a mata atlântica. Pati está que é só sorrisos.

O carro de Jorge chega na casa onde está estacionado o carro de Cristina.
Ele já sai com o telefone celular no ouvido.

Jorge : - Não ! Márcio já estou a caminho e te pego daqui a pouco. Tenho um último compromisso . Está bem, eu telefono antes.

Jorge entra na casa. Cristina de camisa transparente recebe Jorge com uma garrafa de champanhe na mão.

Cristina : - Jorge, meu querido, você é um gênio ! Como eu fiquei feliz em vê-lo acabando com as pretensões de Alex. O Presidente tinha razão, a Firma não anda sem você. Você foi muito experto em ter me chamado. O Sr. Ortega é um homem de palavra e era o braço direito do Presidente { você já o conhecia, sim, mais não sabia quem ele era ) O Alex ficou com uma cara, quando nos viu sentados na mesa com o Sr. Ortega ! Me deu até pena dele.
Jorge : - Como ele pensou que eu trairia o Presidente por um bocado de moedas ? Ou ele é um gênio ou uma besta ! O Presidente me ofereceu o poder e como Macbeth devo trai-lo ? E a Suzana, o que te disse depois ?
Cristina : - A Suzi é muito discreta e ama o Alex. Você sabe disso. Mas não sabia do plano do Presidente de te por à prova e comprovar para ele e para o senhor Ortega que você era confiável. O Presidente morreu, mas o Alex queria transformar a averiguação numa cilada de morte e isso Suzana, por minha causa, não concordaria.

Cristina, com uma garrafa de champanhe na mão, vai aos poucos derramando o líquido sobre o seu corpo, num exercício de sedução. Jorge, depois da fala de Cristina fica parado, estático. Cristina levanta do sofá e aproxima-se de Jorge seduzindo-o.

Jorge : - Quer dizer que já tinha sido organizado um complô contra mim, mesmo antes da morte do Presidente ? Eu, depois de anos dedicados à Firma, tinha de passar por um teste ... é demais, você não acha ? Agora é Otelo que surge na farsa shakespeareana ?
Cristina : - Era necessário para você assumir a diretoria, Jorge. Mas o Presidente lhe deu mais, lhe deu a Presidência, lhe deu a mim, o que você quer mais ?
Jorge : -Quero a mim mesmo ! Porque não fizeram um teste na louca de sua filha , um outro no débil mental do Alex e, finalmente, um especial na amante ... Queira me desculpar, Cristina, eu não queria dizer isso. Vim aqui só para me despedir. Tenho que passar uns dias na praia com Teresa e meus filhos. Aproveitei e marquei um encontro com os representante do Bispo aqui no Brasil. Temos que exportar aqueles dólares ! Eu te telefono de lá. Até logo.

Jorge sai e fecha a porta.



O detetive Leite com um soldado do vilarejo examina o local de onde caiu Adolfo e pergunta sobre o corpo - o soldado balança a cabeça negativamente.

Na casa de Antonella, além dela, estão os dois advogados, o detetive Soares e o policial2. A empregada serve um café. Todos bebem e um dos advogados vai acender um charuto.

Advogado1 : - Você não vai acender essa coisa, aqui e agora, vai ? Não acredito ! Bem, Antonella como você estava dizendo...
Antonella : - Eu estava dizendo aos senhores que mesmo não achando o corpo de meu marido Adolfo, eu tenho certeza que ele morreu. Eu o vi caindo no mar, que somente hoje tomo conhecimento do testamento do meu pai e que desconhecia a existência deste cofre aqui, muito menos sabia que havia ouro ou algum dinheiro ali escondido.
Advogado2 (de charuto apagado na mão) : - Escondido não, minha filha, guardado em nome de Deus.

Neste momento, adentra a casa, trazido pela empregada, o policial1 que se aproxima do policial2 e fala no seu ouvido alguma confidência.

Advogado1 : - Foi muito bom o senhor policial chegar, pois gostaríamos de saber notícias do filho do Sr. Weber. Como ele se chama ?
Advogado2 : - Adolfo !
Advogado1 : - Sim ! Adolfo, um nome bastante sugestivo, os senhores não acham ? Mas não precisam responder, pela sua expressão não acharam nada, nem o corpo e nem a alma, presumo ! Não importa, sem o corpo não há delito, não há provas, não houve crime, quando acharem o corpo, se acharem, o que eu não acredito, vocês terão algum serviço. Portanto, seria possível nos deixar a sós com a nossa cliente, a senhora, a viúva Antonella ?

Os dois policiais saem, sem esperar a empregada. Mesmo assim, ela, apressada, os acompanha até a porta. Os dois detetives também recebem o recado e saem da sala.

Advogado1 : -A senhora então diz que não conhecia a existência do cofre, bom ! quem então, além do Pastor, freqüentava esta casa e tinha intimidade com seu pai ? Algum amigo, um parente, que poderia saber ? ... Ele tinha nos informado que havia guardado no cofre uma grande importância que seria destinada à Igreja e de nunca ter revelado esse guardado a ninguém. Bem, você não quer me contar e eu não vou insistir. A verdade sempre aparece, e eu tenho paciência. Bem, quanto ao testamento do seu pai, a sua fortuna, por enquanto, está restrita a uma mesada e a todos os seus gastos pessoais que serão pagos pela Igreja...
Antonella : - Calma, lá ! Eu já disse que não sabia da existência do cofre e não pretendo sofrer retaliação pelo que eu não fiz. Tenho uma proposta para fazer a Igreja, ou aos senhores - Coloco todo o patrimônio que meu pai me deixou à venda, e os senhores é que farão o preço. Pensem nisso e me dêem uma resposta mais tarde. Agora eu pediria que me deixassem um pouco só, pois meus últimos dias foram estafantes.



Teresa sai da casa que fica numa pequena enseada, cercada por um mar azul, uma mata verde e uma paz cortada apenas pelo murmurar do movimento suave das ondas e o pio estridente da gaivota. Ela desce as escadas que leva à praia de areias brancas.

Jorge dirige o seu carro pela pequena cidade encravada entre a serra e o mar, e costeando-a busca um caminho que o levará à casa onde estão sua mulher e sua filha. Ao seu lado, seu filho Márcio.

Jorge : - Meu filho, eu sempre lhe disse que nem sempre a gente faz o que a gente quer e não vai ser hoje que eu vou lhe ensinar o caminho das pedras. A vida é sua e cada um tem o seu própio e único caminho, eu só posso lhe aconselhar: Você já é um homem e porque não pode decidir por sua vida, por sua carreira ? Eu estarei sempre ao seu lado e seja o que Deus quiser !
Márcio : Pai, eu só posso ficar aqui alguns dias, a nossa turma vai visitar a academia militar e para lá é que eu vou após as férias. Pai, fomos convidados, não posso faltar.
Jorge : - Então, hoje à noite faremos um brinde à gloriosa força verde e amarela e ao seu novo lar: A caserna.


Na delegacia estão os dois policiais e o Funcionário com a boca tampada por um esparadrapo.

Policial2 : - Leve a comida para este sujeito e peça a ele para não falar nada que eu retiro o esparadrapo.
Policial1 ( retirando o esparadrapo ) : - Fique calado que você pode comer sem que ele te importune.
Policial2 (nervoso) : - O cofre estava vazio, o ouro havia sumido, tudo foi roubado, afinal deveria ser alguns quilos de ouro pelo tamanho do cofre. Quem foi ? Aí está o mistério. Os advogados do Pastor partiram e nada resolveram. O que deixaram eles para Antonella ?
Policial1 : - O que estava no testamento, elementar meu caro Walter.
Policial2 : - Você leu o testamento ?
Policial1 : - Eu não !
Policial2 : - Bem, se você não leu, e nem eu, posso imaginar que o tal ouro foi levado por Antonella...
Funcionário : - Que tal pensar no sr. Weber ? Ninguém fala mais nele ?
Policial1 : - Eu te falei para ficar calado.
Policial2 : - Coloque o esparadrapo na boca deste palhaço.
Funcionário: - E por quê, se houve um roubo de tal soma de dinheiro, não se oficializou nenhuma queixa ?
Policial2 : - Isto é que eu quero saber... oh ! Já não te disse para calar esta matraca..
Funcionário : - Se os advogados não deram queixa do roubo não há porque investigar nada. O que vocês vão fazer ?
Policial2 : - Vamos esperar os acontecimentos e quem sabe o criminoso volta ao local do crime. Coloque o esparadrapo novamente na boca deste verme, Sherlock !
Policial1 : - Elementar meu caro Walter.

Caminhando num recanto paradisíaco, bem perto da casa da praia, está o marinheiro. Teresa sai da praia, sobe as escadas lentamente e se assusta quando olha para o alto e vê passando aquele personagem de livro que tanto lhe encantou. No ímpeto de encontrá-lo, de não perdê-lo, de saciar a sua curiosidade, sobe as escadas correndo e quando chega cansada, fica cara a cara com ele. Teresa fica inteiramente sem graça. Trajava um biquíni
bem sexy, o seu corpo permitia. Um minuto de silêncio. Para descontrair, enrola o seu corpo numa canga e sem dizer uma palavra segue o seu caminho. Neste exato momento, chega Jorge e seu filho Márcio, no carro com o pneu furado. Jorge olha para o marinheiro e desce do carro. Márcio prepara-se para arrumar o carro.

Teresa : - Jorge ! Márcio, que bom que vocês chegaram. Já estava morrendo de saudade.

O marinheiro se aproxima e cumprimenta Jorge.

O marinheiro : - Sr. Jorge Borman ? ... muito prazer. Me chamo Henry Dumont e sou o representante internacional da King’s Boat...
Jorge : - Ah, muito prazer ! O senhor veio mais rápido que o vento. Eu o esperava só amanhã.
O marinheiro : - Sim, vim de vento em popa. É que quando falei com o senhor, já estava aqui há alguns dias.
Jorge : - Muito bem. Onde o senhor se hospeda ?
O marinheiro : - Estou ancorado na marina. Eu me hospedo com o mar.

Teresa se aproxima da conversa.

Jorge : - Esta é minha esposa Teresa. Este é o senhor ...
O marinheiro : - Henry Dumont, encantado.
Teresa : - O senhor não quer entrar um pouco, tomar uma bebida, um refresco ?
O marinheiro : - Não, muito obrigado, só estava passando, admirando a paisagem e o bom gosto do local. Fica para outra hora, mas, mesmo assim, obrigado Senhor Jorge ! Senhora, um bom dia a todos.

Jorge abraça Teresa e os dois entram em casa.

Num grande hotel, que fica na região das praias mais badaladas do país, o Sr. e Sra. Weber se divertem na piscina.

Pai Weber : - Estou preocupado. O Adolfo não apareceu mais, só me pediu pelo telefone o número de nosso apartamento e não deu mais notícia.
Mãe Weber : - E você entregou toda a mercadoria pra ele.
Pai Weber : - É claro, mulher, que não. Mas ele é que tem os contatos, ele é quem faz os negócios com o ouro. Escondi uma boa parte em caso de encrenca. Mas, quem nos mandou esse dinheiro todo até agora ? Só pode ter sido ele, você não acha, afinal ele é o nosso filho, ou nem nele você confia, mulher ?


Alex, um pouco alcoolizado, está no escritório da Presidência da Firma. Sentado na grande mesa, que foi do Presidente, ele coloca o pé num monte de papel que está em sua frente e lentamente o empurra até todos caírem no chão, num sinal de profunda mágoa por aquele não ser mais o seu lugar. Neste momento, entra no gabinete Suzana, vestindo uma saia colante e uma blusa totalmente transparente.

Suzana : - O que houve, Alex ? Me telefonaram que você estava aqui e eu vim para pegá-lo.
Alex : - Suzana ! o que você veio fazer aqui ? (Toma um gole de uma pequena garrafa de uísque).

Suzana se aproxima dele, pega em sua mão com carinho tentando levantá-lo e ele, num grande esforço, agarra-se nela e os dois desequilibram-se, caindo no chão. A secretária, ouvindo o barulho, abre a porta do gabinete assustada . Alex fica nervoso.

Alex : - Fecha esta porta sua vaca, não vê que estou trabalhando ?
Suzana : - O que é isso, Alex. Você enlouqueceu ? Vamos, levanta !
Alex : - Não, meu amor. Aqui está bom, venha deitar aqui do meu lado. Você está muito gostosa com essa blusa transparente. Vamos tire esse véu e me mostre tudo...

Alex vira de lado e dorme. Suzana vê em cima da mesa um papel cheio de um pó branco.



O sol se põe atrás das montanhas que invadem o mar na baia da pequena cidade. As primeiras luzes das cidades que formam a ”costa verde“ são acesas. Um pequeno bar, situado no alto de um morro de onde se avista todo este espetáculo da natureza, acende o seu néon: BARDOETERNO
Parada na porta do bar, está Pati. Do outro lado da rua, vem chegando, carregando seus instrumentos, num porta-bagagem repleto, de um jipe com reboque, a banda de Miguel, o qual desce do carro correndo ao encontro de Pati. Os dois se abraçam e se beijam. Um clima de festa e de alegria.

Jorge está sentado com Teresa na varanda que dá para a mesma baía, é quase a mesma paisagem de onde está Pati. Márcio sai com uma vara de pescar e desce as escadas que vão dar no mar. Teresa está com o livro de Antonella na mão.

Jorge : - Que livro é este, Teresa, que você não larga de maneira nenhuma ? Estou até ficando com ciúmes. (dá um sorriso)
Teresa : - Jorge, não foi você que deixou este livro la em casa ? Olhe que eu já perguntei a Deus e a todo o mundo e ninguém sabe ou nunca ouviu falar nesta Antonella. Jorge, ando tão cansada e, às vezes creio que estou ficando maluca, tal a quantidade de coisas que eu penso ao mesmo tempo. Este livro, tão interessante, tão estranhamente vivo, é que tem feito o meu tempo passar. As coisas aparecem na minha vida assim, misteriosamente, e eu nunca sei nada sobre elas. Apenas vivo. O que você acha disso ?
Jorge : - Quem sabe é um livro mágico, um oráculo, um presente dos deuses para você, quem sabe ?
Teresa : - Você sempre está brincando, não é Jorge ? Sempre feliz e despreocupado com o que anda acontecendo a sua volta. Agora, então, que é o todo poderoso da Firma, não tem mais tempo e nem paciência para os problemas menores da sua família.
Jorge : - Não é verdade, Teresa. Eu posso estar feliz. Tenho você. Meus filhos. A maior posição na Firma. Uma bela casa na praia. E, quem sabe, um belíssimo iate ancorado na marina. Você tem tudo meu amor ! O que mais preciso te dar para te fazer feliz ?
Teresa : - Eu sei que tenho tudo que quero mas não amo tudo que tenho !
Jorge : - De que traseira de caminhão você tirou essa ?
Teresa (dá um sorriso) : - Jorge, eu gostaria que aproveitássemos estes dias juntos para colocarmos nossa vida em ordem, voltarmos, quem sabe, aos velhos tempos. Tínhamos tantos sonhos que não se realizaram. Viagens, muitos filhos, trabalharmos juntos, construirmos juntos a nossa vida. Eu tinha tamanha vontade de viver. Tudo era lindo e azul ! Mesmo sendo uma época em que a morte, as ignominias e a tortura oficializada rondavam a nossa porta, com o governo nos massacrando, vivíamos mais felizes. Não lhe parece um paradoxo ?
Jorge : - Teresa, o sol lhe bateu forte na cabeça e você está delirando. Como voltar o que já foi ? Ora, menina, continuo te amando, e creio que cada vez mais ainda. Naquela época não tínhamos dinheiro, estávamos sendo perseguidos, nossos amigos desaparecidos. Eu hoje agradeço a Deus você ter se encontrado com a Suzana naquela tarde. Foi nossa salvação e devemos muito a ela e ao seu pai o que hoje temos. A Firma mudou as nossas vidas.
Teresa : - A Suzi mudou as nossas vidas ? Que bom ! Achei que fosse o nosso casamento. Você e eu, mais ninguém, mas não importa, deve ter sido o sol na minha cabeça.


O BARDOETERNO está cheio de pessoas bonitas. A lua brilha sobre o mar. Pati está aflita ao lado de Miguel com sua guitarra na mão. Um spot ilumina um microfone num pequeno palco improvisado.

O apresentador : - Bardo, o poeta heróico do eterno canto dos Lusíadas, apresenta esta noite, vindo diretamente de New York para o nosso palco, a banda brasileira que explode na matriz - New York - Paris - Rio - Meninas, fiquem calma ! E agora, com você, os garotos do “The Last Summer Day”.

Miguel sobe no palco já fazendo um solo de guitarra e a banda o acompanha colocando a moçada toda para dançar. Uma loucura. Um sucesso. A música rola solta na primeira noite quente deste verão. Uma menina sobe no palco, começa a dançar e dá um beijo em Miguel. Pati não gosta e se afasta do palco indo para a porta do bar. Ao chegar na rua, vê o carro do seu pai e vai ao seu encontro, quando nota que ele está falando no telefone celular. Com mais curiosidade se aproxima, sem ele notar, um pouco mais, para ouvir a conversa.

Jorge : - Não ! Eu te disse que não poderia voltar antes da sexta feira.
Ainda estou chateado com toda esta estória. O que eu posso fazer ? Não ! não vou falar nada com ela. Porque falaria ? Eu amo a minha família e você sabe disso. Ora, Cristina, você sempre soube que eu era casado, que ataque de ciúmes é esse agora ?...

Pati volta correndo para o bar. A música está acabando e ela fica chorando no canto do palco. Miguel continua a sua apresentação, agora com uma música bem lenta, romântica, que ele dedica a sua musa inspiradora, sua namorada Pati.


Jorge chega em casa com o carro. Teresa está na varanda. Jorge desce do carro com duas garrafas de champanhe, abraça Teresa e os dois entram em casa. As luzes, todas acesas, vão se apagando uma a uma até ficar só uma acesa. No quarto do casal, Jorge e Teresa fazem amor. O telefone celular de Jorge toca várias vezes. Ele não atende.

Num restaurante de luxo, Alex janta com Suzana. Os dois estão em silêncio e Alex, com um telefone celular na mão, está nervoso. Joga o telefone na parede, quebrando um espelho e causando uma grande confusão.

Alex : - Estou tentando falar com este sujeito há horas e ele não atende o telefone. Levanta Suzana, vamos fazer uma visita ao casal. Jorge vai ter uma surpresa.
Suzana : - Não ! Alex. Senta aí, fique quieto ! Já não chega o escândalo ? Vamos pedir a conta que eu quero pagar todos os estragos que você fez.
Alex : - Pode deixar ! Eu pago.


No BARDOETERNO o concerto está no fim e os músicos agradecem os aplausos. Miguel encosta a guitarra e vai ao encontro de Pati.

Miguel : - Você está especialmente linda hoje, minha flor. Gostou do som ? você já viu a lua ? Está uma noite sem igual ! Quantos beijos você quer ganhar ?
Pati : - Eu vi a lua e ouvi o seu som. Gosto de tudo que você faz, só não gostei do beijo daquela menina que subiu no palco.
Miguel : - Minha gatinha você está com ciúmes, não vá me arranhar ! Eu não fui ainda vacinado contra a raiva. Venha cá, deixe disso, o que está verdadeiramente te aborrecendo ?
Pati : - As coisas lá em casa não vão nada bem. Meu pai é um sacana e engana a minha mãe com outra e eu não sei se digo ou não digo isso a ela. Oh Miguel, eu não sei o que fazer.
Miguel : - É grilo seu. Tá tudo bem, eles se entendem. É só um problema de geração.
Pati : - Como de geração ?
Miguel : - O cara tem uma amante e se diverte na vida enquanto a mulher fica em casa cuidando dos filhos e do lar, se apagando socialmente, espiritualmente e em prol de um casamento com um marido canastrão. Deixa o trem da felicidade passar, passar e passar.
Pati : - Eu sabia que você não entenderia o que acontece em minha casa. Volte para sua música e suas tietes. O que é isso, de geração ? Os dois são ainda muito novos e em que conceito você formulou essas diferenças ? O mundo mudou ? Você é diferente deles ? As relações mudaram ? O que mudou, me diga ? O homem contemporâneo tornou-se por acaso um nobre, puro e digno, educado e gentil senhor ? Ora, não enche a minha tolerância Miguel. Vou embora para casa.
Miguel (sorridente): - Tá certo “mi amore” vai com Deus. Eu não vou ganhar um beijo de despedida ? ( Pati manda um beijo de longe e sai correndo ) Um beijo ! obrigado meu amor, volte logo, estou te esperando.



No Grande Hotel onde se hospeda o casal Weber a noite corre solta. O casal se diverte à sua maneira. Muitas brincadeiras e festa. Muitas compras. Um carro de luxo, tipo limusine. Ambos trajam figurinos exuberantes e dançam com qualquer música. Estão felicíssimos. No hall do hotel dão gordas gorjetas e são tratados como reis. O apartamento é de alto luxo. Os dois entram meio alcoolizados e PaiWeber liga a TV. Os dois sentam-se na grande poltrona da sala de estar. Mãe Weber apaga as luzes e senta-se ao lado do marido. O casal se trata com o maior carinho, há muito tempo isso não acontecia, estão prestes a fazer amor, quando a porta do apartamento é aberta e um vulto, uma sombra, entra sorrateira. Clima de terror e mistério. O casal é assassinado brutalmente e na penumbra não se vê o assassino. O néon brilha, anunciando o Grande Hotel.



O dia amanhece na casa de praia de Teresa que está servindo o café. Jorge chega acompanhado de Márcio e, logo em seguida, com a cara de sono, chega Pati. Todos estão sentados à mesa. Um clima pesado de silêncio é cortado quando Jorge pega na mão de Teresa. Pati olha para o pai e lembrando do telefonema joga o pão na mesa e sai chorando.

Teresa : - Não foi nada, Jorge. Parece que ela brigou com o namorado e está muito triste.
Márcio : - Ora, que boa novidade ! Finalmente acabou esta loucura e eu posso viajar mais feliz.
Teresa: - Pare com isso, Márcio. Não vê que sua irmã está sofrendo ? E que estória é essa de viajem ?
Jorge : - Teresa, meu amor, não vai ser possível ficar aqui até o final da semana. Recebi um telefonema da Firma e o Alex quer que eu compareça imediatamente para uma reunião inadiável. Não posso faltar. Volto assim que puder. Conversei muito ontem com o nosso filho e resolvemos que ele partirá hoje comigo e no final de semana ele segue viagem para a academia.
Teresa: - Mas você não disse a ele o quanto é doloroso para nós termos um filho longe de casa ? Numa outra cidade, distante de nós...
Márcio : - Mas mãe, não é tão longe assim. Eu posso visitá-los nos fins de semana. E nada neste mundo me fará recuar !
Teresa : - Você é muito jovem, meu filho, para decidir de pronto o seu destino, para saber qual a decisão que é certa nesta vida, pense um pouco mais, fique aqui comigo mais alguns dias e poderemos juntos achar outros caminhos que não este. Fique meu amor, sua mãe está lhe pedindo.
Márcio: - Não ! Já resolvi com meu pai e não tem retorno. É o meu sonho, o que eu sempre quis. Todos os meus amigos estarão lá. Somos um mesmo grupo e temos as mesmas idéias. Obteremos as maiores notas e entraremos na academia escoltados pelo mais velho oficial da escola. A senhora quer me tirar isto ? Esta é minha vida.
Pati ( que vem chegando ) : - Ao contrário, querem é arrancar o meu coração. Estraçalhar o meu orgulho. Minar o meu campo de batalha. Explodir minha vida em estilhaços de remorsos. Me matar...
Jorge : - Teresa, viver para mim é satisfazer os desejos dos meus filhos e de minha mulher, sejam eles quais forem. Mesmo o teatro de Pati, eu quero viver tudo, com e por eles, nossos filhos !
Pati: - Palmas, palmas, tudo muito bonito e bem ensaiado, mas a verdade passa longe disso.
Jorge : - Sem essa, Pati. Vai ensaiar um pouco mais, vem cá e me dá um beijo ! Teresa, já estou indo e as malas já estão no carro. Venha, me dê outro beijo de despedida. Avise o Henry que telefono para ele assim que chegar.

Pati volta para o quarto chorando. Teresa beija os dois e vai socorrer Pati. Jorge e Márcio saem para viajar. Quando vão saindo, passam pelo marinheiro Henry, sem vê-lo.



A estrada de ferro que deixa a pequena cidade de Relampejo é velha e sinuosa, cercada de mata atlântica ainda virgem. Pela ferrovia, em dias claros como esse, de algumas clareiras, pode se avistar o mar, ao longe, se confundindo com o horizonte azul. O trem vem deslizando lentamente pelos velhos trilhos serra-abaixo e no seu interior está Antonella, vestida de maneira diferente, muito mais arrumada, de chapéu, écharpe esvoaçante e roupas coloridas.

Antonella (pensando) : - É, não demorou muito para e obter a resposta daqueles dois fanáticos advogados que me ofereceram uma mala de dinheiro para que eu pudesse esquecer o testamento deixado por meu pai, todos os imóveis e, se possível, a própria igreja. Sei que saí perdendo, mas o que importa ? Agora eu posso fazer o que sempre desejei - sair deste vilarejo, deste sórdido lugar, para o mundo. Estou livre, de tudo e de todos. Sou rica. Sou linda. Tenho a vida pela frente. Europa ! Grécia ! Austrália ! Ah ! Não acredito que tive tamanha coragem - Mas olha só quem está ali na frente...
O vagão de passageiro pára depois que passa a locomotiva, deixando muita fumaça e poeira, quando a imagem retorna, pode-se ver o rapaz que está à beira da estação com sua pequena mala: - É o funcionário ! O que estava preso - grita Antonella. Ele chega na janela do carro, limpando a poeira deixada na sua roupa suada.

Funcionário : - Senhorita Antonella ? Que surpresa agradável ! Dando um passeio ?
Antonella : - Mas como você está sujo ! Quando foi que te soltaram ?
Funcionário : - Agora mesmo, aqui na estação, com ordens de ir em frente e não olhar para trás. Achei que iam me matar, aqueles dois canalhas vestidos de autoridades.
Antonella : - Você tá com sorte ! Venha. Entre. Este trem te leva para longe daqui.




Rio de Janeiro. Restaurante de Luxo.

Jorge está sentado em uma mesa acompanhado por Cristina, Suzana e Alex. Um casal, mais um outro, e outro se aproximam da mesa, cumprimentando os quatros, e são levados por um gerente a suas respectivas mesas. O pequeno restaurante está cheio e todos sentam-se em seus lugares. Todos estão felizes e alegres. Uma comemoração. O garçom traz mais uma garrafa de champanhe para a mesa dos anfitriões. Jorge bebe de um uma só vez o champanhe e quebra a taça no chão. Alex o acompanha, todos os casais que estão no restaurante fazem o mesmo. Acompanhados pelo maitre, vários garçons servem vários pratos, com pequenas porções, de fruto do mar, carnes diversas, aves de todos os tipos. A cada prato, um bicho vivo correspondente ao servido é mostrado aos convidados de Alex, e um pedaço da sua carne, já preparado pelos mais conceituados cozinheiros, vindos de todas as partes da terra, é levada numa bandeja de ouro para a degustação dos jovens empresários, que se divertem bastante nesta farra gastronômica. Tudo muito fino e elegante.


Alex : - Jorge, eu te falei que iríamos comemorar o nosso primeiro milhão de uma forma inusitada, única, inesquecível. Aqui está a elite de nossos funcionários, todos precisam saber de nossa união e de nosso acordo, para que os negócios corram bem. Não fiz bem ? Não fiz ? ... Quase fui buscá-lo, lá na praia, depois que recebemos a notícia de que tínhamos fechado o negócio. Foi tudo muito rápido. O Presidente ficaria orgulhoso se aqui estivesse... Então, não pensei duas vezes, encomendei dos melhores cozinheiros do mundo, nas suas especialidades, todos os tipos de carnes, da terra, do céu e do mar, preparadas com óleos e ervas só encontradas em seus países de origem, por mãos de verdadeiros artistas. As mais saborosas de todas as comidas. E para degustar melhor o sabor dessas especiarias, vamos apresentar, ao vivo, os bichos... Que venha o mar !

Entram duas mulheres semi nuas trazendo num aquário uma lagosta viva e, em seguida, os garçons trazendo o respectivo pedaço, e assim sucessivamente durante todo o banquete. Suzana se aproxima de Cristina.

Suzana : - As melhores bebidas, a melhor comida e os melhores músicos, para os melhores amigos. Tudo isso para uma paz duradoura e confortável, para nós duas, minha amiga querida. Eu sei do seu amor por Jorge e farei de tudo para que dê certo.
Cristina : - Mas, e sua amiga Teresa ?
Suzana : - Gosto muito mais de você e somos uma só família. Quero cultivar isso.

Jorge se achega à conversa das duas e fala no ouvido de Cristina.


Jorge : - Você é uma mulher deslumbrante, Cristina. Cada gesto seu é de uma leveza poética que me provoca desejos inconfessáveis. Nesta noite eu só tenho um pensamento, um só desejo: Comer a sua carne ! ( dá uma mordida no pescoço de Cristina ).
Cristina : - Jorge ! não eram inconfessáveis ?
Jorge : - Eu disse isso ? ... Estou maluco, estou bêbado, vamos dançar ?
Alex: - Chega de Mar, vamos voar ! Suzana vamos dançar, vamos voar ! Que venham os pássaros !

O maitre entra com um peru bêbado. As moças, semi nuas, com alguns pássaros silvestres. Os garçons esperam os dançarinos para a mudança dos pratos. Todos dançam ao som de um bolero interpretado por uma grande cantora nacional.

É noite. Antonella em seu velho trem parado numa estação qualquer, de onde se podem ver as luzes da cidade costeira. O funcionário falante dorme cansado na poltrona do seu lado. Antonella lembra-se de Fidor e uma tristeza transforma o seu rosto.

Casa de Teresa na praia. Antena de TV. Na televisão um casal dança um bolero. A imagem é péssima. Pati desliga o aparelho sentada num sofá com o controle. Ela está com um roupão de banho entreaberto mostrando
de relance suas partes mais íntimas. Teresa chega enrolada numa tolha branca e felpuda. Um momento extremamente feminino entre mãe e filha. De cabelos molhados as duas estão lindas. Elas se vestem para sair. Pati ajuda Teresa com seus cabelos e começa brincando, a vestir, maquiar e transformar a mãe, com suas roupas e pinturas, numa menina, igual a ela, parecendo, no final, que são duas irmãs.

Pati : - Você é tão jovem e tão bonita que eu fico tão orgulhosa de ser sua filha que tenho vontade de gritar. Meus amigos vão te adorar. Eu tenho certeza que você também vai adorar conhecê-los. Esta vai ser uma noite adorável.
Teresa (cobrindo o corpo da filha) : - Pati ! Como passa o tempo ! Você tornou-se uma mulher ! É linda e tem um belo corpo. Seu namorado que se cuide. Venha cá minha menina crescida. Me dá um beijo.




No restaurante de luxo do Rio de Janeiro a festa continua. Estão todos sentados novamente. O maitre entra com um pequeno boi e as meninas mostram, com uma tinta branca, os pedaços a serem servidos e devorados por uma platéia já meio bêbada de tanto tomar champanhe.

Suzana : - Alex, tire as mãos da minha perna !
Alex : - Calma Suzi, temos uma noite inteira pela frente.

Alex agarra Suzana e os dois gritam, derrubam copos no chão, sob os
olhares escandalizados dos garçons e convidados. Jorge, imaginando alguma coisa mais grave, levanta-se. Quase ao mesmo tempo, Alex levanta-se também, mostrando em sua mão a calcinha vermelha de Suzana que ele havia tirado. Ele mostra o troféu para os convidados e todos aplaudem entusiasticamente. Jorge senta-se novamente e, passado o susto, dá um sorriso tranqüilizador e todos riem, enquanto os garçons servem os pedaços do boi.

Alex : - Agora chega. Levem este boi daqui. Tragam mais uma garrafa de champanhe e me mande as meninas com a surpresa da noite.

Entram as meninas semi nuas, carregando dois aquários. Um pequeno, vazio e outro maior cheio de camarões vivos. Este aquário é colocado ao lado da mesa enquanto um chinês prepara uma outra mesa com um fogareiro, muitas ervas e tempero, um óleo de oliva especial, bem verde, uma garrafa de conhaque francês. As meninas, sob os olhares curiosos de todos, enchem com várias garrafas o pequeno aquário com um suave vinho branco francês.
Uma outra menina pega quatro camarões dos grandes, vivos e retirando-os do aquário com água do mar, coloca-os no aquário com vinho branco. Uma luz, um spot ilumina a dança dos pequenos crustáceos que dançam bêbados até o fim, quando são retirados, passados num preparado de conhaque com ervas e levados de imediato no óleo quente. Pode se senti-los mexendo-se enquanto são levemente tostados e finalmente servidos e degustados por todos. A cantora convidada canta um velho hino tibetano. Assim que Jorge experimenta o camarão chinês e aprova, Alex levanta-se e é aplaudido por todos. Uma comida para os escolhidos ! Do mais tradicional mosteiro do Himalaia à sua mesa ! Diz ele em voz alta. Quem está séria e atenta é Cristina. Alguma coisa de errado ela pressente. Quando todos estão distraídos com os camarões, aparece, do fundo do restaurante, um chinês alto, estranho e forte, vestindo uma roupa de monge. Ele se aproxima da mesa onde está sentado Jorge, puxa a sua cadeira e o agride com um empurrão, mandando-o em cima de uma mesa que se quebra totalmente. E agora uma demonstração de luta marcial ! Diz Alex sentando-se para presenciar a surra que Jorge vai tomar. A confusão é total. Todos correm para a saída. A briga continua. Cristina, já preparada, se opõe ao estranho. Alex fica assustado e levanta-se de onde estava sentado, apreciando o início da briga e aproxima-se de Suzana que dá um grito e pede para que não machuquem Cristina. Jorge, que está no chão, levanta-se com rapidez. Retira do bolso uma arma pequena e descarrega os sete tiros nas costas do grandalhão. O estranho chinês consegue ainda virar-se e agarrá-lo com força, tentando enforcá-lo. Suzana e Alex fogem do restaurante. Cristina pega numa grande faca que esta na mesa do cozinheiro chinês e crava nas costas do estranho. O individuo, que cai sobre Jorge, tenta desesperadamente e com sucesso retirar a faca de sua costas. Cristina pega rapidamente a mão de Jorge e o leva escondido, por trás do restaurante, acompanhado pelo maitre. Neste momento entra em cena o sr. Ortega e o anão. Ambos estão armados com uma metralhadora. Eles atiram, à queima roupa, uma saraivada de balas no resistente e estranho homem chinês, cortando-o ao meio e desfigurando-o completamente. Eles logo saem do restaurante e desaparecem nas ruas vazias. A polícia chega no local em seguida. Forma-se então uma grande confusão. Muitas pessoas que estavam na festa, falam ao mesmo tempo com os policiais.
Na outra rua, Jorge insiste com Cristina para ela entrar num táxi, dirigido por um negrão.

Jorge : - Cristina, fique calma. Tudo vai se resolver. Temos que sair agora. A polícia acaba de chegar e o circo está armado. Não podemos fazer mais nada agora. Entra logo no carro, eu acabei de matar uma pessoa ! Não se preocupe, o motorista é meu conhecido.
Cristina : - Aquele descarado e mal caráter do Alex é que armou tudo isso. Ele quis ser mais esperto do que é realmente. E a Suzana, minha amiga e irmã, compartilhou desta rica e preparada traição, regada a champanhe, especiarias e paz. Eu não posso acreditar.
Jorge : - Cristina, eu matei um homem ! Puta que o pariu. Tenho que ir imediatamente a polícia, não posso fugir de minhas responsabilidades.
Cristina : - Você está ficando louco ? O Alex pode ser um canalha, mas de burro não tem nada. Ele tem nos seus convidados várias testemunhas a seu favor. Vai jurar até morrer que não tem nada a ver com isso. Vamos para casa e com a cabeça mais fria resolvemos o que fazer.
Jorge : - Se o Alex imaginou todos os movimentos deste jogo eu creio que sua casa não é o lugar mais seguro. Vamos para um hotel.
O Negrão : - Dona Cristina, me desculpa, mas o sr. Jorge tem razão. Se os dois me permitem, eu conheço um lugar que fica na serra onde ninguém vai encontrá-los. Posso garantir. O sr.Jorge já conhece ! Posso ir ?

O táxi segue em direção à serra de Petrópolis. Começa a chover forte.



Teresa e Pati entram correndo no BARDOETERNO porque chove forte. A banda do Miguel está toda sentada nas mesas internas, tomando umas cervejas e comendo uns tira-gostos.

Pati: - Oi ! Oi, Miguel ! Oi, Turma! Esta aqui é minha mãe Teresa.
Teresa : - Alô, Miguel, como vai ?
Miguel : - Muito prazer em conhecê-la, Teresa. Não sabia que sua mãe era tão jovem, Pati. Parecem irmãs. É incrível ! A Pati me falou que você canta e faz umas musicas de vez em quando no violão. Puxa ! é um prazer.
Teresa : - Que é isso, Miguel, já foi o tempo que eu tinha tempo para me dedicar à música e à composição. Sou uma cantora de banheiro, como se diz, canto só pra mim e de vez em quando para meus filhos e meu marido, mas também foi o tempo !
Pati : - Que isso, mãe ? O seu tempo, a partir de hoje, é igual ao meu. Ele para mim simplesmente não existe !
Miguel : - A chuva acabou, vamos tocar um pouco ? Quem sabe a mãe de Pati, Teresa, se anima e nos mostra o que sabe. Então, vamos ? ... E agora, com vocês, os L S D.


Os rapazes do “The Last Summer Day” atacam com suas guitarras uma música conhecida, mais lenta, com um arranjo de blues que coloca Teresa inebriada. Num trecho mais conhecido, Miguel a chama. E para surpresa de todos, Teresa sobe no palco e, desinibida, dá um show de interpretação.
Chegando ao final, Teresa vê entrando no bar uma pessoa, de pele escura, que lhe lembrou Fidor, o personagem do livro de Antonella e um pouco depois dele, entra também no bar o marinheiro chamado Henry. Os dois sentam-se em mesas diferentes. Teresa começa a passar mal e desmaia. Todos correm para acudi-la.



Deitada numa cama forrada por alvos lençóis brancos de linho, em um aprazível hotel escondido na serra, está Cristina. Jorge está saindo da sauna e deita-se na banheira de hidromassagem. Cristina pega no telefone que chama insistentemente. É da portaria do hotel. O motorista do táxi, o Negrão, quer falar com Jorge.

O Negrão : - Sim. Sim. Eu estou deixando eles avisados. Pode ficar sem susto que vou cumprir o nosso trato direitinho ... Eles vão ter o que merecem. ( desliga o telefone )
Jorge : - Cristina, eu desconfiava do caráter do Alex há muito tempo. Cristina, o que mais, além dos enlatados, além das sardinhas, dos sumos de frutas tropicais, o que mais o Alex colocava nas remessas que se exportava ! Cocaína ? Sabe o que eu descobri, que estávamos exportando, traficando, grandes quantidades, milhões de dólares, sem que a Firma soubesse. Avisei ao presidente que me jurou que isso não aconteceria mais e creio que ele falava sério, mas o Alex continuou a fazer essa farsa, essa mágica financeira e creio que o medo que ele tem que eu assuma a presidência é de pôr um fim nesta tramóia absurda antes que tudo possa explodir. Foi assim pensando que comprei aquela arma de sete tiros com a qual matei aquele filho da puta. E agora a polícia estará toda em meu encalço.
Cristina : - Pare de se preocupar, já telefonei para o sr. Ortega, e ele me disse ter ido ao restaurante onde estávamos e que lá metralhou à queima roupa o estranho que nos atacou que ficou irreconhecível. Portando, vamos ficar tranqüilos e relaxar.

Jorge sai da banheira e deita-se ao lado de Cristina que lhe faz carinhos e carícias diversas.

Teresa acorda sentada na mesa do bar, cercada por Miguel, Pati e o marinheiro Henry.
Miguel abana. Pati acaricia. Henry passa gelo nos seus pulsos.

Teresa : - Onde estou ? ... O que aconteceu ? ... Ó meu Deus, que vergonha ! Pati me leva para casa minha filha, ainda não me recuperei e me sinto mal. Ó senhor Henry, me perdoe pelos nossos encontros atravessados. Miguel, já estou melhor, obrigado pela noite. Agradeça e se desculpe com os músicos por mim. Obrigado por tudo e até manhã.

Teresa sai abraçada com Pati e está bem abatida. Mas antes de chegar na rua, olha para traz, para a mesa onde continuava sentado o moreno Fidor que, se vendo observado, acena um cumprimento com a cabeça. Teresa sai assustada.



Os acontecimentos no Grande Hotel onde se hospedava o casal Weber se complicam com a chegada da imprensa. Os dois detetives da Igreja aparecem na cena do crime.

Det. Soares : - Senhores da imprensa, eu pediria que todos se retirassem, pois estão atrapalhando a investigação da polícia.
Det. Leite : - É isso mesmo, vamos saindo que temos muito trabalho aqui e não temos tempo para perder com publicidade nos jornais.

Quando o soldado vai fechando a porta, entram os dois policiais de Relampejo.

Det. Leite : - Soares, olha quem está aqui !
Det.Soares : - O que os dois estão fazendo aqui ?
Policia 1 : - O sr. Weber era nosso amigo e estamos cumprindo ordens do senhor delegado de polícia.
Policia 2 : - Mais que isso ! Eles são cidadãos de Relampejo e portanto o duplo assassinato nos interessa mais do que na certa aos senhores.
Policial 1: - Elementar !
Det. Soares : - Ora, seus caipiras, não amole e me deixa trabalhar. Eu não vejo nenhum casal Weber morto aqui neste apartamento, você vê detetive Leite ?
Det. Leite : - Detetive Soares é claro que não ! eles se registraram com nomes falsos ! E quanto aos caipiras, quer que os coloque para fora ?
Det. Soares : - Seu burro ! Não vê que eles estão cumprindo as ordens do delegado, deixe os dois amadores participarem da investigação, eles já estão aqui mesmo. Mas olhe aqui, não se intrometam no nosso trabalho.
Policial 1 : - Já foi encontrada a arma do crime ?
Policial 2 : - Sherlock, vamos começar pela televisão.
Policial 1 : - Elementar, meu caro Walter.
Det. Leite : - Mas que sujeitos chatos !
Det. Soares : - Detetive Leite, já concluímos o nosso serviço. Vamos embora, este é mais um caso para a polícia de Relampejo. Um caso de dois caipiras na cidade grande. Só podia acabar em morte !
Det. Leite : - Mas e quanto ao ouro ? O dinheiro ? Não achamos nada ainda !
Det. Soares : - Às vezes você fala demais, não consegue ver que este foi um crime comum. Um assassino forte, portanto jovem, um tipo de rapaz doente, problemático, que faz a festa dos casais mais velhos, muito comum hoje nestes hotéis de luxo e orgia, que não ficou satisfeito e resolveu eliminá-los. Não é claro ?
Det. Leite : - Você parece aqueles detetives porretas de filme americano que sabem de tudo e só o que precisam é de uma prova, de uma pista, de um vacilo do meliante para fechar o caso . ( os dois saem rindo e fecham a porta do apartamento )


Os Policiais 1 e 2 continuam abaixados mexendo na televisão.


Policial 1 : - O que esses dois quiseram dizer com um rapaz forte e um hotel de orgias ?
Policial 2 : - Sherlock, eles vieram até aqui para ver se achavam o ouro ou algum dinheiro que o suposto casal Weberes tivesse gastando depois de ter roubado o cofre da Igreja. Mas como não encontraram nada, inventaram esta estória só para nos confundir. Não seja bobo, vamos voltar para Relampejo e comunicar o fato ao delegado.
Policial 1 : - Elementar Walter ! Espere aí, olha o que tem aqui escondido nesta televisão !

Na grande televisão do hotel está o esconderijo do PaiWeber, foi lá que ele guardou, escondeu, parte da fortuna retirada do cofre do Pastor Divino. Uma grande quantia em dólares e algumas pesadas barras de ouro.


O Negrão está parado com seu táxi na porta de um hotel de luxo. O porteiro faz um sinal para que ele pegue o casal. Ele arranca com o carro estacionando em frente ao hotel. Descendo, abre a porta para que o casal entre. Suzana e Alex entram no táxi. O Negrão olha para traz e pergunta o itinerário.

Negrão : - Para onde vamos ?
Alex ( meio nervoso ) : - Motorista, vai andando à sua vontade que eu te falo onde vamos.
Negrão : - O senhor é quem manda.

Alex está beijando Suzana e fazendo-lhe umas carícias um pouco íntimas quando o Negrão olha para trás.

Alex : - Motorista, o senhor pode me fazer o obséquio de olhar para frente ? Assim vamos acabar batendo num poste.
Suzana : - Alex, meu amor, eu quero fazer hoje um programa diferente, não quero voltar para o hotel, nem ir para minha casa, vamos passear, andar sem rumo, estou muito chateada. Porque pegamos um táxi, se temos vários carros, motoristas e seguranças ?
Alex : - Tenho certeza que aqueles dois estão preparando alguma cilada para mim e não posso me arriscar em ser reconhecido. Um táxi é mais impessoal, Suzana.
Suzana : - Como fomos estúpidos e gananciosos nesta empreitada. Nada pode dar certo quando o principio é equivocado e mal feito. Aquele guru tibetano não era de nada, tudo errado, mas que merda !
Alex : - Ora, meu senhor ! Olhe para frente ou então pare este táxi que nós vamos descer. O senhor está me ouvindo ?
Suzana : - Vamos para o seu apartamento em Copacabana. Dê a ele o endereço.
Alex : - Motorista, vamos para a Av. Atlântica.

O Táxi segue pelo aterro. É tarde da noite. Pouco movimento na rua.
O Negrão canta um samba de breque.

Alex : - Dá pra calar essa boca ? Você já está me enchendo o saco seu preto filho da puta.
Suzana : - O que é isso Alex ? O senhor me desculpe, é que estamos um pouco nervosos está noite. Olha ali é o nosso apartamento. Pode parar o táxi, motorista.

O Taxi pára na porta de um edifício de luxo. Os dois descem e Alex olha pela janela para o motorista.

Alex : - Você não perde por esperar. Isto é maneira de tratar um
passageiro ? Seu bosta ! Toma aqui esta merda ( joga um bolo de dinheiro e moedas na cara do Negrão) e da no pé senão a coisa engrossa para o seu lado.

Alex vai ao encontro de Suzana que já está na portaria do prédio. O Negrão desce do taxi e chama o valentão.

Negrão : - Ô doutor ! Ô doutor ! o senhor esqueceu aqui dentro, no banco de trás, esta calcinha cheirosa. E no banco da frente a sua vergonha. ( mostra o dedo em forma de um pênis para ele ).

Alex avança para ele enfurecido. Vai começar uma briga. O Negrão tira um revólver “três-oitão” e encosta no coração do tolo.

Negrão : - Agora, seu machão, vá andando lentamente em direção à portaria e não faça nenhuma bobagem que morre você e sua amante.
Alex :- Só quero que você me diga uma coisa, crioulo filho da puta, foi o Jorge que te contratou para me matar ?
Negrão : - Fique calado e nada te acontecerá. Vamos andando.

Os dois chegam na portaria do prédio. O porteiro já desconfiado, levanta-se do trabalho, do seu ostracismo, fica esperto e corre para fechar a portaria. Mas era tarde, o negrão já tinha colocado o seu enorme pé entre a porta e o batente, não permitindo que ela se fechasse.

Negrão : - Hoje é preciso ter muito cuidado com os ladrões, principalmente com um preto grande e abusado como eu, não é seu branco de merda ( dá um tapa com pouca força na cara de Alex ).

O porteiro, a mando do negrão, abre a porta do elevador e todos entram sob a mira do revólver. Alex está para explodir de raiva. Suzana está mais calma.

Suzana : - Meu amigo, não seria possível nós resolvermos esta demanda com uma quantia, vamos dizer, o suficiente para você se aposentar ?
Negrão : - Madame eu não sou seu amigo. E não há dinheiro no mundo que me tire o prazer desta noite.
Suzana : - Nem que sejam 10.000 dólares ? 100.000 ?
Alex : - O prazer dele é o prazer do Jorge e da Cristina em nos matar. Você não vê que isto foi tramado, armado e que este crioulo filho da puta só está aqui para nos matar ?
(O Negrão dá uma sonora gargalhada )
Suzana : - Cem mil ! Pronto, vamos acabar com isso. Eu faço o cheque.
Alex : - Suzana, você está ficando louca ? De onde você vai tirar todo este dinheiro ?
Negrão : - As coisas aqui estão melhores do que eu imaginava ... O que ? que cheiro de merda ! Meu filho, você está todo cagado ! É melhor me dizer logo onde estes dois pilantras moram para você poder se limpar, vamos, qual é o apartamento ?
Alex : - Não fala, seu merda ! Porque, além de perder seu emprego, você vai preso como cúmplice... ai !
O negrão da uma cotovelada na boca de Alex fazendo pular alguns dentes para fora.
O Negrão : - Isto é para você ficar calado e não dizer tantas besteiras.
Suzana da um grito de horror. A cara de Alex é puro sangue. O porteiro imediatamente mostra a porta do apartamento. Alex abre a porta com o revólver em sua cabeça e todos entram.
O negrão, depois de olhar o apartamento, prende Alex e o porteiro cagado num cubículo onde se guardavam mantimentos.

O Negrão : - Se vocês derem um pio, fizerem algum barulho, falarem qualquer coisa, eu corto os bagos de vocês dois, seus merdas e mato essa mulher. Vocês estão me escutando ! Fiquem quietos que viverão. Falem alguma coisa e morrerão. Este é o jogo. Se eu fosse você tirava esta calça. Vai ficar todo assado na merda assim, seu cagão ? Me dêem licença que vou fechar a porta. Tenham um bom dia. Agora é a madame. Quanto mesmo a madame me ofereceu ? Cem mil ? Não precisa tanto, eu aceito o que tem aí mesmo nesta bolsa.
Suzana : - Não mexa em minha bolsa, seu desgraçado !
Negrão : - Vamos ver o que temos aqui: Uma calcinha vermelha, uma carteira recheada de dólares, olha ! O que é isso aqui ? Uma arma ? Pra que a madame usa isso ? Um consolo tão grande ? O coitado aí dentro nem para isso serve. Mas a senhora não vai mais precisar disso. Eu tenho um bem maior que este.

Suzana dá um grito de horror e tenta fugir. O Negrão pega ela com jeito e a amarra na mesa com as pernas abertas.

Porteiro ( olhando pelo buraco da fechadura e falando baixo no escuro ) : - Vai estuprá-la.
Alex ( resmungando ) : - Negro filho da puta, eu vou matá-lo.
Porteiro : - Fala baixo doutor, se não ele vem aqui e castra nós dois.
Alex : - Por favor, pare de olhar.
Porteiro : - Como doutor ? É a minha posição. Não tem como me mexer aqui dentro.
Alex : - Filhos da puta. Eu vou matar vocês todos.

Suzana está amarrada nua na sala de jantar com parte do tronco e a
cabeça na mesa e as pernas abertas amarradas no pé da mesa. Está de costas para o Negrão. O porteiro vê a cena pelo buraco da porta. O negrão se aproxima com o consolo de borracha encontrado nos pertences de Suzana e como se fosse um microfone irradia um jogo de futebol enquanto a estupra.


Negrão : - Atenção, senhoras e senhores estamos aqui diretamente do Maracanã para mais uma partida entre o time dos pretos contra o time dos brancos. Hoje em noite especial, o jogo se realiza num campo muito perfumado no bom e no mal sentido e com uma platéia atenta aos lances mais dramáticos desta partida.
Meus queridos ouvintes, esta pelota não é de couro é de veludo ! Está dura e esticada, no ponto ! O juiz pede para verificar as condições do gramado, das traves e do gol. Vamos lá minha gente ! Foi dada a saída. A pelota rola em campo a procura do gol. O tempo ainda está seco, mas não demora muito vamos ter chuva. O gramado molhado favorece a equipe da casa. A bola passa agora de um lado a outro e num violento chute do pretão bate na trave branca e rosa do time da casa. A chuva aumenta a excitação da torcida e o campo finalmente fica molhado, gostoso de correr com a pelota. Outro chute e na trave novamente. É preciso tratar com respeito o time visitante é ele que domina o jogo e atenção eis o negrão se aproximando da grande área, vai pra cá, vai pra lá, chega de frente ao gol, dribla o goleiro e entra com bola e tudo. A galera se levanta gritando gooollll e pedindo mais.




O trem vem se aproximando da estação central, ponto final da viagem de Antonella e do funcionário falante. Os dois descem do vagão de
passageiros e seguem para a saída principal. Rio de Janeiro. A grande cidade fervilha à frente da Central do Brasil. Antonella fica pasma com a suntuosidade dos edifícios e a quantidade de carros.

Antonella : - Eu nunca vi coisa assim em toda a minha vida. Nem sei para onde ir e nem o que eu vou fazer. Estou assustada e com medo. Confesso.

Antonella e o Funcionário quase são atropelados ao atravessar a avenida Getúlio Vargas. Chegam do outro lado na Praça da República.

Antonella : - É muito bonito isso aqui. Você agora vai fazer o quê ?
Funcionário : - Eu não sei. Sou um militante político e estou onde os trabalhadores são explorados pelo sistema e precisam se organizar para defenderem os seus interesses. Esta cidade está cheia deles. É só andar por aí. Mas agora eu estou mais interessado é no que você vai fazer ? Quero ficar um pouco com você. Posso ?
Antonella : - Eu ia adorar. Mas primeiro é preciso saber o seu nome, sermos apresentados.
Funcionário : - Eu me chamo José. Mas todos me chamam de Zé. É mais popular. Os trabalhadores gostam de me chamar de Zé Botafogo. Dizem que eu sou incendiário e que um dia ainda boto fogo neste país. É tudo brincadeira deles. Não conheço ninguém mais dócil e comportado do que eu. Só não gosto é de injustiça. Mas como neste mundo, que eu ando, é quase tudo uma safadeza, uma mentirada sem fim, eu não tenho tempo de me deixar lúdico com a vida e estou sempre na luta nervosa das transformações sociais. Ao conhecê-la, um outro caminho abriu-se à minha frente.
Antonella : - Então, muito prazer ! Vamos indo que tenho muitas coisas para comprar. José, pegamos o dinheiro no banco e viajamos para uma praia qualquer. Divertir e fazer planos para o futuro. São as minhas metas nestes dias. Não pensar em nada, este é o nosso compromisso. O mundo agora não tem limites e nós dois vamos fazer o que mais gostamos : Viajar.


Nos jardins do hotel da serra de Petrópolis Cristina e Jorge recebem a visita do o sr. Ortega . Eles estão tomando um café da manhã.

Jorge : - Como vai, sr. Ortega, vejo que veio acompanhado do nosso chofer e do seu tira gosto. (O anão não gosta da brincadeira e faz cara feia).
Sr. Ortega : - Cristina a senhora deve tomar bastante cuidado, as coisas no Rio de Janeiro vão ficar incontroláveis. Eu já tomei as providências para a proteção de vocês, mas peço que não saiam daqui até a minha volta quando estará tudo resolvido.
Cristina : - Obrigado por ter vindo sr. Ortega. Mas sei muito bem me defender e acho desnecessário um aparato grande de proteção. Prefiro a discrição. Quanto ao encontro com Suzana é preciso que ele aconteça o mais rápido possível de preferência, até hoje.
Jorge : - Não ! Não tem encontro com nenhuma Suzana. Eu nada mais tenho para falar com estes canalhas. Traidores e covardes. Já me preparei para a guerra.

Sr.Ortega levanta-se de supetão da mesa. O anão pega na sua arma. Jorge levanta-se também e se afasta. O Negrão aparece armado com uma espingarda calibre 12 de cano cortado. Uma escopeta. Cristina que assiste a tudo levanta-se e aproximando-se de Jorge pega em sua mão. Tudo com muita calma.

Cristina : - Sr.Ortega ! O Jorge, tenho certeza, não queria ofender a
menina Suzana. Nós todos estamos do mesmo lado. O Alex é que é o nosso inimigo comum, e portanto, marque um encontro meu com a Suzana para podermos conversar e te prometo que o Jorge vai concordar com tudo que for resolvido entre nós duas. Agora vá e volte com as confirmações que eu lhe pedi.

O sr. Ortega e o anão se afastam e do outro lado o negrão faz o mesmo. Cristina volta a conversar com Jorge.

Cristina : - O que houve, Jorge ? As coisas não se resolvem assim. A Suzana possui 51% das ações da firma. Ela é que manda. Nós não somos nada sem ela. Você está me entendendo ? Como os homens estão ficando burros ultimamente ! Estamos numa situação crítica. Qualquer erro nos levará à ruína e à guerra. A quem interessa isso ? Só ao Alex. Ele é que está por traz disso tudo. Você tem que inverter este jogo.
Jorge : - Não tem mais tempo. Já mandei o meu recado aos dois e não há maneiras de voltar atrás. A sorte está lançada e os dados é que fazem o jogo.
Cristina : - Que recado você mandou, Jorge ?
Jorge: - Fica calma que eles estão vivos. Talvez um pouco machucados, mas sem gravidade. O negrão quebrou os dente do Alex e ...
Cristina : - E o que Jorge ?
Jorge : - Estuprou Suzana.
Cristina : - Estuprou Suzana ! ... O que você fez Jorge ? ... Como pode fazer isso ? ... O negrão ? Seu capanga motorista de táxi estuprou a menina Suzana ? ... O sr. Ortega não vai aceitar isso de maneira nenhuma. Foi um erro mortal, Jorge.
Jorge : - Ora Cristina ! Os dois tentaram me matar e vou deixar isso desta maneira ?


Antonella está numa loja que aluga carros de todos os tipos. Ela e José escolhem com o vendedor o melhor, o mais apropriado para a viagem que querem realizar. Antonella quer o conversível vermelho o mais belo e caro último modelo da loja.

Antonella : - Nós estamos pensando em irmos sem rumo pela costa do sol até encontrarmos um belo hotel numa praia. Tudo tem que ter muito luxo e conforto. Lá pretendo passar um tempo antes de sair para o exterior. Este é o nosso plano.
O vendedor: - Faz pouco tempo um casal de senhores do interior também passaram por aqui com o mesmo desejo.
José : - E como eles chamavam-se ?
Antonella : - O que interessa o nome deles José ?
José : - Pode ser o casal Weber !
O vendedor : - Não era esse o nome, se lhe interessar posso verificar na administração.
José : - Não ! Não será preciso. Obrigado.


Teresa deixa de lado o livro que está lendo e vai até a varanda da casa para respirar e olhar o mar. Pati aparece com Miguel. Um pouco depois surge Henry.

Pati : - Como você está hoje, mãe ? Trouxe o Miguel que queria te fazer uma visita.
Teresa : - Estou bem melhor. Vamos entrar, Miguel. Pati leve o Miguel para tomar um refresco lá dentro que eu vou atender o sr. Henry que está chegando.
Henry : - Senhora Teresa, como tem passado ? Estou aqui hoje para lhe
parabenizar pela apresentação de ontem. Fiquei extremamente emocionado e não consegui dormir à noite na esperança de encontrá-la melhor hoje , mais bem disposta e com energia para dar um passeio comigo até a marina que quero lhe mostrar uma coisa. Você vai ?

Lá dentro da casa, Pati, vendo a cena na varanda, conversa com Miguel.

Miguel : - Sim, eu acho que se sua mãe desse mais tempo à música do que ela dá aos problemas da família, na certa sairia desta depressão.
Pati : - Mas afinal, quem é ele ?
Miguel : - Quem ? O senhor ali fora ? Não sei. O que sei é que ele freqüenta todas as noites o BARDOETERNO e que possui um grande iate ancorado na marina. Dorme e vive no barco. Talvez um navegador solitário jovem, rico e carente. Seu pai que se cuide.
Pati : Pare com isso Miguel, você sabe que não gosto desta brincadeira com meu pai.

O visitante despede-se de Teresa e já saindo vira-se e dá um adeus para Pati e Miguel que estavam em pé, parados e em silêncio, observando a cena.


Finalmente a porta onde estão Alex e o porteiro se abre e os dois podem sair. Alex vai até a mesa e desamarra Suzana. O porteiro dá uma olhada e sai correndo para o elevador.

Suzana: - Alex você é o culpado disso tudo, seu babaca. Foi dar uma de machão com o motorista de táxi e veja só o que aconteceu, seu filho da puta. E o que você está olhando ai seu merda ? Arrume logo uma toalha para que eu possa tomar um banho. Machão ! E agora está satisfeito, sem um dente na boca, todo sujo de sangue e ainda põe a mão para o céu de estar vivo. Brigar com um negrão na noite do Rio de Janeiro é caçar confusão, é procurar a morte seu imbecil ! Ninguém te contou isso não ? Analfabeto ! Boçal ! Papai tinha razão, você é uma besta !
Alex : - Mas Suzana, isso foi obra do Jorge, você pode ter certeza. Este negrão era um pacote encomendado para nós dois. Eu vou matar aqueles filhos da puta, pode deixar...
Suzana : - Que pode deixar qual nada. Você não acha que Cristina ia fazer isso comigo. Por mais que você tenha feito de tudo para azucrinar a vida de Jorge ela não deixaria isso acontecer. Então não me venha com estas deduções de última hora só para limpar a culpa e a sua estupidez do dia anterior ! - Vou dar um corretivo no Jorge para ele aprender quem manda na Firma - Você ia matá-lo e Cristina interveio, esta é a verdade !
Alex : - Eu não sabia que ele andava armado. Nunca usou arma antes. Por que só naquele dia ?

A campainha do interfone toca e Alex vai atender.

Suzana : - O que foi agora Alex ?
Alex : - É o porteiro perguntando se chama a polícia ou não ?
Suzana : - Manda ele esperar que você já esta descendo.

Suzana entra no banho e Alex lava a cara, muda de roupa e desce para a portaria. Chegando lá, encontra o porteiro limpo de banho tomado e perfumado.

Alex : - Seu cheiro agora está mais agradável. Você vai me fazer um grande favor (tira um bolo de dinheiro do bolso e entrega na mão do porteiro) Esquece o que você viu e ouviu aqui esta noite e eu lhe serei muito grato.

Suzana chega na portaria e uma limusine está a sua espera com um motorista. Os dois entram e o motorista fecha a porta, senta-se no volante e sai com o carro. O porteiro fica com uma cara de quem não está entendendo nada e começa a contar o dinheiro.



É dia de verão. Pati e Miguel estão na varanda da casa quando aparece Teresa, esportiva, banho tomado, outra cara, assustando o casal de namorados.

Pati : - Oi mãe ! Onde você vai ?
Teresa: - Vou dar um passeio. Vou passar lá na marina para ver o barco que seu pai quer comprar. Quer ir comigo ?
Pati : - Não! estamos de saída, Miguel vai ensaiar lá no Bardo e eu vou ficar com ele. Porque não nos encontramos lá mais tarde ? Você está se sentindo bem ? Você quer que eu vou com você ?
Teresa : - Não, Pati. Não precisa mesmo. Vai para o ensaio com Miguel que eu te encontro mais tarde. Um beijo gostoso minha criança... até mais Miguel.

Pati e Miguel saem para um lado e Teresa sai por outro. Saindo, encontra-se com o carteiro que lhe entrega uma carta. É para Jorge. Ela fica curiosa e abre. Era uma foto colorida do filho para o pai. Reunião de um grupo neo fascista em casa do Dr.Zara, o analista de Teresa. Todos estão presentes. Os advogados. Os detetives. O Dr. Zara e alguns jovens vestidos de militar, camisas verdes e calças curtas de qualquer cor, entre eles está Márcio seu filho. Teresa olha para a foto, rasga e joga fora.
Teresa se aproxima da marina e logo vê, tomando no bar uma champanhe, o marinheiro de luxo Henry Dumont.

Teresa : - Alô, como vai ?
Henry : - Estou encantado com sua presença. Por favor sente-se.
Teresa : - Eu quase desisti, mas de repente, um vento soprou no meu rosto e me veio a lembrança da brisa de quando se esta navegando, não resisti e corri para a marina ver os barcos e sem querer nos encontramos novamente.
Henry : - Bendito seja o vento que sem querer lhe trouxe para perto do mar e por que não dizer ? Mais perto de mim e da alegria de se estar vivo. Pois vivo em perfeita harmonia entre estes elementos binários o mar e o vento, a água e o ar, o homem e a mulher.
Teresa : - Terá sido a sua origem francesa é que lhe deu esta veia poética ?
Henry : - Teresa, sou nascido na Alemanha ! E os alemãs têm os melhores poetas da historia. Goethe é o maior exemplo. A França tem muito ainda que aprender.
Teresa: - Eu não concordo com você, mas deixo esta discussão para outro dia. Hoje só quero curtir a brisa do mar.
Henry : - Eu queria lhe pedir desculpas por ter sido grosseiro quanto aos franceses. Meus pais são franceses porém nasci numa Alemanha dividida.
Teresa : - Meu amigo Henry, você não sabe o quanto estou feliz de estar aqui com você agora. Que se danem os autores franceses e viva a França ! Viva a vida ! Viva os alemães !
Henry : - Viva a vida ! ( brinda e toma uma taça de champanhe francesa ).

Os dois passeiam pelo cais e o marinheiro Henry mostra-lhe o seu barco transoceânico. Os dois entram no convés.

Henry: - Vamos tomar um café no convés ?
Teresa : - Com prazer !
Henry : - Você está gostando ? Vamos sentar !
Teresa : - É lindo... E você viaja nele o mundo todo ?
Henry : - Não... ainda não ! Falta uma companheira que queira compartilhar desta aventura inusitada. Um dia, quem sabe ! ?
Teresa : - Gostaria de ter coragem de navegar os sete mares !
Henry : - Você toma um café, um suco ou prefere uma bebida ?
Teresa : - Nem um nem outro, nem mesmo o café Henry. Muito obrigado, mas está na hora de ir. Tenho um encontro com a minha filha na vila e já estou atrasada. Nós nos encontramos um outro dia a qualquer hora. Até amanhã.

Teresa sai com certa pressa e mal se despede de Henry que ri com a
situação e o comportamento infantil de Teresa. No caminho ela encontra com Fidor, que começa acompanhá-la de longe. Ela fica assustada e corre até o Bardo. Pati e a banda não estão lá e o bar está fechado. Ela volta para casa apressada. Já é quase noite. Um medo pavoroso se apossa dela. Chegando em casa, corre até o carro e volta novamente para a vila, procurando Pati. Pára o carro em frente ao bar e espera assustada . Uma mão pega no seu ombro e ela grita de susto. É Miguel, que trás um recado de Pati. Miguel fala enquanto Fidor a observa de longe. Teresa arranca o carro e pega o caminho para o Rio de Janeiro.
O sol se põem no mar azul. Antes de escurecer totalmente Teresa passa por um carro conversível igual ao seu, dirigido por uma mulher que ela tem certeza - Antonella acompanhada pelo funcionário do livro José - Como um personagem de livro invade a vida real ? Vou acabar ficando louca se isto tudo não for esclarecido - Dizia ela a si mesma a todo instante, durante toda a viajem, como se não quisesse perder o raciocínio lógico da realidade.
Desesperada pelas alucinações e arrasada pela paranóia, ela, inconsciente do perigo, aumenta a velocidade e por pouco não derrapa e cai no mar. Com o susto, fica mais calma e segue o caminho para o Rio de Janeiro. É noite sem lua. Noite escura.



O sr. Ortega acompanhado pelo anão, seu inseparável amigo, e Cristina, entram no escritório e no gabinete da presidência da Firma. Lá estão Alex e Suzana.

Suzana : - Como vai Cristina ? (as duas se abraçam demoradamente)
Cristina : - Senti muito a sua falta Suzana. Vamos conversar. Mas peço que seja a sós. Eu e você, mais ninguém.

Todos se retiram da sala a mando das duas. Alex tenta ficar. Suzana faz cara feia e ele sai.

Cristina : - Suzana você não sabe o quanto eu sofri com estes mal entendidos.
Suzana : - Vamos esquecê-los e discutiremos o nosso futuro. Meu e seu, sem esses homens idiotas.
Cristina : - Suzana, eu amo o Jorge e você sabe disso. Além do mais, foi um pedido do Presidente para que eu ficasse com ele. Como vou me desfazer desta promessa ?


Teresa chega em seu apartamento do Rio de Janeiro. O porteiro responde a ela pelo interfone que seu marido não estava e se era para abrir a porta. Teresa diz que não é necessário e sai com o carro. Na cidade, passa pela porta do edifício sede da Firma e vê na esquina o carro de Jorge com ele ao volante. Ela freia o seu carro e fica vigiando como um policial. Em pouco tempo Cristina sai do prédio e entra no automóvel de Jorge. Teresa, descontrolada, sai atrás deles. Resolve na estrada mudar de rumo quando vê a placa indicando o caminho das praias, ao contrário do caminho da serra para onde o carro de Jorge segue. Na estrada vazia, nota um farol constante e imagina que está sendo seguida. Nervosa, pára no primeiro posto de gasolina que encontra. Desce do carro e vai até o bar, que está cheio de caminhoneiros. Senta-se numa mesa e pede um uísque. Um engraçado se aproxima, mas é interceptado pelo marinheiro Henry que se senta à mesa antes do intrometido e segura a mão de Teresa que, amedrontada, leva um susto.

Henry : - Você me desculpe mas não resisti à tentação de te seguir. Eu deveria ter insistido para você ficar lá no barco mas achei melhor não te segurar. Se soubesse o que se passava com você eu não a teria deixado. Não vou me perdoar jamais.
Teresa : - Eu te agradeço mais uma vez por ter me deixado ir, pois agora sei que destino vou dar à minha vida. Eu não posso acreditar que tudo isto está acontecendo ... Sinto-me perdida, descontrolada e fraca. Cansada, muito cansada...
Henry : - O que te aconteceu de tão ruim para você estar assim tão abatida, Teresa ? Não, não quero saber. Beba um pouquinho deste uísque que eu te levo de volta para casa.
Teresa : - Obrigado, Henry você apareceu na hora em que eu mais precisava de um amigo. Uma hora trágica da minha vida, de muita tristeza e dúvidas.

Teresa sai com Henry que dirige o seu carro. É noite alta.

Pati está preocupada e fica com Miguel na varanda da casa esperando notícias de sua mãe.



Numa clínica de cirurgia plástica está sendo feita uma operação. O médico desenrola o rosto coberto por ataduras do seu paciente. O médico entra com uma fisionomia extremamente preocupada com o resultado da operação. Ao seu lado, está uma mulher extremamente sedutora trajando uma roupa negra, cheia de bijuteria prateadas.

Médico : - Fique tranqüilo Adolfo que você a partir de hoje terá um novo rosto. E tenho certeza que deste você vai gostar.
Mulher : - É bom mesmo, doutor ! Pois do contrário o senhor vai se dar mal. Já é a décima operação e o senhor não acerta uma.
Médico : - Fica calmo, Adolfo que você já poderá se ver. Calma ... Pronto, ficou ótimo, esta um pouco inchado, são as cicatrizes e os pontos, mas em poucos dias, você terá uma cara que muitos poderiam desejar, mas só você, através da minha arte, poderá ter.

A mulher que acompanha Adolfo é a mesma que estava com em ele no armazém de Relampejo. Quando ela olha para Adolfo faz uma cara de espanto e não contém o riso. O médico tenta colocá-la para fora, mas Adolfo, nervoso, levanta-se empurra o médico com sua enorme mão e vai até o espelho e quando se olha faz uma cara de horror, tão feia, que Teresa abre os olhos assustada. Ela acorda quando o seu carro conversível chega em sua casa dirigido por Henry. Pati e Miguel correm ao seu encontro. Teresa ainda sonâmbula, sai do carro, olha para todos e, assustada, agradece a Henry.

Pati :- O que foi que aconteceu com você ? Nos deixou a todos preocupados. Papai telefonou te procurando e eu não sabia onde você estava, foi tudo muito constrangedor. Onde você estava ?
Teresa: - Fui até o Rio e voltei. Fiquei muito cansada e parei num posto de gasolina na estrada. Lá encontrei Henry, o marinheiro, a quem eu agradeço pela gentileza de me trazer até aqui. Esta é toda a estória. Agora se vocês me derem licença eu e minha filha vamos entrar e descansar o resto desta tumultuada noite. Muito obrigada a todos vocês. Boa noite.


Os dois policiais entram na delegacia de polícia de Relampejo.

Delegado : - Walter e Sherlock, foi muito bom vocês aparecerem. Até agora não me trouxeram nenhuma novidade dos desaparecidos e espero que esta longa viagem não tenha sido em vão. Vamos logo desembuchem !
Policial 1 : - Senhor, estamos trabalhando no caso. É muito complicada a origem e o fim do dinheiro da Igreja Reino Unido de Deus, mas trabalhamos e temos novidades, não é Walter ?
Policial 2 : - Sim delegado, pasme - O casal Weber foi assassinado num hotel de luxo na costa azul do estado do Rio, ninguém sabe, ninguém viu. Registraram-se no hotel com nomes falsos e para chegarmos até eles foi um trabalho difícil de investigação e paciência.
Delegado : - E quanto ao dinheiro que eles roubaram do cofre acharam alguma pista ?
Policial 2 : - Não. Quem os matou levou consigo tudo de valor que encontrou no quarto.
Policial 1 : - Elementar. Não é delegado ? ( esboça um sorriso )
Delegado : - E quanto ao Adolfo. Encontraram o corpo do rapaz ?
Policial 2 : - Ainda não. Não acredito em sua morte e acho, ou tenho um pressentimento, que ele está por trás de todos estes mistérios. Mas estou em seu encalço e se houver alguma novidade eu me comunico com os senhor.
Policial 1 : - Elementar, delegado.
Delegado : - Vão embora daqui e não me voltem sem o dinheiro do cofre ou com o caso todo esclarecido que o prefeito está me pressionando.

Os dois policiais saem da delegacia andando com passos largos e sorridentes cumprimentam as pessoas na rua.

Policial 1 : - Walter ! Você não está pensando no que eu estou pensando. Está ?
Policial 2 : - Sherlock, eu não penso, eu faço. Entre dividir com o delegado e o prefeito eu fico com Walter e Sherlock. Elementar.

Cristina está dirigindo o seu carro vermelho. Jorge está com ela. Eles descem a serra de Petrópolis. Avenida Brasil. Pobreza e muita miséria. O super carro de cor forte e brilhante passa por todas estas cenas urbanas, num contraste publicitário entre as duas formas plásticas - A cor e sua ausência - As curvas polidas e as retas mal traçadas - O negro asfalto e o sol nababesco - O calor e o ar condicionado - O bem e o mal - Cristina está tranqüila e Jorge tenso.

Jorge : - Cristina você não me contou tudo ainda sobre a conversa que você e Suzana tiveram. Eu volto ao gabinete da presidência como se nada tivesse acontecido...Encontro com Alex e nos cumprimentamos: - Bom dia ! - Bom dia ! Chega Suzana e eu lhe dou um beijo na face e ela retribui com um sorriso franco e aberto. Você não acha que está exagerando ?
Cristina : - É isso ! Vamos recomeçar tudo de novo. A Firma não pára, precisa de comando. Você assume, junto com Alex e eu e Suzana dividiremos o trabalho com vocês. Mas tem uma coisa que você tem de fazer antes que isso possa acontecer. Você tem de eliminar o negrão que fez aquilo com Suzana. Ela quer isso e me disse que o Tibetano contratado por Alex foi eliminado. Agora falta você dar esta prova de amizade e confiança a nós duas e à memória do Presidente. Eu te amo Jorge ! Faça isso pelo meu amor e por nossa felicidade.
Jorge : - É inacreditável como as coisas mudaram em muito pouco tempo. O Presidente morreu deixando de herança um rastro de horror. Mais uma morte ? Não ! Prefiro largar tudo.
Cristina : - Largar como Jorge ? Você não tem nada. Um amontoado de dívidas de empréstimo da Firma. Sem a Firma você perde tudo o que tem. E fracassado no cargo mais alto da administração privada, o que vai lhe sobrar ? Nada Jorge ! Você não sabe viver sem muito dinheiro. Acostumou-se mal e se não for rápido no gatilho vai acaba mal. Jorge, meu amor, você não tem saída. Sinto muito.


Teresa vai saindo de carro da garagem da casa quando encontra com Pati.

Pati : - Mãe ! Onde você está indo assim toda esporte ?
Teresa: - Vou dar um passeio. Pati, se o seu pai telefonar, diga a ele que eu ... ah ! deixa pra lá, não diga nada ! Até mais tarde, Pati.


Teresa passa de carro pelos bares que ficam perto da marina e em um deles, numa mesa sentado, está a figura bonita de Fidor. Ela passa e olha e ele faz o mesmo. Teresa deixa o carro no estacionamento e sai à procura de Henry. Ele está no barco preparando-se para o passeio.

Teresa : - Henry !
Henry : - Teresa !

Pati e Miguel estão sentados na varanda do BARDOETERNO onde dá para ver a baía.

Pati : - Estou muito preocupada com minha mãe. Ela não me contou o que aconteceu ontem à noite e nem o porque deste xodó com este Henry, um desconhecido já cheio de intimidade com ela. Meu pai viajando. Márcio nesta academia militar. Minha mãe está doente Miguel e eu aqui só, sem saber o que fazer ... Puxa, mas que férias de verão !
Miguel : - Deixa sua mãe em paz, Pati ! Olha lá na baía o iate do francês saindo ! É , não dá para ver, mais acho que sua mãe foi dar um passeio no mar.
Pati : - Não brinque, Miguel, ela não teria coragem.
Miguel : - Pense que ela é muito nova e pode encontrar um outro caminho para sua vida. Ontem estava triste. Hoje está alegre. Porque não pode passear, se divertir ? Fica o dia inteiro na varanda esperando o seu pai ou lendo aquele livro. Isto é vida ? Não vejo maldade no gesto do francês em levá-la a um passeio. Ela vai voltar outra, você vai ver. Hoje à noite vamos tocar aqui pela última vez e estamos já fechando um contrato para a próxima semana em outra praia. Você vem com a gente ?
Pati : - Eu não sei, tenho que pensar. Amanhã eu te dou uma resposta.

O Iate de Henry atravessa a barra e sai para o mar alto.

Teresa navega com Henry pelos mais belos lugares. Ilhas paradisíacas onde o mar se encontra com a floresta e a água doce da cachoeira vem num remanso se misturar com a água salgada do mar. Pôr-do-sol em alto
mar. Surge um clima romântico entre os dois. Teresa não consegue se entregar totalmente a Henry que mantém uma postura correta e respeitosa. Henry leva ao anoitecer o iate até uma ilha onde existe um restaurante e uma pousada para passarem a noite. Foi avisado pelo rádio de que se aproxima uma tempestade de verão e ele achou mais seguro ficar a noite ancorado e fora do barco.

É noite. Jorge chega em casa e as empregadas não sabem dizer onde todos estão. Com o rosto cansado e a fisionomia triste, ele sai de casa para procurá-los e vai até o BARDOETERNO e vê Miguel na porta. Pára o carro do seu lado.

Jorge : - Miguel, me dê notícias de minha filha e de minha mulher ?
Miguel : - Pati está para chegar, só foi até o armazém e volta já. Espere um pouco !
Jorge : - Não, vou dar uma volta para achar Teresa e vou até em casa. Pede para ela ir até lá que eu tenho de voltar hoje mesmo para a cidade, mas preciso falar com ela antes.

Pati chega com umas compras na mão.

Miguel : Pati, seu pai esteve aqui, chegou e te espera em casa. Esta procurando por Teresa e eu não disse nada. É melhor você inventar uma mentira do que contar a verdade.
Pati : - O que será que aconteceu ? Ela ia só dar um passeio, estou ficando preocupada. ( Neste momento chega um marinheiro que procura por Patrícia) Eu me chamo Patrícia o que aconteceu ?
Marinheiro : - Recebemos um rádio agora do iate do sr.Henry pedindo para avisá-la que, devido ao mal tempo, eles permanecerão ancorados até amanhã cedo e é para você não se preocupar.
Miguel : - Obrigado amigo. Eu te falei que estava tudo bem. Agora só falta inventar uma mentira para o seu pai.



Jorge está na varanda da casa e bebe compulsivamente. Está meio alto quando Pati chega em casa.


O iate está ancorado. O céu está relampejando. Na pousada, rústica mais confortável, Henry e Teresa estão sentados na varanda. Tomam um drinque enquanto esperam o jantar a luz de vela.

Henry : - Teresa você é uma mulher muito jovem e bonita para ter uma filha da idade da Patrícia. Neste pouco tempo que lhe conheço passei a lhe admirar com tanto carinho e respeito que me sinto próximo a um grande acontecimento. Quem sabe um novo amor ?
Teresa : - Você é muito gentil Henry e eu fico envaidecida com suas palavras. Mas agora me fale um pouco de você.
Henry : - De mim ? Quem sou eu. Não passo de um navegador solitário para quem o viver não é passado, é preciso. E você me trouxe de volta uma pessoa a quem amei muito quando só vivia para navegar e para amar.
Teresa : - Mas quem foi esta escolhida e o que aconteceu com ela ?
Henry : - Minha mulher. Saiu para navegar com o nosso filho e nunca mais a vi. Dizem que o barco foi colhido por uma onda gigantesca e naufragou. Eu acho que ela fugiu e até hoje procuro pelos dois, onde quer que eu esteja. Hoje foi o único dia em que não pensei nos dois. Talvez a sua presença tenha me feito esquecê-los.
Teresa : - Eu te lembro a tua mulher, Henry ?
Henry : - Muito mesmo. É como se fosse ...

Teresa não deixa ele terminar o que tinha para dizer e lhe dá um demorado beijo na boca. Henry corresponde e os dois saem abraçados, entrando na pousada. No quarto fazem amor.


Pati, que tinha entrado em casa escondida do pai, volta e se aproxima dele na varanda.

Jorge : - Pati, minha filha, que bom que vocês chegaram. Onde está sua mãe Teresa ?
Pati : - Calma pai, ela foi para o Rio de Janeiro e vocês devem ter se desencontrado no caminho. Vamos dormir que amanhã tudo se explica.
Jorge (assustado) : - Mas o que ela foi fazer na cidade ?
Pati : - Eu não sei ! Ela não quis me falar. Mas seria bom você ficar esta semana por aqui por que eu acho que minha mãe não está nada bem de saúde.
Jorge : - Não posso. Tenho que voltar hoje mesmo. Mas gostaria de falar com Teresa antes de ir... ( Jorge abre a boca num bocejo. Pati abraça o pai e os dois entram em casa).
Pati : - Vamos pai, eu te levo para cama e amanhã você resolve o que fazer.


Adolfo está se olhando no espelho ao lado de sua mulher.

Mulher : - Adolfo, meu querido, você até que não ficou feio, me lembra alguém que eu conheço ... uma pessoa que foi muito famosa ...
Adolfo : - Olha aqui, sua ignorante, se você lembrar de alguma coisa que eu quero esquecer você vai acabar como este outro analfabeto que se esqueceu de sua profissão.

O médico que operou e cuidava de Adolfo está enforcado em sua própria gravata presa com um bisturi fincado na parede. A mulher de preto passa olhando no espelho um batom vermelho. Adolfo pega o batom e antes de sair do consultório escreve na parede:
“THE TIGERS OF WRATH ARE WISER THAN THE HORSES OF INSTRUCTION“


O sol rompe o horizonte por trás do cais onde o iate está ancorado.
O dia amanhece sem uma nuvem no céu. O mar e o ar estão azuis com tamanha luz.
No chalé Teresa, que esta deitada, acorda quando um raio de sol ilumina o seu rosto.
Henry esta de pé, vestido e de banho tomado. Na mesa, um suculento e colorido, por várias frutas, café da manhã. Um verdadeiro “breakfast”.

Henry : - Bom dia, Teresa !
Teresa : Bom dia ? Lindo dia ! Me sinto muito bem. Não choveu e o sol deixa tudo azul e eu amo o azul. É minha cor predileta. Venha se sentar ! Você deu uma boa desculpa pelo rádio ao dizer que haveria uma tempestade no nosso caminho e que por isso estaríamos preso aqui nesta ilha paradisíaca ... por quantos dias mesmo ?
Henry : - Deixa-me adivinhar ? Por toda a vida !
Teresa ( sorri e logo em seguida fecha o rosto} : - Era só o que eu queria. Mas tenho muitas coisas para resolver e eu te pediria Henry que me levasse de volta ao continente, à realidade. Sinto que é preciso ir o mais rápido possível, estou preocupada com Pati. Você não fica chateado comigo Henry ?
Henry : - Teresa, o seu pedido é uma ordem para um velho marujo. Portanto e por pouco - levantemos ancora ! (Os dois sorriem e se dão a mão)

O iate corta a água azul da costa brasileira.

Na casa de Teresa, Jorge já esta acordado e toma o café da manhã quando Pati senta-se à mesa. Ele está com o telefone celular na mão e com uma cara não muito boa.

Jorge : - Tentei falar varias vezes lá em casa com Teresa e ninguém atende o telefone. Tudo isso esta muito misterioso e tenho que viajar daqui a pouco. Você tem certeza que ela foi para cidade ?
Pati : - Pai, eu me desencontrei dela neste dia. Ela saiu apressada. Eu imaginei que ela fosse encontrar com você na cidade. Mas se você quiser esperar ela deve estar chegando daqui a pouco.
Jorge: - O que lhe dá tamanha certeza ?

Uma empregada chega com uma garrafa de cerveja super gelada para ele.

Pati : - Cerveja de manhã pai ?
Jorge : - Nada melhor para acordar da ressaca de ontem à noite. Você já está indo para a praia ?
Pati : - Sim, eu ando de manhã para manter a forma. Volto mais tarde. Não vai embora antes que minha mãe chegue. Ela está precisando de você pai. Um beijo.

Jorge tenta ligar mais uma vez o telefone e não conseguindo arruma algumas coisas na pasta preta e deixa um bilhete para a empregada
entregar a Teresa assim que ela aparecer. Fecha a mala, olha para casa e sai. Entra no seu carro esporte. Ao sair, passa por Fidor que está andando pela redondeza de bicicleta. Jorge não vê mais nada e dirige perigosamente pelas estradas que cortam as montanhas que invadem o mar. Num determinado trecho da estrada, pode se avistar a marina onde o iate de Henry esta atracando. O carro de Jorge passa rápido pela cena.

Teresa despede-se de Henry, vem caminhando pelo cais e, de repente, do nada, surge Antonella, caminhando em sentido contrário. Teresa fica assustada e olha para o chão aumentando os passos num andar mais rápido passa pela figura assombrosa, fantasmagórica, e entra no seu carro. Dentro do carro sentada está Pati. Teresa leva um susto danado com a filha.

Pati : - Mãe ! Onde a senhora foi ? Passeou esse tempo todo ? Porque demorou tanto a voltar ? Meu pai esteve aqui e eu tive que mentir. ( Começa a chorar). Ele desconfiou de mim e de sua ausência. Precisava ter feito isso com ele ? Às vezes acho que você perdeu a razão e o bom senso. ( sai do carro batendo a porta ).

Teresa ( pensando ) : - Patrícia minha filha, não se machuque sem necessidade, o que você quer saber que já não sabe ? Tudo tem a sua hora e a sua vez. Quanto ao seu pai .. Que me espere um pouco mais... ( arranca com o carro ).



Jorge chega à cidade do Rio de Janeiro e vai direto ao prédio da Firma. Estaciona o carro na porta de qualquer maneira e entra no prédio disposto a qualquer situação. Está resoluto de seus propósitos. Entra no grande hall principal e sobe com várias pessoas no elevador. A situação é constrangedora. O Elevador segue direto ao andar da Presidência. Jorge sai, passa pelas secretárias e entra no gabinete. Sentada na mesa do presidente está Cristina e, à sua frente, está Suzana.

Cristina : - O que foi Jorge ? Viu alguma assombração ?
Jorge : - Não, Cristina, estou vendo ela agora.
Suzana : - Não vá dizer que sou eu ... ?
Jorge : - Suzana você sabe muito bem que esta sua beleza angelical é só uma casca fina que cobre a sua verdadeira identidade. Portanto não venha com gracejos e pieguices que já conheço todas. Não tenho nenhum interesse nas suas ações e creio poder administrar a Firma sem elas. Estou vindo aqui para comunicar-lhes que assumo a Presidência hoje, conforme documentos que já foram entregues aos meus advogados. Com este mandato em mãos, amanhã convoco uma reunião de diretoria e com todos os direitos que me foram dados pelo Presidente e pelo Juiz, assumo o posto que me foi outorgado pelo seu pai. Tenham todas duas um belo dia. ( Sai pela porta entreaberta ).
Cristina ( atônita ) : - Jorge ! Jorge ! ( sai atrás dele )


A polícia chega ao consultório médico do cirurgião plástico. Dois cadáveres : o médico enforcado e a enfermeira degolada. Na sala suja, já se encontram os dois policiais de Relampejo. O Policial 1 vai abrir a porta onde há alguém batendo.

Policial 1 : - Walter sabe quem são ? Os detetives da igreja. O Soares e o Leite. Deixa eles entrarem ?

Os dois detetives empurram a porta e mesmo antes da resposta do policial 2 eles já estão lá dentro mexendo em tudo.

Policial 2 : - Pode sim Sherlock ! Eles são duas bestas que não sabem nada e vivem no nosso rastro.
Detetive 1 : - Olha aqui, seu caipira, eu te meto a mão na cara se você me chamar de besta novamente.
Policial 1 : - E eu te dou um tiro no rosto se você não tirar a mão do meu companheiro.
Detetive 2 : - Olha aqui vocês dois não me encham o saco e vamos trabalhar.
Policial 2 : - Sherlock ! Vamos embora já tenho os resultados que preciso para exame.
Policial 1 : - Elementar, meu caro Walter. ( Os dois saem, fecham a porta e apagam as luzes ).
Detetive 1 : - Eu ainda dou uma porrada nestes dois palhaços.



Teresa está em casa com o livro de Antonella na mão. Vai até a varanda e começa a leitura novamente. Neste momento passa na rua um rapaz moreno, de óculos, pedalando uma bicicleta. Teresa fica desnorteada e entra correndo para dentro de casa e como vivendo um filme de terror fecha toda as janelas e portas. As empregadas, assustadas com o comportamento de Teresa, se fecham na cozinha e telefonam para polícia. Teresa está em pânico incontrolável.



Nas ruas da cidade Jorge procura pelo Negrão. Um dançarino de rap num bairro afastado mostra a casa onde ele fica com a família. Jorge desce do carro e bate na porta que está aberta. Entra e quando chega na sala fica enjoado e sai para vomitar. Na porta está um senhor mais velho, negro, fumando um cachimbo.

Preto velho : - Nós já estamos acostumados com isso aqui. Todo dia morre um. Hoje foi a família inteira. Uma barbaridade. Ninguém olha mais para os miseráveis.

Jorge entra no carro e arranca com velocidade.


Adolfo e a mulher vestida de negro estão viajando de carro pelas estradas que vão dar no balneário onde todos estão. Ao chegar na vila vão direto para a marina e lá são recebidos por Henry.

Henry : - É um prazer sr. Adolfo recebê-lo no meu barco e gostaria que o senhor se sentisse à vontade. Tenho ordens para tratá-lo com todas as gentilezas que um homem de sua importância merece. Sou alemão de origem e sempre fui seu admirador.
Adolfo : - Não seja precipitado com sua ideologias, que a cidade está cheia de policiais à paisana e estão a minha procura. Devo receber aqui à noite a visita do Dr. Zara, e do senhor Jorge. Não quero que nada estrague esta noite. Estamos entendidos ? Agora pode ir cuidar dos seus afazeres e não me perturbe até as 7.00 horas quando quero o jantar servido. Pode ir.


Rio de Janeiro. Centro da cidade. Porta do prédio da Firma. Alex sai, acompanhado de Suzana.

Suzana : - Alex, eu tenho de ir ao encontro de Cristina que está me esperando. Pegue o seu carro na garagem e me espere em casa que vamos sair para jantar. Espero que tudo esteja resolvido e possamos comemorar.
Alex : - Suzana, você pode aceitar tudo o que Cristina propuser, menos o Jorge na presidência. Isto é inaceitável. Uma diretoria é passível de estudo. Está bem ? Não me faça esperar muito.
Suzana : - Fique calmo, que tudo vai dar certo. Um beijo.


Alex despede-se de Suzana e entra na garagem do prédio. No subsolo
ele se encontra com o Sr. Ortega que praticamente o obriga a entrar na limusine da Firma. No banco de trás está o anão, fumando um grande charuto tendo na mão um grande revólver.

Anão : - Como vai, senhor Alex ? Temos uma longa viagem a fazer e se o cheiro do charuto lhe incomodar é só pedir que eu apago. Afinal, o senhor é o presidente da empresa onde eu trabalho.
Alex : - Muito bem planejado este seqüestro, senhor Ortega. Mas creio que sua ação deveria ser dirigida a outra pessoa, vocês dois se enganaram, a minha ordem era de seqüestrar o Jorge e não a mim ! O que a Suzana sabe disso ? ...

A limusine sai da garagem e avança até a rua. Alex no banco de trás vê, pelo vidro escuro a figura de Suzana que está parada e olhando para o carro. Suzana vira-se e sai andando em direção contrária. Dos seus olhos corre uma lágrima. Alex fica desesperado dentro do carro e só é contido quando o anão lhe acerta dois tiros. Um na barriga e outro na cabeça.


Em casa, Teresa está excitada e anda de um lado para o outro da sala à espera da polícia. Só fica mais tranqüila quando pega no livro e senta-se para ler.

Teresa ( pensando ) : - Eu não deveria mais ler este livro. Estou me influenciando pelos acontecimentos nele descritos, mas, quem sabe, no final esteja a solução de tudo. Não há magia que dure para sempre e nem realidade que nunca se acabe. E não acredito em fantasmas.


Na delegacia de polícia de Relampejo, estão os dois policiais e o delegado.

Policial 1 : - Walter tem um telefone te chamando em sua mesa.
Policial 2 : - Quem é ?
Policial 1 : - Não se identificou.
Policial 2 : - Alô, quem fala ? ... Sim, é ele mesmo. Pode falar. Como você sabe disso ? ... ( O policial 1 pega o telefone na extensão. O delegado se aproxima ) ... Estou te ouvindo, pode falar. Não, não quero te comprometer. Está certo. Estou ouvindo. Não me leve a mal - me dê o seu nome ! Temos de ter certeza da informação. Estou sozinho ... Estou ouvindo. Como você sabe que é ele ? É claro que chega e lhe agradeço. Você vai ligar novamente ? ...
Alô ! Alô ! Não é que ele desligou ? Eu já ouvi esta voz ...
Policial 1 : - Eu também !
Delegado : - Vocês dois podem me dizer o que está acontecendo ?
Policial 2 : - Chefe ! Um sujeito me telefonou dizendo ter visto Adolfo Weber numa cidade de praia que fica perto do Rio de Janeiro e que está de rosto mudado, usando um bigodinho e que prepara um plano para fugir do Brasil, mas antes vai assassinar mais pessoas. E me disse também que foi Adolfo que matou os própios pais para pegar o ouro da igreja que o pai havia roubado e escondido.
Delegado : - Tudo parece encaixar direito. O que estão esperando para iniciar a investigação ? Saiam imediatamente e capturem os suspeitos trazendo-os vivos se possível, para a nossa delegacia. Vamos ! Andando !


O funcionário falante, José, sai de uma cabine telefônica e abraça Antonella que está aflita para saber o que foi conversado. Eles estão perto do caís.

Antonella : - Me fale José, como eles receberam o seu recado ?
José : - Muito bem e creio que em pouco tempo eles estarão aqui.
Antonella : - Só os dois policiais de Relampejo podem pôr fim a esta estória.
José : - Não se preocupe meu amor , o reinado de Adolfo está no fim.


Adolfo no camarote mira-se num espelho e faz poses que trazem à lembrança alguns famosos personagens da história. Ao fundo, deitada na cama redonda, fantasiada de rainha de Sabah, está a sua exótica acompanhante.

Adolfo : - Este mundo é meu ! ( Repete a cada personagem ).


Suzana encontra-se com Cristina para um jantar, num restaurante afastado.

Suzana : - Cristina ! Aconteceu uma tragédia. Tomei uma decisão que não sei que repercussão vai dar.
Cristina : - O que foi Suzana ? O que aconteceu ? Vamos, sente-se, me conta !
Suzana : - O Alex tinha me batido e queria me matar... Chamei o senhor Ortega para dar um jeito naquela situação. Era só para dar uma surra nele e falar que eu queria a separação e que ele receberia uma boa indenização se deixasse tudo correr em paz. Eu já tinha dito isso a ele e ele tinha concordado Contanto que não fosse o Jorge o presidente da Firma, ele aceitava qualquer coisa. Eu pensava conversar com você a respeito disso quando recebo do senhor Ortega a notícia de que Alex tinha morrido e que o seu corpo já havia sido incinerado e que poderia ficar tranqüila, que estava tudo no seu controle, nos seus lugares. Cristina ! Eu estou morta de medo. Coitado do Alex. (Ele nunca vai me perdoar - morto não perdoa ). Ai! como eu fiquei triste. Eu não sabia que o amava tanto. Estou apavorada Cristina ! Só achei uma saída - Vamos viajar, nós duas, pelo mundo, até tudo ficar mais calmo. O que você acha ? Por favor, me ajude.
Cristina : - Oh, Suzana ! Você sabe que eu não deixo nada acontecer com você. Nada mesmo. Vamos ficar calmas e pensar em todas as saídas. Garçom, traga uma dose dupla de uísque para mim e outro para a minha amiga. Olha, o senhor Ortega é um matador profissional e todo serviço dele é bem feito. Não deixa pistas. Seu pai, o Presidente, tinha toda confiança nele. Vamos deixar a poeira abaixar. Quando você sentir falta do Alex, daqui a uns três dias, nós damos queixa na polícia. Faremos eles acreditarem em seqüestro, sem resgate. Alex não mais existe e você tem que conviver com esta realidade. Com o tempo você vai saber que assim foi melhor. Venha cá e me dê um beijo. Nós duas vamos ser felizes é só ter paciência e dar tempo ao tempo.


Jorge entra com o carro no sub solo da garagem da Firma. Quando vai descer encontra-se com o senhor Ortega e o anão.

Sr. Ortega : - Senhor Jorge, como vai ?
Jorge : - Eu vou bem e você, senhor Ortega ?
Anão : - Estamos indo muito bem, Jorge.
Jorge : - Ora ! O tira-gosto fala também ?
Sr. Ortega: - Sr. Jorge ! Ele não gosta deste apelido e o senhor sabe que se irritado ninguém consegue segurá-lo.
Jorge : - Pra que segurá-lo se posso engoli-lo com um bom copo de cerveja ?
Anão : - O presidente é muito brincalhão, deixa que ele se divirta às minhas custas, senhor Ortega. Sou um anormal que não me irrito com quem me paga. E não quero piedade comigo. Vamos embora !

O senhor Ortega e o anão voltam para a limusine que está sendo lavada. Jogam uma água no banco de trás e Jorge, antes de tomar o elevador, pode notar a cor vermelha da água que corre para o ralo. A porta se fecha do elevador.

Anão : - Eu ainda acabo com este advogado é só a dona Cristina mandar que ele pode pedir contas a Deus.
Sr. Ortega : - Meu querido, cada coisa tem o seu tempo e sua hora. Não se põem todos os ovos numa mesma cesta.

Jorge entra no escritório da presidência e pergunta para secretária:

Jorge : - O que aconteceu aqui hoje ? Onde está Suzana ? Onde está Cristina ? Nem o Alex apareceu ? É ! Estamos indo muito bem. Onde todos foram parar ? ( Entra para o gabinete ) (Para a secretária ) Me telefone para Cristina. Encontre-a de qualquer maneira.


Os carros da polícia chegam à casa toda fechada de Teresa. O policial 1 desce de um dos carros e chama por Teresa. Teresa olha pela janela. Quando vê lá fora o policial e ao seu lado, chegando de bicicleta, Fidor, ela fica desorientada. E mais desesperada ainda fica quando as empregadas abrem a porta para os policiais. O Policial e Fidor entram na casa. Teresa se esconde no banheiro. Fidor, com jeito, consegue conversar com ela.

Fidor ( O rapaz moreno e de óculos ) : - Teresa por que se esconde ? Eu não vou machucá-la. Nós precisamos saber o que aconteceu aqui nesta casa. Você não vai se esconder o dia todo, vai ?
Teresa : - Vai embora Fidor. Você não existe é só um personagem de livro que eu trouxe para o mundo real. Vai embora e me deixa em paz, eu prometo jogar o livro fora. Nunca mais leio a estória de Antonella. Eu prometo. Agora vão embora todos vocês ! Por favor, me deixem em paz
Policial 1 : - O que ela quer dizer com o livro de Antonella ? Onde está este livro ?
A empregada : - Eu não sei não, doutor. Ela andava lendo um livro grande de capa dourada, não se separava dele. ( O seu médico o Dr. Zara entra na sala ).
Dr. Zara : - O que está acontecendo aqui ? Onde estão Jorge e Teresa ? Preciso falar com os dois.
Empregada : - O doutor Jorge está viajando e Teresa está trancada no banheiro da sala.
Dr. Zara : - Teresa ! Saia logo daí, é o Dr. Zara que está aqui. Não seja criança. Venha já para fora que tenho que lhe falar do seu filho Márcio.

Teresa abre a porta e quando vê seu analista corre e chora nos seu braços.
Os policiais e Fidor saem da casa a pedido do Dr. Zara.

Dr. Zara : - O que ouve Teresa ? Você nunca mais foi ao meu consultório e só tenho notícias suas pelo seu filho Márcio.
Teresa : - Que bom ! Tenho precisado muito do senhor. Ando tendo alucinações e acho que estou ficando maluca. Tenho me alimentado, mas ando muito fraca só quero e penso em dormir e quando fico acordada a única coisa que me deixa relaxada é a leitura deste livro ... e é nele que eu vivencio os personagens que tanto me amedrontam. É tudo tão real que juro que todos que aqui estão fazem parte de sua trama.
Dr. Zara : - Teresa você está num processo de paranóia depressiva com uma forte tendência à perseguição e isso você sabe que pode te levar até ao suicídio. Eu gosto de ser franco e acho que o Jorge deveria estar aqui para cuidar de você. A solidão na certa não é uma boa terapia para o seu caso. Agora vá deitar, que vou lhe receitar uns comprimidos para lhe tirar de uma só vez deste romance de fantasmas e assombrações e limpar com um bom sono a sua mente cansada. Outra coisa - Pare imediatamente de ler este livro dos diabos. Mandarei alguma leitura mais civilizada para seu lazer - Que tal Fausto, de Goethe? Ali você pode encontrar os verdadeiros fantasmas da humanidade. Se o Jorge aparecer peça para ele me encontrar no barco do Sr Henry. Você tem que se divertir mais, Teresa, andar na praia, esta é uma boa terapia de recuperação. Diga ao Jorge que estamos todos esperando por ele. Até mais tarde e fique tranqüila que ninguém virá perturbá-la. ( O Dr. Zara sai do quarto acompanhado por uma empregada ).


No Hotel da cidade se encontram os três personagens do livro de Antonella.

Antonella : - Acaba de me contar como foi seu encontro com Teresa.
Fidor : - Depois de me ver, Teresa entrou em pânico e chamou a polícia. Aproveitei que a porta da casa foi aberta e entrei com os policiais. A coitada estava trancada no banheiro, eu me penalizei e quase disse quem em verdade eu era mas me contive. Ela falava de nossa peça que apresentamos há muito tempo no teatro dos sete. Vocês se lembram do diário de Antonella e sua estórias de amor ? Hoje eu consegui me encontrar com Teresa ainda viva e acho que ela não agüenta mais muitos dias da pressão psicológica a que a estamos submetendo. Um tal Dr. Zara está tratando dela.
José : - Olha aqui, eu acho que chegamos longe demais com esta representação e se não pararmos agora esta mulher pode enlouquecer e seremos culpados. Eu não fiz acordo de matar ninguém. Simplesmente trabalho como ator numa farsa para assustar uma pessoa e acho que já fizemos nosso papel.
Antonella : - Se não chegarmos ao fim, não receberemos o cachê prometido ! Lembrem-se de que é um bom dinheiro e estamos duros. Não estamos fazendo nada que possa nos comprometer, só andamos pela cidade e dizemos que somos o que não somos, não é esse o maior desafio para um ator ?
Fidor : - E, além do dinheiro, temos carro conversível, o melhor hotel, a melhor comida, a melhor bebida, todas as mordomias que não temos em São Paulo. Eu vou até o fim, mas sem exageros.
José : - E quando saberemos o final desta tragédia ?
Antonella : - Quando a mulher nos telefonar do Rio dizendo aonde será depositado o nosso gordo cheque. É a deixa para irmos embora que o plano se fechou.
José : - Mas quem é esta mulher, tão poderosa ?
Antonella : - Se soubesse não lhe contaria. Meus amigos, estamos aqui a nos divertir, com tudo pago, só para termos uns nomes estranhos de batismo e algumas estórias mal contadas de uma cidade perdida chamada Relampejo. Nunca vi texto mais fácil.
Fidor : - Mas não foi isso que aconteceu quando eu a vi. Se não fosse o médico chegar, ela teria morrido do coração. Eu fiquei tão preocupado que nem confirmei para ela que era o Fidor que ali estava, como foi o combinado. Vou te dizer: Me penalizei com seu estado. Não estou dizendo o que é melhor parar esta farsa, mas vamos embromar e evitar o confronto com Teresa antes que seja tarde demais.


Jorge está mexendo em todas as gavetas e nos armários do gabinete da presidência. Cristina entra na sala acompanhada por Suzana.

Cristina : - Está procurando por mim Jorge ?
Jorge(assustado): - Vocês me assustaram. Estou procurando pela autorização do Presidente investindo cinco milhões de dólares na Igreja do Reino Unido de Deus. Eu estou autorizado por ele a levar esta quantia ao Sr.Henry, que por sua vez, a entregará ao Bispo que se encontra no exterior. Isto tinha de estar na mão do Bispo há mais tempo, e não pode passar de hoje, pois o navio estará zarpando amanhã e o Dr. Zara deverá embarcar nele. Tudo está pronto, o barco que vai transportá-los, os seguranças, as passagens, tudo, até onde vai se esconder o dinheiro. Se não for feito, os nossos negócios lá fora irão mal e pode provocar uma tal reação em cadeia que nada vai conseguir segurar a explosão. Portanto, senhoras, onde está este papel ?
Cristina ( tirando um papel do bolso ) : - Será, por acaso, este aqui ?

Jorge fica aliviado e senta-se na cadeira do presidente.

Suzana : - Eu lhe pediria, Jorge, que se levantasse daí imediatamente. Este não é mais o seu lugar.
Jorge(levantando-se) : - Nunca foi. Pretendo presenteá-lo ao Alex e com papel passado. Estou com planos para sair deste país e viver do meu trabalho numa nação mais desenvolvida, portanto mais corrupta e mais inteligente em sua missão escravagista. Quero ir para os Estados Unidos da América, berço do capitalismo, centro do mundo, para o império do norte, para a matriz e esquecer a filial. Desejo de todos nós brasileiros desiludidos.
Cristina : - É uma boa idéia, Jorge, principalmente tendo esta quantia na mão.
Jorge : - Ora Cristina ! Como eu vou fazer tal aventura se nem atirar sei direito ? Não consigo brigar com um, quanto mais com três homens fortes e resolutos de suas obrigações. Você deve estar ficando louca.
Cristina : - Não é isso, Jorge. Eu e Suzana concordamos em lhe dar o dinheiro e acreditamos que não seremos tapeadas pois é do seu interesse que estes dólares cheguem lá fora também. Portanto, aqui estão os cinco milhões em carta de crédito. É só levar ao destino e voltar aqui ao escritório para que tudo possa ser resolvido. Agora me espere ali fora que tenho que conversar com você.

Jorge pega o papel com Cristina e sai desconfiado do gabinete da presidência. A secretária fecha a porta e ele, ainda pensando no acontecido, se assusta quando se vê cara a cara com o senhor Ortega e seu amigo o anão.

Jorge : - Vocês estão me seguindo ou eu devo pedir proteção ?
O anão : - Sr. Jorge, o ano é dividido em quatro estações e nós ainda estamos no verão.
Jorge : - Mas vejam como o tira-gosto mudou, agora além de falar, se dá ao luxo de criar metáforas. Êta país de gênios !

Andando perto da casa de Teresa, pela praia, vem o marinheiro Henry. Apressado sobe as escadas que o leva à sua da amada. Ao chegar ao alto, em frente da casa, encontra Teresa, ainda convalescente, tomando um pouco de sol na varanda.

Henry : - Teresa ! O que foi que aconteceu ? Achei que tinha me esquecido. Quando soube que você estava doente e acamada, vim o mais depressa que pude. Não me olhe assim com estes olhos marejados de tristeza e dor ! Peça-me o sol que lhe trarei juntamente com a lua, se isso lhe fizer sorrir. Ah ! assim é melhor. Me diga o que guarda dentro deste coração ? Não ! Não fale. Não se esforce demais por coisas que não trazem alegrias, não enriquecem a vida e nem são tão importantes assim que um passeio, sem volta, pelo mar azul caribenho, não as deixem esquecidas. Estou programando uma viagem pelo norte do Brasil até as Antilhas e quero você comigo. Não aceito desculpas. Venho pegá-la viajar amanhã. Lá chegando, toda dor, todo sofrimento, toda angustia se esvairá e, se você quiser, compro a mais bela casa de Guadalupe, que é uma ilha de Barlavento, no verde mar do Caribe e seremos felizes por toda a vida. Não diga não, não me deixe sozinho. Sofro demais longe do seu carinho - já dizia o samba-canção e se você ficar feliz, e isto a sarar, eu lhe trago um cancioneiro para cantar as mais lindas canções de amor em serenata. Em cada noite que passarmos juntos eu te acordarei com o quarto repleto de flores de todas as espécimes e de todas as fragrâncias. Assim está melhor. Agora vamos sorrir e espantar estes fantasmas. Eu te amo Teresa. Não consigo viver sem você.

Patrícia vem chegando e encontra os dois de mãos dadas. Fica com raiva e entra batendo a porta.

Henry : - Eu saio hoje constrangido por fomentar a discórdia na família, mas volto amanhã e venho para pegá-la. Você sabe, tanto quanto eu, que não podemos ficar longe um do outro. Nós somos o novo e o que é novo assusta até o mais novo. Nada pode impedir um novo amor. Um amor puro e cristalino, sem fronteiras, onde não há os limites do tempo e do espaço.
Um mundo de fantasias, só para nós e um só desejo - viajar - viajar ! Não ! não fale nada agora, você tem até amanhã para decidir a sua felicidade.

Henry beija Teresa demoradamente e sai correndo como uma criança. Pati está na sala de vidro e vê toda a cena de amor, fica enfurecida e arruma as malas no seu quarto para viajar com Miguel. Teresa entra no quarto.

Teresa : - Pati,minha filha ! Eu sei o quanto é penoso para você presenciar a separação de uma família. E foi isso que aconteceu. O seu pai distante me fez ver a infelicidade em que vivíamos e ele mesmo sabe disso. Não queira mal à sua mãe, só porque ela quer alguns minutos de sonho e de felicidade. Se você quer ir com Miguel não se prenda, vá ! Mas não me prenda numa gaiola de ouro como um animal de estimação. Deixe a sua mãe ser feliz e assim toda a nossa família será abençoada por ter, no momento mais difícil, optado pela fantasia, pela felicidade e pelo amor.

Pati vai correndo para os braços da mãe, se abraçam nervosas, choram e riem, num momento de grande emoção.


O Dr. Zara chega no seu carro ao cais. Caminha lentamente até o iate ancorado onde está o marinheiro Henry.

Henry: - Mas que prazer Dr. Zara. O senhor chegou mais cedo que o previsto.
Dr. Zara : - Meu jovem marinheiro Henry é sempre um prazer estar com você e seu jeito delicado e nobre de receber uma visita. Agora, me diga onde está metido o Adolfo ?

Adolfo surge se arrumando e o bigode que estava torto em sua cara amassada de tanto dormir cai no chão. Ele tenta apanhá-lo e sem jeito desiste e perfila-se em frente do Dr. Zara.

Dr. Zara : - À vontade Adolfo. Onde está Sabrina, minha mulher ?
Sabrina (chegando) : - Estou aqui general !
Dr. Zara : - Já lhe disse para não me chamar assim. Adolfo !
Adolfo : - Sim ! meu líder !
Dr. Zara : - Leve esta mulher para dentro. Ela consegue me irritar só com o seu tom de voz. Se não fosse a irmã do venerado Bispo eu não sei o que faria. Henry, meu caro, abusando de sua generosidade, poderia me servir uma champanhe no camarote dela ? Tenho que fazer este sacrifício...
Adolfo ( na proa do iate rígido como uma pedra ) : - Eu não suporto que me tratem assim. Tenho ódio deste jeito delicado e cheio de gentilezas que nosso líder tem com este francês maricas. Se soubesse navegar, acabaria com ele de uma só vez.
Henry ( com a garrafa de champanhe no gelo ) : - O Dr. Zara pediu para você levar este champanhe no seu camarote.
Adolfo ( pegando a bandeja ) : - Um dia ainda mato você sua bicha !

Henry sai rindo e gesticula, pelas costas, uma banana para Adolfo.


Pati se despede da mãe que fica na varanda acenando. Sente-se mal e encosta-se na cadeira e com muito custo caminha para dentro de casa com ajuda de uma empregada.

Empregada : - Dona Teresa, a senhora está muito pálida e eu acho melhor chamar um médico e também o Dr. Jorge...
Teresa : - Não é preciso, daqui a pouco passa e por favor não fale nada para o Jorge, se eu piorar chame um médico ou vá até o cais e fale para o marinheiro Henry. Ele saberá o que fazer. É isso. Pode me deixar, estou melhor. Por favor me dê aquele livro que está na mesa, que eu vou me deitar um pouco.



Os dois policiais de Relampejo chegam num carro de polícia na cidade e se encontram com os dois detetives que caminham no caís.

Policial 1 : - Walter ! olha quem está ali !
Policial 2 : - São eles ! Não tenho mais dúvida agora !
Policial 1 : - Elementar meu caro Walter ! São eles mesmo, é claro !
Policial 2 : - Não é isso Sherlock ! São eles os assassinos do casal Weber !
Policial 1 : - Como, Walter ?
Policial 2 : - A mim você não come não, Sherlock. É um sucesso a minha investigação ! Mais algumas poucas horas terei tudo resolvido e poderemos prender os culpados.
Policial 1 : - Elementar, meu caro Walter !

Os dois detetives vêem os dois policiais passarem no carro da polícia.


Det. Leite : - Não é possível ! Estes dois novamente. Desta vez eu não vou suportar as suas presenças. Vou ter que acabar com eles.
Det. Osmar : - Acho que estão nos seguindo... eles desconfiam de algo e sabemos o que eles querem ... Estes caipiras não podem ser levados a sério.
Det. Leite : - Vamos acabar com eles, Osmar !



Cristina sai do gabinete da presidência e encontra a sala vazia. A secretária aponta para a porta do elevador. Cristina entra pela porta aberta. Jorge está lá dentro e abraça Cristina. Cristina se afasta e não deixa Jorge abraçá-la

Cristina : - O que é isso, Jorge ? Você enlouqueceu ?
Jorge : - Não ! Estava só imaginando que podíamos ir juntos para a matriz. Nova York. Não foi de lá que você veio para enlouquecer a minha vida ?
Cristina : - Não seja criança, Jorge ! Você não é um romântico e não tenho tempo para brincadeiras e nem você.
Jorge : - Vamos para algum lugar fora da cidade, romântico, porque sinto que o nosso amor está chegando ao fim e não quero ter um cenário qualquer para o adeus. O que começou num lugar deve terminar no mesmo lugar, o restaurante Mistura Fina, pois tudo que foi bom, tem um dia que voltar à origem. Você concorda comigo ?

Cristina faz sim com a cabeça e beija Jorge. Os dois entram no carro que arranca com velocidade.


Os dois policiais descobrem, perguntando no caís, o paradeiro do suspeito número um. Adolfo finalmente foi encontrado. Agora, à paisana os dois passeiam entre os iates ancorados. Chegam perto do iate de Henry e conferem o nome anotado num bar, na esquina do caís. O nome confere. Ali estava escondido Adolfo. Eles ficam de longe observando com binóculos.

Policial 1 : - Veja só Walter como ele engordou desde a última vez que o vimos.
Policial 2 : - Continua forte, um touro medieval como dizia Antonella. Mas seu rosto está transformado. Ele está muito parecido com aquele outro Adolfo.
Policial 1: - Elementar meu caro, só lhe falta o bigode.
Policial 2 : - Muito bem Sherlock, acertou uma, não lhe falta mais.

Adolfo, com a bandeja na mão, vindo do camarote do Dr. Zara pára no convés para apanhar o seu bigode que tinha ficado no chão e o coloca no lugar. Faz pose de ditador, joga a bandeja no mar e faz uma outra pose com as mãos presas à cintura e um olhar arrogante.

Policial 2 : - Muito bem, Adolfo, seu maluco, amanhã vamos te prender com a mão na bufunfa. Vamos embora, Sherlock.
Policial 1 : - Elementar !

Teresa levanta-se da cama e sentindo-se melhor caminha até a varanda e fica sentada tomando um ar.

Jorge e Cristina chegam ao Restaurante do seu primeiro encontro e são muito bem recebidos pelos garçons e pelo o maitre da casa.

Garçom : - Bom dia, como vai, doutor Jorge, o senhor está sumido.
Maitre : - É bom vê-los de novo. Me acompanhe por favor que tenho uma ótima mesa para os dois.
Jorge : - Obrigado Pedro Paulo, este é o meu lugar preferido !
Cristina : - Quando as velas são muitas o santo desconfia.
Jorge : - O que está acontecendo com você, Cristina ? Perdeu o senso de humor ? Garçom, uma champanhe !
Cristina : - Não Jorge, é que fico um pouco triste quando os tempos mudam e nós mudamos com eles. Toda estória de amor tem um trágico fim. Por que será ?
Jorge : - Vamos tomar uma champanhe e quem sabe mudamos a estória ?
Cristina : - Infelizmente, para nós dois, este não é o destino. Tenho outros mares a navegar e no barco que estou não cabe você, Jorge. É uma pena que tudo tenha acontecido assim. Alex está morto. Suzana não te aceita e o senhor Ortega só pensa em executá-lo.
Jorge : - O que você esta me dizendo - Alex morto ? Quem o matou, você ? É uma brincadeira ? Suzana ? Quem foi ?
Cristina : - O que importa quem matou ? Importa quem morreu. E você não está longe dele, não, Jorge.
Jorge : - Ora Cristina, me fazendo ameaças ?
Cristina : - Eu não ameaço Jorge. Eu faço. Estou lhe dizendo que tudo que você tem de fazer é pegar esta mala de dinheiro que eu vou te dar e não entregá-la para o Dr. Zara. Fique com ela e peça ao Henry, que ele te leva para onde você quiser. Eu convenço a Suzana que você merecia esta indenização e fica tudo acabado. Você com o dinheiro, com um barco, uma ilha deserta ... ou então segue para a América, que você tanto ama e quem sabe um dia novamente nos encontramos ? Vamos dançar ?

Cristina dança com Jorge enquanto uma cantora interpreta um velho samba - canção.

Cristina : - Tem uma coisa que ainda não te falei ... O Presidente antes de morrer tinha um só desejo - que eu me casasse com você e para isso arquitetou um plano de eliminar sua mulher Teresa.

Jorge não dança mais e leva Cristina até a mesa .

Jorge : - O que você esta me dizendo Cristina ? Matar Teresa ? E porque aquele fanático faria isso sem me consultar, sem me magoar. É mentira sua, Cristina, você está querendo é me enrolar.
Cristina : - Não, Jorge ! Acorde ! Quero lhe ajudar. Teresa lê um livro que está com as páginas envenenadas. O Presidente viu um filme ou leu um livro, assistiu uma peça de teatro, sei lá, não me lembro, que lhe deu esta idéia maluca de acabar com seu casamento sem levantar suspeita, como sempre fazia, pôs sua teoria em prática e parece que está dando resultado. Sua mulher está muito mal lá na minha casa de praia eu acho melhor você ir para lá.

Jorge sai correndo sem se despedir. Detém-se na porta e volta mais devagar, pega a mala de dinheiro, manda um beijo para Cristina e sai apressado do restaurante. Todos os garçons ficam parados vendo a cena.
Na rua entra no seu carro e sai em disparada. É quase noite.
Do outro lado, numa outra esquina, um carro dirigido pelo senhor Ortega, com o anão no banco de trás, sai perseguindo o carro de Jorge.


Antonella recebe o telefonema tão esperado do Rio de Janeiro dizendo que ela e seu grupo poderiam pegar o dinheiro no banco .... que já havia sido passada a ordem de pagamento. Antonella desliga o telefone e todos comemoram o fim do trabalho. Arrumam as malas no carro e partem para a viagem de volta. Na estrada, encontram com Miguel e Pati pedindo uma carona. Todos entram no conversível último tipo de Antonella e seguem viagem. Pati comenta com Miguel sobre o conversível vermelho, que é igual ao carro de sua mãe, Teresa.


Teresa, que está na varanda, vê o carro conversível passar com os personagens do livro e mais Pati e Miguel. Fica assustada, e com curiosidade e preocupação, aflita, pega no livro de Antonella e passa a ler o último capítulo.


Os policiais seguem os detetives da igreja por becos centenários da velha cidade. Os sinos dobram.

Det. Leite : - Por que os sinos dobram ?
Det. Osmar : - Na certa não será por você, capitão Leite.
Det. Leite : - E nem por você Osmar.


Teresa adoece novamente e é encontrada desmaiada na varanda por Henry que carinhosamente leva-a para o quarto, fazendo-a deitar-se na cama.

Teresa (acordando) : - Oh ! Meu amor, é só eu passar mal que você aparece. Por quem os sinos dobram ?
Henry : - Eles dobram por você e pelo nosso amor. Fique aqui que vou chamar um médico.

Henry sai à procura de um médico e deixa a empregada tomando conta de Teresa.
Jorge viaja perigosamente pelas estradas sinuosas que cortam as montanhas e o mar. O senhor Ortega e o anão não conseguem acompanhá-lo.

Henry volta com o médico e já vai entrando na casa quando escuta o
barulho de um carro que chega em alta velocidade. Henry faz com que o médico entre acompanhado da empregada e fica escondido. O carro de Jorge chega à casa e ele entra correndo. No quarto de Teresa, o médico a examina. Jorge procura pelo livro e achando-o debaixo da cama, enfurecido, joga-o pela janela.

Jorge: - Doutor o caso dela é de intoxicação por veneno.
Médico : - Como o senhor sabe disso ? Por acaso foi o senhor que a envenenou ?
Jorge : - É claro que não. Sou seu marido !
Médico : - Relaxado, pois a deixou muito tempo assim, neste estado, sem ter me chamado. Ela está morrendo, o senhor sabia ?
Jorge : - É claro que não, cheguei agora de viagem. Vim o mais rápido que pude.
Médico: - Ela terá de ser transferida com urgência para um hospital e se fosse o senhor providenciaria de imediato um transporte aéreo para um grande centro. Vou lhe dar um antídoto mas é só paliativo ela não suporta mais 48 horas sem tratamento. Só posso, neste estágio fazer isso. Me telefone ou vá em minha casa quando tudo estiver pronto pois vou acompanhá-la.
Jorge : - Obrigado, doutor, já estou saindo para providenciar tudo.

Henry que tudo vê e escuta pela janela chora copiosamente e não sabe mais o que fazer. Anda de um lado para o outro, desesperado. O telefone celular de Jorge não funciona e ele resolve sair com o médico. Esconde a valise com os dólares.
O médico e Jorge saem de casa. Henry entra e vai para o lado de Teresa.

Henry : - Teresa ! Não me deixe aqui na terra, solitário mais uma vez, eu não tenho forças para navegar novamente. ( Teresa abre os olhos e tenta
levantar-se ) Oh ! Meu amor, você me acordou e as minhas energias vitais voltam a preencher o vazio de sua ausência. Sem você minha vida não faz sentido mais. Mas com você o mundo torna-se pequeno demais para tamanha felicidade.
Teresa : - Henry você está me escutando ? Eu estou morrendo e quero que você me prometa tomar conta de minha filha Pati e nunca lhe deixar faltar nada. Você me promete ? É só isso que te peço, não é muito é ?
Henry : - Teresa, minha querida, você está mais viva do que eu e nós dois juntos levaremos Pati, e quem mais você quiser para o paraíso ... Teresa !


Jorge está no único telefone da cidade. Começa a chover e ele entra na cabine. Telefona para o seu seguro saúde e pede um avião com urgência
no aeroporto local. Da cabine dá para se ver o Iate de Henry, todo iluminado e a figura do Dr.Zara, desfilando com Sabrina pelo convés.

Jorge : - É um caso de urgência e não temos pronto socorro quanto mais um hospital. Os senhores venham o mais rápido possível que o caso é grave. Não ! começou a chover, mas é chuva de verão, passageira. Tá bom ! volto a telefonar daqui a meia hora para confirmar o horário que o avião chega.


Jorge sai da cabine e caminha com pressa em direção ao Iate. Lá é recebido por um marinheiro (Adolfo nas alucinações de Teresa). É noite. Forma-se uma tempestade e o céu é cortado por relâmpagos.

Dr. Zara : - Jorge, meu caro, que prazer em recebê-lo aqui nestas águas internacionais. Brincadeira à parte, vejo pelo seu rosto molhado a marca do cansaço. Como vai Teresa ? A última vez que a vi não estava nada bem ...
Jorge : - Esta bem melhor, mas ainda precisa de cuidados e por isso não poderemos prolongar mais aquela nossa comemoração.
Dr. Zara : - Adolfo, me sirva um conhaque e sirva outro para o doutor Jorge. Então, Jorge, como você estava dizendo ...
Jorge : - Meu caro Dr. Zara o senhor sabe que a quantia destinada à matriz não é o suficiente para concretizarmos o negócio mas é o bastante para iniciarmos as negociações.
Dr. Zara : - Esta tudo muito bem, mas onde está o dinheiro ?
Jorge : - Está chegando agora em minha casa trazido pelo senhor Ortega.
Dr.Zara : - Você sabe Jorge que seu filho vai ser um grande oficial e desde cedo já pertence ao nosso grupo. Será em breve o nosso líder da juventude e tem um futuro brilhante. Gostaríamos de poder ver esse dinheiro hoje mesmo, pois navegar a noite é muito mais seguro e eu prefiro a companhia da lua do que o desagradável hálito quente do sol deste país. O senhor Ortega ainda anda com aquele anão ? Ele é um homem de confiança. Se você quiser eu peço para ao marinheiro te acompanhar. Você não acha perigoso andar com tudo isso numa mala ?

Jorge : - Fique tranqüilo Dr. Zara. Em menos de uma hora o senhor estará com todo o dinheiro em suas mãos para levá-lo ao Bispo em uma excelente viagem de navio. O senhor já viajou de navio ? Não ? Vai adorar...

Jorge deixa o iate.

Dr. Zara : - Estou te esperando Jorge em uma hora. Adolfo ! onde foi se meter o Henry ? Vá procurá-lo ! Precisamos zarpar hoje e temos que fazer os preparativos... O que ele está esperando ?
Sabrina ( ali o tempo todo, calada e fazendo pose) : - Zara, meu amor, posso entrar e abrir um champanhe ?
Dr.Zara : - Adolfo, assim que chegar com o Henry, me sirva champanhe no camarote. Ela é insaciável. E daqui a uma hora quero este barco pronto para zarpar. Estamos entendidos ? Pode sair e não me volte sem o Henry.


A chuva cai e molha o livro de Antonella . O vento passa as sua páginas num momento de magia.

Henry está em pé, ao lado do corpo de Teresa, com um vidro na mão.

Henry : - Oh ! Teresa dá-me a mão, tu que , como eu, foste inscrita no livro funesto da desgraça. Quantas vezes, quando os homens estão prestes a morrer, experimentam um momento de alegria, o relâmpago precursor da morte ! Oh ! Como posso chamar isso de um relâmpago ? Meu amor ! Minha esposa ! A morte que sugou o mel de teu hálito, nenhum poder ainda teve sobre a sua beleza ! Ainda não foste vencida ! A insígnia da beleza ostenta ainda o carmim em teus lábios e em suas faces e o pálido estandarte da morte ainda não foi aqui desfraldado ! Oh ! aqui fixarei minha eterna morada para libertar esta carne, farta do mundo, do jugo do mau influxo das estrelas ! ... Olhos, olhai uma derradeira vez ! Braços, dai vosso último abraço ! E vós, ó lábios ! portas da vida, com um legítimo beijo, selai o pacto infinito com a morte devoradora ! Vem, amargo condutor ! Vem, guia repugnante ! Tu, desesperado piloto, lança enfim sobre o recife escarpado sua barca exausta, farta de navegar ! Por minha amada ! ( bebe o conteúdo do pote que estava em sua mão) Ó honesto boticário ! suas drogas são rápidas ! ... Assim morro ... com um beijo.

Jorge entra no quarto disposto a matar Henry que está debruçado em cima de Teresa. Quando chega perto, encosta em Henry e ele cai no chão é que dimensiona o tamanho da tragédia. A empregada se aproxima de Jorge.

Empregada : - Ele chegou aqui, doutor Jorge, e chorou muito do lado do corpo de dona Teresa e antes de tomar o veneno recitou uma coisa tão linda para ela que todas nós choramos de emoção. Já mandei chamar o médico e ele está para chegar... o senhor vai sair ?

Jorge, desesperado, não consegue ver que Teresa acorda. Ainda está viva. Ele pega o seu revólver e sai para o cais. Chegando no barco que está às escuras, passa a ter mais atenção, e aos poucos, vai se aproximando. Quando chega bem perto, pode ver Adolfo andando no convés com uma lanterna na mão. A noite está escura. A chuva havia passado e uma neblina cobria todo o cais.

Jorge : - Dr. Zara ! Responda ! É o senhor que esta aí !
Adolfo : - O Dr. Zara está dormindo . Você trouxe o dinheiro ? Ele me deu ordem de pegá-lo e só acordá-lo quando estivermos em alto mar. Aproxime-se e mostre-me o seu rosto.

Jorge se aproxima e fica bem perto de Adolfo.

Adolfo : - Jorge ? Onde está o dinheiro ?

Jorge se aproxima de Adolfo, saca de sua arma e dá seis tiros no peito do gigante. Adolfo não se abala com os seis tiros e rindo para Jorge vai em sua direção. Pega num gancho de fisgar peixe e parte para o golpe final, quando um tiro certeiro estoura a sua cabeça. Jorge, ainda assustado, olha para o lado e vê Cristina e logo atrás Suzana e, mais atrás ainda, sumindo na neblina, o senhor Ortega e o Anão.

Cristina ( com a mala de dinheiro em sua mão ) : - Jorge, hoje é o seu dia de sorte, lhe salvei a vida mais uma vez. Não vai me agradecer ?
Jorge : - Cristina ! Suzana ! Vocês mataram minha mulher, acabaram comigo, com minha família e me salvam deste gorila para quê ? Preferia ter morrido.
Cristina : - Não, Jorge ! Não era ainda o seu momento. Você pode nos fazer um favor ? Jogue este porco no mar, porque nem os vermes da terra gostariam de comê-lo. E agora com muita calma me diga se você não quer assumir a presidência da Firma. Nós vamos para a América, para a matriz, como você gosta de dizer e você cuida dos negócios aqui no Brasil. É uma proposta boa. A Suzana perdeu o Alex e você Teresa. Ficou justo, como queria o Presidente. Agora tudo pode caminhar como havíamos combinado e o senhor Ortega pode lhe ajudar. Você tem o tempo que vai daqui ao carro para poder pensar se aceita ou não a minha proposta. Pode começar a caminhar. Faço isto porque eu gosto de você e quero ainda te encontrar com vida - ela continua - Jorge, e sua caminhada para o sucesso está chegando ao fim é só uma questão de escolha - Morte ou vida ? Responde-me, Jorge, qual é a sua preferência ?


O médico chega na casa de Teresa e encontra os dois amantes gemendo ainda com vida no quarto. Com ajuda das empregadas, faz com que ele, Henry, vomite e aplica uma injeção nos dois. Um barulho de helicóptero surge no ar. O médico olha para o alto e assim que acaba de aplicar as injeções diz para as empregadas.

Médico : - Prepare mais um lençol que temos agora de levar dois ao aeroporto. Não se preocupe, eles estão vivos e vão ficar bons.


O dia amanhece. O helicóptero passa entre as últimas nuvens que cobrem o sol. O iate sai da barra e entra no mar alto. Uma patrulha costeira persegue o barco.

O diário de Antonella estirado na grama é iluminado por um raio de sol.
Num palco iluminado, e com uma multidão que grita o seu nome, está Pati, o grupo de música de Miguel e o de teatro de Antonella, dando um show de arrasar. O sucesso é total.

No iate, Suzana vai até o camarote para descansar, quando se depara com os cadáveres do Dr. Zara e de sua mulher Sabrina. Ela começa a gritar desesperadamente. Cristina, conduzindo o barco, não consegue ouvi-la. Quando se vira para trás e vê que está sendo seguida pela polícia marítima, diminui a marcha do iate. A lancha da polícia se aproxima.

Suzana (gritando, desesperada) : - Eles estão mortos ! ali dentro ! tudo está que é puro sangue. Eu quero sair daqui, Cristina ! Por favor, me ajude !



Os dois policiais que estão no cais à procura dos detetives se aproximam de um grupo de pescadores que olha um corpo boiando no mar.

Policia 2 : - É o Adolfo. Walter, vai lá e recolha o presunto ! Está é a prova que faltava. Para vingar o roubo do cofre os detetives Leite e Soares da Igreja do Reino Unido, assassinaram todos os Weberes. Vamos prendê-los. Eles agora estão ferrados. Mataram toda uma família de Relampejo e o delegado, depois desta descoberta, vai fazer o maior julgamento de que se tem notícia na cidade. A eleição está chegando e nada melhor para a reeleição do prefeito que esta movimentação e eles reeleitos poderão nos dar a aposentadoria que tanto merecemos. Sherlock, foi um sucesso a nossa investigação !
Policia 1 : - Elementar meu caro Walter. Temos dinheiro suficiente para nos aposentar ?
Policial 2 : - Não me faça rir, Sherlock !


Rio de janeiro - Centro da cidade.

Jorge sai do Tribunal acompanhado por Cristina e Suzana e todos estão alegres quando entram atrás da limusine dirigida pelo Senhor Ortega. Os jornalistas querem de qualquer maneira uma entrevista. Da janela do carro eles fazem a última pergunta.

Jornalista : - Senhor Jorge, o senhor depois da separação vai casar novamente ?
Jorge : - Meus amigos, o meu casamento hoje é com a Firma que se torna a maior empresa privada deste país. Quer casamento melhor ?

A limusine arranca e pode-se vê-la cortando a cidade.

Soberbo na sala do presidente estão Jorge, os edifícios, as montanhas coberta de mata atlântica, o mar azul e o Brasil.
Perdidos numa praia paradisíaca, onde uma cachoeira corre para o mar, estão Teresa e o marinheiro Henry.

Os dois sorriem e Teresa cai na água azul transparente acompanhada por uma pequena criança. Henry olha-os da areia.
Um pássaro voa em direção ao sol e o céu está claro como nunca estivera antes nestes dias quentes de verão.


FIM

Primeiro Tratamento.
A mistura de tratamento nos diálogos é intencional.
Juiz de Fora - Madrugadas de janeiro a abril de 1996.

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